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Nova lei de regularização ambiental entra em vigor até outubro

Estação Vida - www.estacaovida.org.br
Autor: Priscila Viudes
02 de Out de 2008

A nova lei de regularização ambiental, sancionada e aprovada em agosto pela Assembléia Legislativa, será regulamentada até outubro pelo governador do Mato Grosso, Blairo Maggi. A Procuradoria do Estado ainda está trabalhando no texto do decreto, que é aguardado com ansiedade por ruralistas e ambientalistas. A lei mira diretamente a principal demanda do setor para entrar no sistema de licenciamento: a anistia as multas de quem busca a regularização. Mas há risco de o tiro sair pela culatra e se converter em novo incentivo ao desmatamento ilegal.

A partir da data de regulamentação, os produtores rurais terão o prazo de um ano para aderir ao Programa Mato-grossense de Legalização Ambiental - MT Legal e se cadastrarem no Cadastro Ambiental Rural - CAR. O programa estabelece duas etapas para o processo de regularização das cerca de 100 mil propriedades rurais do Estado: a primeira é a inserção no CAR, que deverá ser realizada espontaneamente pelos produtores rurais, e a segunda é o processo de obtenção da Licença Ambiental Única - LAU. O prazo para que os proprietários apresentem a localização da Reserva Legal, um dos quesitos mais importantes do licenciamento, varia de um a três anos, conforme o tamanho da propriedade rural.

O principal incentivo para que os produtores rurais efetivem voluntariamente o cadastro no Programa é a isenção de autuação. Dessa maneira, aqueles que já tiverem passivo ambiental não serão notificados caso se inscrevam no CAR e dêem prosseguimento à Licença Ambiental. 'Para os produtores, a questão ambiental estava atrelada a uma série de medidas punitivas. Com esse cadastro, isso se torna diferente. Pela primeira vez vemos um programa que mostra o que deve ser feito, de maneira transparente', afirma o consultor da Famato - Federação de Agricultores de Mato Grosso, Vicente Falcão.

No entanto, a adequação ambiental dos empreendimentos rurais de Mato Grosso precisa ser dinâmica, não só para a sustentabilidade, mas também para que o mercado não imprima sanções aos produtos oriundos do Estado. 'A lei precisa funcionar agora, o governo precisa criar mecanismos para que todos estejam no cadastro daqui a um ano, quando deverão ser iniciados os processos de licenciamento ambiental', disse Sérgio Guimarães, coordenador executivo do ICV - Instituto Centro de Vida. Apesar da adesão ser espontânea, Guimarães aponta que é necessário a realização de campanhas de notificação das propriedades irregulares como forma de motivar o cadastro no Programa MT Legal.

Contexto - Estima-se que menos de 20% das propriedades rurais do Estado estejam inseridas na base de dados da Sema - Secretaria de Estado de Meio Ambiente. Devido ao grande número de passivos ambientais, muitos produtores não se sentem estimulados à regularização, já que o procedimento demanda investimentos vultosos para recuperar as áreas degradadas, e também porque seriam autuados por suas irregularidades ao darem início ao processo de obtenção da Licença Ambiental. Nas áreas de floresta, o problema é mais grave. Além da reserve legal ser maior, o passivo ambiental não pára de crescer.

Esse ano, Mato Grosso figurou no topo da lista de estados que mais desmataram no Brasil. Segundo dados do Boletim Transparência Ambiental, divulgado pelo ICV - Instituto Centro de Vida, os dados anuais do desmatamento têm diminuído nos últimos dois anos, entretanto, em média 85% do desmatamento registrado todos os meses é ilegal, realizado em propriedades rurais que não constavam no Simlam - Sistema Integrado de Licenciamento Ambiental de MT e em áreas de reserva legal de propriedades cadastradas.

