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Exigência ambiental resulta em maior comprometimento

Valor Econômico, Especial, p. F4
22 de Abr de 2014

Exigência ambiental resulta em maior comprometimento

Por Jane Soares
Para o Valor, de São Paulo

A mineração é considerada uma atividade essencial para o desenvolvimento econômico e social de muitos países, Brasil inclusive. A extração nacional de minerais resultou em uma receita de US$ 43 bilhões no ano passado, sem incluir petróleo e gás. Por outro lado, é impossível ignorar os danos causados pela atividade ao meio ambiente: degradação dos terrenos, poluição das águas, do ar e sonora, danos à biodiversidade, só para ficar nos mais comuns.
É possível conciliar mineração e preservação do meio ambiente? Ambientalistas e o setor produtivo divergem. "Há uma incompatibilidade absoluta entre a escala de produção de minérios, ditada pelo mercado mundial, e a preservação ambiental. Entre 2002 e 2011, a extração de zinco aumentou cerca de 648%, a de cobre, 597%, a de bauxita, 140%, e a de minério de ferro, 88%", afirma Carlos Bittencourt, pesquisador do Instituto Brasileiro de Análises Sociais e Econômicas (Ibase). "A mineração foi um dos primeiros setores a incorporar a questão ambiental para atender à crescente exigência da sociedade e ao que determina a Constituição", rebate Rinaldo Mancin, diretor de assuntos ambientais do Instituto Brasileiro de Mineração (Ibram).
Bittencourt explica que um dos mais sérios impactos é em relação ao consumo e contaminação das águas superficiais e subterrâneas. "A mineração usa quantidades gigantescas de água e é uma das atividades econômicas que mais poluem esse recurso natural, causando graves danos às populações", comenta. Para dar uma dimensão do problema, o pesquisador diz que apenas uma grande mineradora produziu, em 2012, 72,2 milhões de metros cúbicos de efluentes líquidos industriais não tratáveis. "Em seu relatório de sustentabilidade, explica que 76% desses efluentes foram descartados em rios, reservatórios e barragens, e 17% no mar", afirma.
Mas Mancin destaca a importância cada vez maior da questão ambiental para o setor. "Pesquisa realizada com as principais mineradoras do país mostram um avanço expressivo", explica o executivo. Na década de 1990, por exemplo, 30% das companhias tinham objetivos e metas ambientais, 40%, mecanismos de acompanhamento, e 35%, programas de atendimento a emergências, Em 2012, 90% afirmaram ter todos estes instrumentos de gestão de riscos. "Hoje, o respeito ao meio ambiente é extremamente valorizado no mercado internacional. Alguns bancos, inclusive, endurecem na hora de conceder crédito para empresas que não adotam critérios ambientais."
Outro aspecto que separa ambientalistas e executivos do setor é a concessão das licenças ambientais. As empresas queixam-se das exigências crescentes, da demora na liberação dos documentos, da burocracia, da abrangência. "Há 30 anos, quando foram criadas, as licenças referiam-se apenas a problemas ambientais. Hoje, esse objetivo se esvaziou e se exige licença ambiental para qualquer empreendimento. Os novos parâmetros levam em conta cavernas, comunidades indígenas e quilombolas, patrimônio imaterial. Resultado: os órgãos que emitem as licenças estão sobrecarregados", queixa-se Mancin. "O licenciamento tem se mostrado claramente insuficiente para proteger os biomas dos impactos da mineração. É preciso deixar claro onde não se pode minerar", diz Bittencourt. "Precisamos debater qual a estratégia nacional para a mineração, já que apenas uma pequena parte dos recursos vindos da atividade fica efetivamente no Brasil. "
O assunto torna-se mais polêmico quando envolve a atividade em terras indígenas. A quarta edição da pesquisa "Mineração em Terras Indígenas na Amazônia Brasileira", realizada em 2013 pelo Instituto Socioambiental (ISA), mostra a existência de 4.220 processos minerários, envolvendo 152 terras indígenas que, se desenvolvidos, cobririam em média 37,6% destas áreas - em alguns casos, no entanto, a cobertura chegaria a 99%. "O assunto não interessa apenas às comunidades locais. É importante para toda a sociedade brasileira por colocar em risco a preservação de grandes extensões de terras", comenta Raul do Valle, coordenador de política e direito do ISA.
O Ministério das Minas e Energia (MME) reconhece a necessidade de regulamentar o artigo constitucional que estabelece que a exploração de recursos minerais "só pode ser realizada com autorização do Congresso Nacional, ouvidas as comunidades afetadas, ficando assegurada aos índios a participação nos resultados da lavra". Vários projetos de lei (PL) tratam do assunto, mas foram apensados ao polêmico PL 1610/1996, de autoria do senador Romero Jucá (PMDB/RR), que tramita em regime de urgência pelo Congresso.
Para críticos do projeto, como o Ibase e o ISA, ele é um claro retrocesso em relação a propostas anteriores e pretende liberar a mineração em terras indígenas, sem fixar diretrizes efetivas para resguardar os direitos das comunidades e o meio ambiente. Entre os vários problemas do PL 1610, o ISA diz que a concessão mineral é outorgada anteriormente à realização do licenciamento ambiental, uma clara inversão de procedimentos.
"O projeto não faz o principal: não consulta os povos indígenas desrespeitando a Constituição e a Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT)", explica Valle, destacando que a consulta prévia está restrita a um único momento, antes da manifestação do Congresso Nacional e da fase de licitação. "E mesmo que os índios sejam contrários à mineração, terão de se submeter aos interesses do governo e das mineradoras."
"A mineração nas reservas deveria ser feita apenas em casos excepcionais e quando não ameaça a cultura e subsistência dos índios" reforça Bittencourt, do Ibase. Já Mancin afirma que os índios são os maiores defensores da mineração. "A visão assistencialista da Funai evoluiu e hoje os povos indígenas tomam suas próprias decisões. E como a maioria dos brasileiros, querem qualidade de vida."

