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Relatório oficial aponta risco de apagão com PIB acima de 4%

OESP, Economia, p. B1
28 de Jan de 2007

Relatório oficial aponta risco de apagão com PIB acima de 4%
Para secretaria do Ministério da Fazenda, País não suportaria crescimento acima de 3,5% entre 2008 e 2010

Lu Aiko Otta e Leonardo Goy

Se o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) der certo e a economia alcançar taxas de expansão na casa dos 5%, o País corre o risco de um novo apagão. É o que informa um relatório confidencial da Secretaria de Acompanhamento Econômico (Seae) do Ministério da Fazenda, ao qual o Estado teve acesso.

O documento, que circulou quando o PAC estava em preparação, diz que um crescimento de 4% entre 2007 e 2010 só será sustentável se todas as usinas hidrelétricas programadas para entrar em funcionamento no período ficarem prontas no prazo e não houver problemas no abastecimento de gás natural para as térmicas. Caso contrário, o consumo de energia ficará acima dos níveis considerados seguros para o fornecimento, que embutem uma margem de segurança de 5% na capacidade das usinas.

Em outras palavras, o crescimento acelerado não obrigatoriamente levará ao apagão, mas fará com que o sistema elétrico opere no limite. Bastará um ano de chuvas fracas, um crescimento inesperado no consumo ou um problema no abastecimento de gás para que o País enfrente novo racionamento.

"Esse déficit (entre o consumo e a chamada energia assegurada) não significa a necessidade de decretar um racionamento, mas que seu risco é elevado", alerta o relatório. "É necessário que as autoridades competentes atentem para o aumento do risco sistêmico." O PAC, anunciado na semana passada, ataca alguns problemas levantados pelo documento.

Os técnicos que elaboraram o relatório não chegam ao ponto de afirmar a partir de quando o risco de apagão é mais elevado. Em vez disso, citam dois estudos, um da consultoria PSR e outro da Universidade Federal do Rio de Janeiro.

No primeiro, o consumo passaria a ficar acima da energia assegurada a partir de 2008, quando a deficiência seria de 0,6%, subindo para 2,2% em 2009 e 2,5% em 2010. Essa projeção é feita num cenário mais provável, no qual são esperados problemas no abastecimento de gás e com a perspectiva otimista de crescimento anual de 4%. Já a UFRJ prevê que, se a economia crescer 4,75% ao ano, o risco de racionamento será superior a 5% já em 2009.

"A economia brasileira não suportaria uma taxa de crescimento superior a 3,5% entre 2008 e 2010 mantendo os riscos de suprimento em patamares aceitáveis", diz o relatório, comparando as conclusões dos dois estudos. "Diante dessas projeções, ganha especial relevância a questão do que ocorrerá se o Brasil apresentar taxas de crescimento mais elevadas. Deve ser ressaltado que agentes privados acreditam que a escassez de energia restringirá esse crescimento."

PREÇOS

O relatório sugere a elevação da tarifa de algumas das novas geradoras de energia como forma de atrair o investimento privado. Em outubro, o governo levou a leilão a autorização para construir sete usinas hidrelétricas. Duas delas, Cambuci e Barra do Pomba, ambas no Rio de Janeiro, não atraíram interessados porque a taxa de retorno do empreendimento foi considerada baixa.

"Há que se verificar a estrutura de preços negociados nos leilões, de forma a analisar a viabilidade econômica dos empreendimentos, pois alguns agentes não têm participado sob a alegação de que o preço teto é baixo", diz o documento. Mais adiante, observa: "Se, por um lado, isso (o preço baixo) favorece a modicidade tarifária, por outro implica alocação de capital público em setor que poderia captar recursos privados". Os autores observam que a transparência e a estabilidade de regras são condições para um ambiente saudável ao investimento privado. "Essa é uma condição importante para acelerar o crescimento econômico, minimizando os riscos e, conseqüentemente, os custos de novos investimentos."

