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Habitação e energia para salvar Lula

GM, Opinião, p. A3
Autor: DRUMMOND, Aristoteles
10 de Jun de 2005

Habitação e energia para salvar Lula

Aristóteles Drummond

Não se pode falar em políticas sociais sem dar ênfase à habitação popular. Não há como negar que o Brasil está, há duas décadas, praticamente sem obras públicas de grande significado. Nesse período, na infra-estrutura e na construção civil apenas as que contaram com capital privado (Serra da Mesa, outras parcerias elétricas e rodovias privatizadas), obras iniciadas anteriormente (Tucuruí e Xingó, por exemplo) e algumas municipais, nas principais capitais, e mesmo assim quando tiveram a ventura de ter prefeitos realizadores e ousados. Na habitação popular, quase nada. Não se pode falar em políticas sociais sem dar especial ênfase à habitação popular e ao saneamento básico. Seriam prioridades de um programa voltado para a dignidade do cidadão que inclui a saúde pública. O dinheiro investido no saneamento tem retorno a curto prazo, já que, com isso, economiza-se em saúde. Um pacote descomplicado voltado para a habitação popular, com linhas de crédito na Caixa Econômica, que foi o maior agente do Sistema Financeiro da Habitação, parece oportuno para movimentar a economia, expandir o emprego. Basta uma olhada para recordar o que foi feito quando Sandra Cavalcanti concebeu o programa que, ao longo dos 20 anos de Banco Nacional da Habitação (BNH), rendeu mais de 4 milhões de unidades habitacionais no Brasil. E só para lembrar: Minas tem, hoje, o maior programa de saneamento do País. Lá, prevalece a visão do avanço no social e na saúde, representada pela água e pelo esgoto tratados. Praticamente com recursos próprios. Na energia, se a situação atual é confortável, não há como negar a urgência de se iniciar um projeto de vulto para conclusão a partir de 2010, sob risco de apagão ou, o que é tão grave quanto, dependermos de soluções emergenciais de termogeração, de alto custo. O Brasil, que anda mal em competitividade em função de deficiências na infra-estrutura ou nos altos custos fiscais e financeiros, não pode perder a oportunidade de um investimento atrativo na energia elétrica. Entre todos os projetos, um salta aos olhos como o mais importante e tecnicamente estudado, com forte apelo na integração latino-americana e no desenvolvimento de grandes áreas do País. Trata-se de Santo Antonio e Jirau, no Rio Madeira: usinas vão abrir o acesso hidroviário a grandes áreas do Centro-Oeste e da Amazônia e novas fronteiras agrícolas até o porto de Itacoatiara, no Amazonas, além, é claro, da geração de energia a excelente custo. Assim, estará salva a soja da região, castigada pelos altos gastos no seu escoamento. Esse projeto, a cargo de Furnas e com participação da Eletronorte, aberto a capitais privados, tem excepcionais vantagens ambientais, preço competitivo do kW/h, bom prazo para começar a gerar energia e receita, sem contar a posição estratégica para saída de linhas de transmissão. Chegam a ser inacreditáveis suas vantagens, como estar nas proximidades de Porto Velho e acompanhar parte da BR-364, que liga Cuiabá a Rio Branco. Tornar esse megaprojeto, com tantas implicações positivas, uma prioridade de governo seria um tento político e histórico para o presidente Lula. O efeito multiplicador de uma obra desse porte, envolvendo projetos ambientais, engenharia, obras, contratação de equipamentos, num montante de até R$ 10 bilhões em cinco ou seis anos, por si só justificaria sua urgência. A mais, Peru e Bolívia passam a ter acesso ao Atlântico e, em desdobramento possível do projeto com outra usina binacional, com a Bolívia, podemos ter acesso aquaviário ao Pacífico. No entanto, a entrega da fase inicial do projeto ao Ministério das Minas e Energia e à Aneel foi discretamente noticiado e nada mais tem sido dito. Embora sua relevância justificasse uma palavra do próprio presidente da República sobre o assunto. Mais objetivo, mais pragmático, mais viável, mais atraente do que outras propostas (algumas boas, mas com menor prioridade), tocar um programa habitacional por um lado e acelerar o projeto do Rio Madeira por outro, além dos resultados perseguidos, daria um vento de otimismo nos que começam a acreditar que o Brasil continuará discutindo seus problemas, suas prioridades, seus projetos, sem tirar nada do papel. O Brasil não pode perder mais tempo no blablablá. Projeto ruim é o que não sai do papel, ou o que provoca polêmicas que venham a retardar sua execução. Fazer casas e gerar energia sem elevado custo financeiro ou ambiental não tem objeção aceitável. E este governo, agora, também luta contra o relógio. Mãos às obras, portanto.

Aristóteles Drummond - Jornalista

GM, 10-12/06/2005, Opinião, p. A3

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