O programa MT Legal pretende trazer para a legalidade produtores rurais que tenham um passado de degradação ambiental, além de estruturar uma base de dados que possibilite maior controle das ações pela Sema. Rodrigo Junqueira, do Instituto Socioambiental, que trabalha com projetos de recuperação de áreas degradadas na Bacia do Xingu, inclusive com médios e grandes proprietários, avalia a nova lei como uma ação positiva no cenário das políticas públicas do estado. 'Não dá para negar que isso seja um avanço importante, é um começo diferente para a regularização ambiental. Não ter punição é um incentivo válido'.

Segundo o secretário-chefe da Casa Civil do Estado, Eumar Novacki, a pretensão é mudar o histórico de degradação ambiental do Estado. 'Nós queremos que Mato Grosso não seja apenas o maior produtor de alimentos do país, mas que seja o melhor'. A expectativa do consultor da Famato Vicente Falcão é de que a nova lei irá recepcionar, de imediato, cerca de 50% das propriedades que têm demanda por regularização ambiental. 'O restante pode demorar mais tempo por abranger processos que apresentam problemas de regularização fundiária', avalia.

Desmatamentos recentes 'A nova regra é bem vinda e pode colocar o estado em lugar de destaque na Amazônia Legal, como exemplo de regularidade ambiental. Entretanto, há um ponto no texto publicado em agosto pelo governo que causa apreensão no movimento ambientalista. O texto da lei aprovado pela Assembléia Legislativa não estabeleceu uma data limite para os desmatamentos realizados pelos proprietários que aderirem ao Programa MT Legal. Laurent Micol, coordenador adjunto do ICV, aponta que a suspensão da aplicação de multas é um aspecto delicado, pelo risco de haver desmatamentos recentes que possam ficar imunes.

'O espírito dessa lei é oferecer uma saída para quem quer se regularizar. E um incentivo, que é a desoneração de multas. O objetivo não é perdoar desmatamentos recentes, nem novos. Tirar a aplicação da multa é inaceitável e o ideal seria reeditar a lei para que desmatamentos recentes, realizados a partir de meados de 2005, não sejam isentados'.

O promotor de Justiça, Domingos Sávio de Barros Arruda, salienta que o Ministério Público vai exigir que os órgãos ambientais prossigam com o trabalho de fiscalização em desmatamentos recentes. 'Como a lei não impede que isso ocorra, o órgão ambiental não ficará impedido de autuar, durante todo e qualquer tempo'.

O secretário-chefe da Casa Civil Eumar Novacki garante que o programa é destinado a atender passivos ambientais que datam até meados de 2005 e que o decreto de regulamentação tratará desse aspecto de forma bem definida. 'Mesmo os produtores cadastrados no CAR que vierem a fazer desmatamentos sofrerão as sanções legais, o produtor se engana ao achar que não será punido por desmatamentos recentes. Além disso, o Estado poderá notificar as áreas degradadas'.

Com a regulamentação, a lei poderá sofrer certas adequações. Determinados aspectos devem ser definidos, como a questão dos proprietários rurais que já deram início ao processo de licenciamento ambiental e estariam dispensados do CAR, com a conseqüente não isenção das multas. 'Mesmo quem já foi autuado aproveitará os benefícios da lei, como a agilidade do processo. Quanto à isenção da multa, a Famato vai lutar para que esse benefício seja estendido aos demais produtores que já procuraram se regularizar', afirma Vicente Falcão.

De forma geral, a lei é mais um chamado que o poder público faz à classe produtora para regularizar-se ambientalmente. 'O espírito da lei atende aos interesses ambientais. Espera-se que o órgão ambiental possa ter maior controle sobre as atividades desenvolvidas na zona rural', afirma o promotor Domingos Sávio de Barros Arruda.

MT Legal: Fiscalização deverá ser mais rigorosa

Um dos pontos fundamentais para o atendimento dos objetivos esperados pelo Programa MT Legal, a nova lei de regularização ambiental do Mato Grosso, será o acompanhamento e a fiscalização das ações que devem ser tomadas pelos produtores após a efetivação do cadastro.