Crescimento comprometido
Por que há risco de apagão:

Atrasos: A construção de hidrelétricas e térmicas está atrasada por causa de problemas ambientais ou porque não houve os investimentos privados necessários, devido às tarifas pouco atraentes

Térmicas: O funcionamento das usinas térmicas está
ameaçado pela falta de gás natural. Se todas entrassem em operação com capacidade total, a demanda seria 11% maior que a oferta

Prazo: Os cálculos do governo para medir o risco de apagão consideram usinas que não ficarão prontas no prazo previsto. É um cálculo distorcido, mais otimista do que a realidade

Ameaça: As projeções são feitas considerando crescimento de 4% e, nesse quadro, o abastecimento não é 100% garantido. Se a economia acelerar, a ameaça de apagão torna-se mais aguda

Economia menor: Um racionamento agora geraria menos economia do que o de 2001. Famílias e empresas cortaram o desperdício desde aquela época

O que o PAC prevê:

Hidrelétricas: Acelerar a construção de hidrelétricas, facilitando a obtenção de licenças ambientais. Foi enviado ao Congresso um projeto de lei
definindo melhor as competências dos governos federal, estaduais e municipais na avaliação do impacto de cada projeto sobre o meio ambiente

Gás natural: Antecipar a produção de gás natural no País

Gás de outros países: Construir terminais de regaseificação, o que permitirá a compra do produto em outros países, além da Bolívia

Fontes alternativas: Reforçar o uso de fontes alternativas de energia, como a biomassa

Financiamento: Melhorar as condições de financiamento ao setor elétrico. As linhas de crédito do BNDES foram alongadas de 14 para 20 anos e as exigências de garantia, reduzidas

Agilização do plano depende do Congresso
Aceleração da concessão de licenças ambientais precisa ser regulamentada

O Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) procura atacar vários dos problemas apontados no relatório elaborado pela Secretaria de Acompanhamento Econômico (Seae) do Ministério da Fazenda. A pergunta de empresários do setor de infra-estrutura, porém, é se o PAC sairá do plano das intenções para tornar-se algo concreto.

A principal medida, segundo um dos autores do relatório, é tornar mais rápida a concessão de licenças ambientais para novas usinas. Hoje, as empresas interessadas em fazer um projeto na área enfrentam um emaranhado institucional em que os governos federal, estaduais e dos municípios, além do Ministério Público e da Justiça, interferem no rumo do projeto.

O PAC contém uma tentativa de deixar mais claras as atribuições de cada uma dessas instâncias, encurtando o caminho hoje percorrido pelas concessionárias. Porém, essa regulamentação está na forma de projeto de lei complementar, o que significa que terá de passar pelo Congresso antes de entrar em vigor. Não há previsão de prazo para que isso ocorra.

A previsão do PAC para investimentos em infra-estrutura energética é de R$ 274,8 bilhões até 2010, sendo R$ 55 bilhões este ano. Os recursos virão da iniciativa privada e das empresas estatais. A idéia é fortalecer o papel da Eletrobrás, mas esse é um processo que também demandará tempo.

Para estimular a iniciativa privada a investir, o PAC melhorou as condições de financiamento. O Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) alongou de 14 para 20 anos o prazo dos empréstimos para projetos nessa área, e o prazo de carência aumentou de 6 para 12 meses. O banco se propõe a financiar até 70% do valor do empreendimento.

Há, também uma "bondade" tributária. Foi suspensa a cobrança de tributos federais sobre a aquisição de insumos e serviços relacionados a todas as obras de infra-estrutura, inclusive no setor energético.

Para dar mais segurança aos empreendimentos, o governo promete empenho para aprovar, no Congresso, dois projetos de lei de interesse do setor privado. Um deles esclarece o papel das agências reguladoras, consideradas fundamentais para garantir a estabilidade de regras no País. Outro fixa regras para uso, exploração e comercialização do gás natural no Brasil.

A Petrobrás, por sua vez, reforçou seu orçamento de investimentos neste ano em R$ 7,5 bilhões, dos quais metade será aplicada em projetos que anteciparão a auto-suficiência do Brasil em gás. Também receberão prioridade a construção de unidades regaseificadoras no Ceará e no Rio. Com elas, será possível importar gás natural do Oriente Médio e outros mercados, reduzindo a dependência em relação à Bolívia. O produto vem em navios especiais, na forma líquida, e é retransformado em gás para ser injetado nos gasodutos.

OESP, 28/01/2007, Economia, p. B1

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