Folha do Estado -Cuiabá-MT
01 de Nov de 2005
Índios de várias etnias que vivem no Parque Nacional do Xingu ameaçam entrar em guerra se a Justiça autorizar a continuidade da obra de hidrelétrica no rio Culuene, um dos mais importantes afluentes do rio Xingu e a principal fonte de alimentos das aldeias. A hidrelétrica de pequeno porte surgiu de um acordo entre a empresa Paranatinga Energia, o governo do Estado e um dos chefes mais respeitados do parque, Aritana Yawalapiti. O acordo desagradou à maior parte das 14 etnias existentes no Xingu, apesar dos R$ 1,3 milhão que os indígenas receberiam para a realização de projetos de incentivo à piscicultura e mais 50 hectares de terras.
Para os indígenas que discordam da construção, a hidrelétrica estaria situada em uma área considerada sagrada para eles, onde teria nascido o ritual do Quarup, maior celebração religiosa da tradição xingu. O Quarup marca o encerramento do luto pela morte de líderes ou de pessoas consideradas de linhagem importante para os índios.
Outro fator que preocupa os indígenas é o prejuízo a fauna pesqueira do rio Culuene. "Dinheiro não tem valor para os índios. O que importa é a cultura, o meio ambiente e os peixes", salientou o cacique irmão de Aritana, Piracumã Yawalapiti. Ele garante que, se a Justiça autorizar a continuidade da obra, que está embargada desde fevereiro de 2005, por ordem do juiz federal da 1ª Vara em Mato Grosso, Julier Sebastião da Silva, os xinguanos partirão para a guerra. "Estamos prontos. E não vai ser guerrinha, não. Vai ter morte", afirmou.
Mas não são apenas os indígenas que estão contra a construção da Pequena Central Hidrelétrica (PCH) Paranatinga II, localizada em Paranatinga. Para o Ministério Público Federal (MPF) e a Fundação Nacional do Índio (Funai), o acordo feito entre índios, governo e empresa não tem valor legal. Em entrevista à revista Época, o procurador da República em Mato Grosso, Mário Lúcio Avelar, afirmou que o documento não tem validade, pois foi assinado à revelia da Funai e do Ministério Público e o acordo feito com os indígenas seria uma confissão de culpa do Estado e da Paranatinga de que a construção afetará o meio ambiente e os povos indígenas. "Acho estranho que o governo estadual ponha dinheiro num projeto da iniciativa privada", ressaltou.
Na época em que entrou com liminar pedindo a suspensão das obras da PCH Paranatinga, o procurador Mário Lúcio afirmou que a implantação da hidrelética causaria sérios impactos ambientais na área indígena Parabubure, ocupada pelo povo xavante, e no Parque Indígena do Xingu, atingindo ainda a bacia do rio Xingu, fauna, flora, bens minerais e jazidas arqueológicas localizados na região da obra.
Mesmo com os impedimentos colocados pela Funai e pelo MPF, o acordo feito entre índios, Estado e empresa está sendo cumprido aos poucos, já que pequenas despesas como conserto de tratores e manutenção de carros e barcos já foram pagas pela Paranatinga, apesar da empresa negar o repasse do dinheiro. Um dos benefícios trazidos pelo governo estadual para seduzir os xinguanos teria sido a instalação de uma balsa para transporte de máquinas pesadas, doada recentemente.
PCH não traz problema, informa SEMA
Para o governo do Estado, a PCH Paranatinga não causará influências significativas à comunidade indígena, devido a suas características técnicas. A afirmação é da superintendente de Infra-Estrutura, Mineração, Indústria e Serviços da Secretaria Estadual de Meio Ambiente (Sema), Susan Lanes de Andrade.
Ela afirmou que foram realizados os estudos de impacto ambiental no local, e estes fizeram estes apontamentos.
O engenheiro sanitarista Rafael Teodoro de Melo, que faz parte da equipe de análise de PCHs e Hidrelétricas da Sema, explicou que o tipo de usina a ser construído é de ponta e não irá manter a água totalmente represada. "Terá uma barragem que levará de 10 a 15 dias para encher. Quando estiver cheia, a água será solta e não causará variação na quantidade de água vazante, não alterando o leito do rio", salientou.
Com relação aos prejuízos à fauna pesqueira, Melo explicou que existe a proposta de ser construída uma escada de transposição para os peixes. "Todos os prejuízos que poderão ocorrer ao meio ambiente estão sendo amenizados", ressaltou.
De acordo com Melo, a usina está fora da área indígena, que fica abaixo do barramento. "O problema maior é a questão cultural", ressaltou.
Melo disse ainda que existem documentos tanto da Funai quanto do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis (Ibama) favoráveis à obra.
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