Segundo a lei, perderão os benefícios aqueles produtores que aderirem ao CAR e descumprirem as obrigações assumidas, tais como a regularização da Reserva Legal na etapa do licenciamento ambiental. Essas obrigações serão firmadas através de um Termo de Ajustamento de Conduta - TAC assinado entre o proprietário e o estado de Mato Grosso com base nas análises da Sema. Só será efetivado o cadastro no CAR depois de assinado o Termo. Além disso, o proprietário terá de iniciar as medidas de recuperação das Áreas de Preservação Permanente degradadas logo após a efetivação do cadastro. A obtenção da Licença Ambiental é obrigatória, mesmo que o MT Legal estabeleça um prazo de um ano para o início dos procedimentos.

Segundo o consultor da Famato - Federação de Agricultores de MT, Vicente Falcão, o fato da multa não ser lavrada não extingue a responsabilidade do produtor, que será responsável pela lisura das informações prestadas ao CAR. 'O Termo de Ajustamento de Conduta é o mecanismo que dará a transparência necessária para esse processo. Nós entendemos que o Programa não abrandou a cobrança, porque se identificado o passivo, terá de ser feita a recuperação ambiental”, disse Falcão. Rodrigo Junqueira, do ISA - Instituto Socioambiental, alerta que, para se ter avanços efetivos daqui três anos, é importante que o governo crie mecanismos para disciplinar e acompanhar todas as etapas da regularização ambiental.

Segundo o secretário-chefe da Casa Civil, Eumar Novacki, a Sema - Secretaria de Estado de Meio Ambiente está sendo reestruturada para atender a demanda que o programa MT Legal trará. 'Ainda não há um orçamento definido para isso, mas já demos início às ações'. O secretário apontou a consultoria que o Instituto Nacional de Desenvolvimento Gerencial está fazendo no órgão para apresentar um diagnóstico de gestão e assim conferir mais dinamismo aos processos. 'Faremos pactos com os segmentos dos produtores para evitar o desmatamento de novas áreas, estamos investindo em pesquisa e tecnologia para melhorar a produtividade. Com isso, nós esperamos frear novos desmatamentos'.

Quanto às ações de fiscalização, o secretário revela que o governo deve abrir novo concurso para contratação de pessoal para a Sema. A Polícia Ambiental também está sendo remodelada e há previsão de investimentos em novas viaturas. 'Temos cerca de 200 pessoas da Polícia Militar que estão sendo preparadas para atuar na área ambiental e a previsão é capacitar aproximadamente 1,5 mil. Também pretendemos otimizar o emprego do helicóptero'.

A lei também cria o cargo de Secretário Extraordinário de Apoio às Políticas Ambientais e Fundiárias, vinculado à Casa Civil. O Governo ainda não divulgou o nome da pessoa que terá a responsabilidade de fazer o acompanhamento do programa e de articular operações com a Sema e demais órgãos envolvidos com a questão. 'A criação da Secretaria demonstra que o Governo está conferindo uma atenção especial ao assunto, que está sendo tratado com uma questão de Estado', aponta Rodrigo Junqueira, do ISA.

MT Legal: Regularização ambiental fica desvinculada da questão fundiária

O Programa Mato-grossense de Legalização Ambiental Rural traz uma inovação importante: a regularização ambiental não fica atrelada à regularização fundiária. De acordo com a lei 8.961, de 18 de agosto de 2008, quando houver sobreposição de áreas, profissionais da Sema identificarão quem está de posse da área e o processo de Licenciamento Ambiental continuará tramitando, exigindo das partes envolvidas a identificação da Reserva Legal.

Em áreas que estiverem sob litígio, o proprietário poderá apresentar o projeto de licenciamento ambiental com exclusão das áreas sobrepostas, mas terá de calcular a Reserva Legal considerando a área total da propriedade. 'Com isso o processo se torna mais dinâmico. Até agora, mesmo que a Reserva Legal ficasse fora da área de sobreposição, o processo ficava parado', lembra o consultor da Famato, Vicente Falcão.

