Diário do Pará-Belém-PA
15 de Jun de 2004
No último dia 11, o coordenador dos I Jogos Tradicionais Indígenas do Pará, Carlos Terena, chegou em Tucuruí, sudeste paraense, para dar continuidade à organização do evento que vai ser realizado entre 15 e 20 de junho.
Segundo ele, este é a primeira mostra com o "espírito de celebração das tribos", destacando a cultura das diferentes etnias.
Carlos Terena afirmou que as provas não vão ter intenção competitiva, mas demonstrativa. Algumas modalidades, que serão apresentadas durante o evento, são exclusivas de algumas tribos participantes, como é o caso da corrida de toras, dos Gaviões.
As lutas corporais serão apresentadas pela tribo convidada, os Carajás, de Tocantins. Já algumas outras são comuns entre elas, como a canoagem, a natação, o arco-e-flecha, o cabo de guerra e o futebol de campo, prática adaptada da cultura não-indígena.
"Este é o primeiro evento com aspecto mais cultural, de manter as tradições (...), para que ela se fortaleça ou recupere suas características próprias, porque um povo sem cultura é mais fácil de ser dominado", afirma o coordenador do evento.
De alma e corações abertos
Por ocasião dos jogos, estarão presentes homens, mulheres, crianças e anciãos indígenas. "Estamos vindo de alma e corações abertos", confessa Terena, lembrando que nos Jogos estarão fazendo o caminho inverso que houve no passado, se referindo a existência, no passado, de várias tribos nesta região. "Se viemos para Tucuruí, é porque estamos fazendo o caminho inverso, estamos voltando para a 'Aldeia Tucuruí'. Se não tivéssemos esta intenção de dividir este momento com todos, faríamos esta festa em nossas aldeias mesmo. Queremos influir e trazer alegria para a população", declara. Para propor-cionar um intercâmbio cultural, vários grupos folclóricos estarão sendo convidados para se apresentarem na arena, durante o evento, intercalando as diversas manifestações existentes no Pará. Artesanato - Segundo a coordenadora local, vice-prefeita Ana Bueno da Silveira, várias tribos participantes estarão expondo e comercializando seus artesanatos. "Vai ser uma ótima oportunidade para a população adquirir um exemplar da cultura material de uma etnia paraense, ou mesmo dos convidados".
Mostra da cultura dos índios Zo'é
Uma exposição com trinta fotografias sobre a cultura e a vida dos índios da tribo Zo'é será uma das grandes atrações dos I Jogos Tradicionais Indígenas do Pará. As fotos, de autoria do fotógrafo francês Serge Guiraud e reproduzidas em tamanho 50x75 cm, estarão expostas em uma oca localizada na orla do Rio Tocantins, ao lado da arena aonde serão realizadas as competições.
Em 1991, o fotógrafo tomou conhecimento da existência de um grupo de índios isolados ao norte de Santarém, que estavam ameaçados pela presença de missões evangelistas clandestinas. No ano seguinte, Sydney Possuelo, presidente da Fundação Nacional do Índio (Funai) àquela época, conseguiu mandar embora os missionários do território Zo'é. Foi nesse mesmo período que o fotógrafo teve autorização da Funai para realizar uma reportagem no local.
A experiência, segundo Serge Guiraud, foi marcante. "No início de 1992, tive a oportunidade de conviver durante duas semanas com os Zo'é. O encontro foi muito forte. Estar junto a um grupo que refletia a imagem de como foi a vida dos primeiros homens que viveram na floresta amazônica me causou um grande impacto. Tinha o sentimento de ter descoberto um mundo pré-histórico e de ter recuado no tempo", revela o repórter fotográfico francês, referindo-se ao primitivismo em que vivem os índios daquela tribo. Para Guiraud, os Zo'é fazem parte das sociedades contemporâneas que tentam sobreviver no modo ancestral.
Dificuldade de acesso preserva tradição
Atualmente, a Funai interditou o acesso de estrangeiros na reserva. Dessa maneira, os índios Zo'é conseguem preservar a própria cultura e viver de maneira tradicional em pleno século XXI. De acordo com a coordenadora da exposição, Ana Júlia Chermont, assessora da Secretaria Executiva de Esporte e Lazer (Seel), a escolha dos Zo'é para servir como tema da mostra fotográfica se deu justamente pelas peculiaridades dessa etnia, que vive totalmente isolada do resto da civilização. "Será uma oportunidade bem interessante de mostrar ao público algumas características desse povo, totalmente desconhecido para a grande maioria das pessoas e dos próprios paraenses", destaca.
Cinemateca - Na mesma oca onde acontece a exposição fotográfica, será montada uma cinemateca para a exibição de documentários indígenas. Uma outra novidade será a feirinha de artesanato indígena que ocupará parte da orla do rio Tocantins, onde o público poderá adquirir os mais variados produtos confeccionados pelas etnias que estarão participando dos jogos, como cintos, cocares, brincos, colares, máscaras, pulseiras e bolsas, dentre outros. Também constam da programação três dias de oficinas culturais, ministradas pelo período da manhã, por dois palestrantes índios. As oficinas, que serão realizadas no Parque Ecológico da Usina Hidrelétrica de Tucuruí, versarão sobre temas como agricultura e educação indígena.
Conhecendo um pouco do Povo Zo'é
Localizados numa área de refúgio, entre os rios Cuminapanema e Erepecuru, norte do Pará, os Zo'é procuraram manter-se afastados tanto dos povos indígenas vizinhos, que consideram inimigos, quanto dos brancos, que conheciam através de contatos intermitentes. Entraram para a história como um dos últimos povos "intactos" na Amazônia. O s Zo'é são falantes de uma língua da família Tupi-Guarani do tronco Tupi. Toda sua população é monolíngue, com exceção de alguns jovens que aprenderam algumas palavras em português, ouvindo os funcionários da Funai falar no rádio.
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