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Remoção consentida

O Globo, Opinião, p. 15
Autor: ANTUNES, Paulo de Bessa; CUNHA, Solange
19 de Dez de 2017

Remoção consentida
É possível remover comunidades em casos excepcionais

Paulo de Bessa Antunes e Solange Cunha

Foi publicada no Rio, em novembro, a Lei Estadual no 7.790, que declara como patrimônio cultural, histórico e imaterial e considera de especial interesse social as comunidades quilombolas, caipiras, caboclas, de pescadores, caiçaras e agricultores no âmbito do Estado do Rio, inclusive aquelas localizadas em Unidades de Conservação da Natureza.
Em razão dessa declaração, a Lei Estadual no 7.790 veda expressamente a remoção ou remanejamento dessas comunidades do seu local de origem.
Neste ponto, importante notar que o Brasil é signatário da Convenção no 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT) sobre Povos Indígenas e Tribais, promulgada no país pelo Decreto no 5.051/2004.
Ressalte-se que a Convenção no 169 da OIT desenvolve os conceitos de consulta e consentimento. No caso de reassentamento das comunidades tradicionais, a Convenção determina ser necessária a obtenção do consentimento prévio, livre e informado (CPLI).
Logo, entendemos que a vedação prevista na Lei Estadual no 7.790 não é absoluta, sendo possível a remoção das comunidades em casos excepcionais, desde que seja obtido o CPLI, nos moldes da Convenção no 169 da OIT, e em respeito às tradições, rituais e valores das comunidades afetadas.
Especificamente sobre o acesso ao conhecimento tradicional, há a Lei Federal no 13.123/2015, que descreve instrumentos para a comprovação do CPLI, a critério da comunidade afetada, quais sejam:
1 - assinatura de termo de consentimento prévio;
2 - registro audiovisual do consentimento;
3 - parecer do órgão oficial competente; ou
4 - adesão na forma prevista em protocolo comunitário.
Apesar de a Lei Federal no13.123/2015 indicar formas para a comprovação, fato é que o mecanismo do CPLI ainda não foi regulamentado no Brasil. Tal fato pode gerar um ambiente de imensa insegurança jurídica no licenciamento ambiental de atividades que afetem direta ou indiretamente tais comunidades. Afinal, como assegurar que o procedimento de obtenção do CPLI foi realizado corretamente se inexiste regulamentação? Indagação difícil de ser respondida, e certamente essa questão será um dos maiores desafios para os empreendedores brasileiros na próxima década.
É nítido que o reconhecimento das comunidades quilombolas, caipiras, caboclas, de pescadores, caiçaras e agricultores como grupos de especial interesse social é relevante e está em sintonia com a posição do Brasil nos tratados e convenções internacionais. Todavia, salientamos que, especialmente no âmbito do Rio de Janeiro, as consultas e os estudos dos componentes quilombolas e tradicionais deverão ser realizados e analisados com ainda mais cautela no curso do licenciamento ambiental das atividades que afetarem direta ou indiretamente tais comunidades.

Paulo de Bessa Antunes e Solange Cunha são advogados

O Globo, 19/12/2017, Opinião, p. 15

https://oglobo.globo.com/opiniao/remocao-consentida-22208182

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