O estado de Mato Grosso tem inúmeras propriedades com problemas na questão fundiária, o que dificultava o trâmite dos processos de licenciamento ambiental, que ficavam atreladas à solução judicial do conflito. 'A regularidade ambiental é imediata e urgente, é o que vai determinar o impacto e as ações de recuperação. A regularização fundiária não é menos importante que a ambiental, mas envolve processos mais complexos. Por isso a necessidade de desvincular as duas situações', pondera Laurent Micol, do ICV.

Para Micol, a base de dados do Cadastro Ambiental Rural - CAR, primeira etapa do Programa MT Legal, será uma boa referência para a regularização fundiária. Os produtores que aderirem ao CAR terão de apresentar todas as informações sobre a propriedade, inclusive as coordenadas geográficas e imagens digitais.

Compensações - A nova lei traz ainda opções para regularização da Reserva Legal por compensação de áreas, mas o teor segue o que já consta na lei estadual anterior. O proprietário que tiver Reserva Legal cujo percentual for inferior ao mínimo legal poderá compensá-la com outra área. A desoneração também pode ser realizada através da doação ao órgão ambiental de áreas em Unidades de Conservação ou através de depósitos no Fenam - Fundo Estadual de Meio Ambiente.

Segundo levantamento da Sema, o estado conta com 950 mil hectares a serem regularizados em Unidades de Conservação, entre propriedades tituladas e posses. 'Isso é muito menos do que é preciso para compensar os passivos, seria preciso permitir a compensação em Unidades de Conservação federais e criar novas Unidades de Conservação', argumenta Micol.

A lei não estabelece valores ou mecanismos para cálculo dos valores para a compensação através da doação de áreas e para os depósitos do Fenam. O texto aponta apenas que devem ser áreas e valores equivalentes em extensão e importância ecológica, conforme definido no Termo de Ajustamento de Conduta. De acordo com Micol, a regulamentação da lei deverá prever mecanismos para mensuração da relevância ecológica e do valor financeiro.

Outro ponto relevante será a transparência dos Termos de Ajustamento de Conduta. 'A iniciativa vai no sentido certo, porque incentiva a regularização, mas esses termos devem ser disponibilizados ao público. A sociedade precisa ter acesso para que possa acompanhar o encaminhamento das ações e para que os acordos não fiquem apenas no papel', defende Micol.

Procedimentos para efetivar o Cadastro Ambietal Rural - CAR

Os produtores rurais que aderirem ao CAR terão de tomar as seguintes medidas para que tenham direito à isenção de multas e aos demais benefícios apontados pela nova lei de regularização ambiental:
1) Contratar responsável técnico e efetuar o recolhimento de Anotação de Responsabilidade Técnica - ART;
2) Preencher o formulário com os dados do imóvel rural: área total da propriedade e/ou posse, Área de Preservação Permanente, Área de Reserva Legal, Área para Uso Alternativo do Solo;
3) Disponibilizar a imagem digital da propriedade ou posse indicando suas coordenadas geográfica e memorial descritivo;
4) Fornecer os dados e qualificação pessoal do proprietário e/ou detentor;
5) Declarar a existência de eventual passivo da Área de Reserva Legal e de Preservação Permanente;
6) Apresentar cópia autenticada dos documentos pessoais do proprietário ou possuidor, do engenheiro responsável, do comprovante de posse e/ou certidão atualizada da matrícula do imóvel rural, juntamente com o demonstrativo do cadastramento eletrônico;
7) Assinar Instrumento de Compromisso padrão, propondo as medidas que serão implementadas para sanar o passivo ambiental declarado e o respectivo cronograma de execução, de acordo com o roteiro disponibilizado pela Sema.

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