Ações visam minimizar impacto e reduzir uso de água

Por Jane Soares | De São Paulo

Fernando Lins, diretor do Centro de Tecnologia Mineral (Cetem), unidade de pesquisa do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI), considera que as grandes mineradoras utilizam tecnologias modernas adotadas globalmente, requeridas para minimizar os impactos ambientais decorrentes da extração mineral. "A pressão da sociedade, dos órgãos reguladores e das comunidades locais exige tal comportamento."

Para o executivo, as empresas já têm técnicas específicas para minimizar as emissões de materiais particulados; tratar efluentes líquidos contaminados antes de seu retorno ao meio ambiente ou para reutilização; dispor de forma segura de rejeitos ou resíduos; recuperar áreas degradadas. Mas Lins reconhece que as micro, pequenas e médias empresas, que representam 70% do setor, precisam de apoio do governo para avançar no caminho da sustentabilidade.

A Samarco se enquadra no rol das grandes mineradoras do país, responsáveis por 90% da produção mineral. Controlada pela BHP Billiton Brasil e Vale, extrai e beneficia minério de ferro na unidade de Germano, em Ouro Preto e Mariana (MG). O minério é transportado por minerodutos para a unidade de Ubu (ES), a 400 km de distância, onde é transformado em pelotas. A meta da empresa é produzir 30 milhões de toneladas/ano em 2015.

A mineradora investiu R$ 250 milhões em melhorias ambientais entre 2009 e 2013 e deve aplicar R$ 180 milhões até 2015. "A Samarco quer ser reconhecida como a melhor empresa do setor", diz Márcio Perdigão, gerente geral de meio ambiente e licenciamento. Entre as ações desenvolvidas, está ampliando a área de preservação em Minas Gerais de 1.100 mil hectares para 2.700 mil hectares. "Compramos terras próximas ao Parque Estadual de Itacolomi, uma forma de ajudar a preservar a biodiversidade da região", diz.

A Samarco trocou o óleo combustível por gás natural nas unidades de pelotização no ES, conseguindo reduzir em aproximadamente 10% a emissão de gases de efeito estufa. Em fevereiro, começou a usar, em caráter experimental, biomassa feita a partir da casca de coco, dando destino a um resíduo que causa transtornos à prefeitura da cidade turística de Guarapari.

A Anglo American internaliza práticas testadas no mercado internacional. Por meio de parcerias com a Organização Não Governamental (ONG) Flora e Fauna Internacional e com a Universidade Federal de Goiás (UFG), a mineradora realiza um levantamento das atividades que possam gerar riscos à biodiversidade, desenvolve planos de ações preventivas e monitora os resultados.

"A UFG realizou pesquisa sobre a fauna e a flora da região de Barro Alto e Niquelândia (GO). As informações foram compiladas em cartilhas e jogos distribuídos às escolas da região", diz Marcelo Galo, gerente de meio ambiente da Unidade de Negócios Níquel, Nióbio e Fosfatos. A UFG também está desenvolvendo parâmetros geológicos que vão nortear o planejamento de exploração das lavras em relação à biodiversidade. "A ideia é preservar áreas sensíveis e, quando isso não for possível, em função de grandes concentrações de minério, estabelecer formas de compensação em outros locais."

Um dos pontos mais sensíveis da atividade é o consumo de água exigido. "As empresas bem estruturadas recuperam em média 70% da água para reúso e algumas já superam os 80%", diz Lins, do Cetem. A estimativa da Anglo American é de a recirculação de água ficar entre 80% e 90% no Minas-Rio, o maior projeto mundial da empresa, que deverá entrar em operação no segundo semestre e produzir, na primeira fase, 26,5 milhões de toneladas de ferro. O investimento é de US$ 8 bilhões.

A Anglo American vai extrair e beneficiar minério de ferro nos municípios de Conceição do Mato Dentro, Alvorada de Minas e Dom Joaquim, em Minas Gerais, e levá-lo por meio de um mineraduto de 525 km de extensão até o Porto de Açu, no Espírito Santo. A mineradora obteve outorga para captar 2.500 metros cúbicos/hora do rio do Peixe. O programa global da empresa pretende reduzir o consumo de água entre 10% e 15% até 2020.

Valor Econômico, 22/04/2014, Especial, p. F4

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http://www.valor.com.br/empresas/3521966/acoes-visam-minimizar-impacto-…

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