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Autor: Felipe Campinas
29 de Mai de 2024
MANAUS - Indígenas da etnia Mura relataram, nesta quarta-feira (29), que estão recebendo ameaças de morte após se posicionarem contra o "atropelo" no licenciamento da exploração de potássio em Autazes, na Região Metropolitana de Manaus.
As autorizações para a exploração mineral estão sendo feitas pelo Ipaam (Instituto de Proteção Ambiental do Amazonas), órgão do governo estadual, e ocorrem em meio às discussões, no âmbito judicial, sobre o órgão competente para avaliar o empreendimento.
Um grupo de indígenas da Aldeia Lago Soares, incluindo o tuxaua Filipe Gabriel Mura, de 26 anos, esteve na sede do MPF (Ministério Público Federal), em Manaus, e participou de entrevista concedida pelos procuradores da República Fernando Soave e Sofia Farias, que são responsáveis pelas ações judiciais contra a Potássio do Brasil.
Na entrevista, os procuradores fizeram um apelo aos defensores da exploração de potássio em Autazes. Sem mencionar o Ipaam e a Potássio do Brasil, Fernando Soave declarou: "Parem, por favor, essas violações, essas manipulações. Tomara que não, mas daqui a pouco [teremos] essas mortes, porque ameaça já tem. Essas ameaças estão nas mãos de quem está permitido que esse empreendimento avance. Parem com isso".
Os procuradores pedem que a Potássio do Brasil aguarde a conclusão da delimitação da área reivindicada pelo povo Mura para que, depois, verifique a viabilidade do empreendimento. Os estudos estão sendo conduzidos pela Funai (Fundação Nacional dos Povos Indígenas).
"Os estudos para a demarcação já estão avançados. Daqui a alguns meses ou talvez um ano, [a gente] já vai ter uma noção de onde vai ser esse território, pelo menos do ponto de vista administrativo pela Funai", afirmou Soave.
Na entrevista, os indígenas relataram que a tensão na região aumentou, com ameaças de morte a indígenas contrários ao empreendimento. Um deles relatou que recebeu ligação de número restrito e ouviu que os passos dele estavam contatos. Eles também relataram que drones têm sobrevoado as comunidades e assustado os indígenas.
"Quero pedir medida protetiva. Semana passada recebi ligação restrita no meu celular dizendo que meus passos estão contados. Não sei por que. Não roubei ou matei. Ontem, quando cheguei em Manaus, fui ver, ligação restrita de novo. Não atendi. Peço investigação porque as coisas estão ficando mais tensas", afirmou Sérgio Freitas Mura, de 42 anos.
"Vem acontecendo alguns tipos de ameaça para a comunidade. As pessoas não são acostumadas a verem coisas diferentes. Poucos dias atrás surgiram à noite vários drones circulando em cima da comunidade. [Aquilo] ali deixa as crianças e os idosos em conflito [com medo]", afirmou Vavá Izague Mura, de 48 anos.
Contra e a favor
Os conflitos sobre a exploração de potássio em Autazes aumentaram nos últimos anos e dividiram os próprios indígenas. Uma parte é a favor do empreendimento e tem atuado ao lado da Potássio do Brasil para viabilizá-lo. A outra tem combatido com apoio do MPF.
Em setembro do ano passado, um grupo promoveu uma assembleia para mudar o protocolo de consulta do povo Mura, documento que estabelece um rito de consulta e procedimentos. Segundo o MPF, o trabalho de um ano e oito meses foi alterado em um dia.
Os indígenas favoráveis ao empreendimento que estavam naquela assembleia aprovaram mudanças que favoreceram a Potássio do Brasil, mas as alterações foram contestadas por outros indígenas da mesma região e que são contrários ao projeto.
O MPF relata que existe, no território indígena, um cenário de violações, falsas promessas, ameaças e cooptações dos povos indígenas, inclusive de lideranças Mura.
De acordo com o MPF, o protocolo foi violado, com a realização de reuniões internas com a presença de não indígenas, inclusive da empresa, o que é vedado pelo próprio protocolo de consulta. O documento ressalta a necessidade da presença do MPF nas reuniões, a fim de evitar a cooptação de lideranças frente ao poderio financeiro da empresa.
A briga judicial sobre a exploração de potássio em Autazes ocorre desde 2016, quando o MPF tomou conhecimento de violações a direitos de povos indígenas. Na ocasião, o MPF ajuizou uma ação contra a LP (Licença Prévia) no 054/2015, concedida pelo Ipaam à Potássio do Brasil. De lá pra cá, houve diversas decisões autorizando e proibindo a empresa de prosseguir com o licenciamento. As últimas autorizaram o Ipaam a conceder as licenças.
Em abril e maio deste ano, o Ipaam concedeu 11 licenças que autorizam a Potássio do Brasil a instalar a totalidade do projeto. A concessão fez com que o MPF apresentasse nova ação na Justiça Federal. Os pedidos ainda estão sendo analisados, mas os procuradores disseram que as máquinas da empresa já estão no local de exploração.
Segundo o MPF, as obras ocorrerão sobre áreas tradicionais ocupadas pelo povo indígena Mura, cujas terras estão em processo de demarcação. Além de sobrepor ao território dos Mura, o empreendimento está ao lado de outras duas terras indígenas: Jauary e a cerca de 6 km da terra indígena Paracuhuba.
A procuradora Sofia Freitas, que atua na área do meio ambiente, relatou que uma perícia técnica do MPF apontou uma série de irregularidades no estudo de impacto ambiental que embasou as licenças do Ipaam.
Procuradores relataram que as ilegalidades ocorrem há anos. Fernando Merloto afirmou, por exemplo, que a empresa tentou fazer contratos de cessão de posse com indígenas para uso do território. Os contratos tinham cláusula de confidencialidade. O objetivo, segundo ele, era afastar os indígenas da região, que seriam afetados diretamente na caça e pesca.
Os procuradores leram nota técnica que analisa questões relacionas ao empreendimento e apresenta alternativas e rotas tecnológicas para manter o protagonismo agrícola brasileiro de forma sustentável, sem agredir o meio ambiente nem violar direitos de povos indígenas e tradicionais. O documento é assinado por entidades da ciência brasileira, grupos de estudo e universidades federais.
História
Nesta quarta-feira, o MPF lançou um site com as informações sobre o Caso Potássio. O site apresenta a ordem cronológica dos fatos que levaram o MPF a contestar as licenças concedidas pelo Ipaam. O procurador da república Fernando Merloto afirmou que o objetivo é garantir transparência sobre o caso. O site pode ser acessado aqui.
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