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Governo do Amazonas decide manter Seind e indígenas atribuem a decisão às suas mobilizações

Amazônia Real - http://www.amazoniareal.com.br
Autor: Elaíze Farias
25 de Fev de 2015

A reforma administrativa do governo do Amazonas deixou de fora a extinção da Seind (Secretaria de Estado para Povos Indígenas), a primeira do Brasil criada por lei. O anúncio da reforma, que propõe a extinção de várias pastas, entre elas a Secretaria de Estado de Ciência e Tecnologia e Inovação(Secti), foi feito na tarde desta quarta-feira (25) pelo governador José Melo.

A extinção da Seind fazia parte dos planos da Comissão criada especialmente para elaborar a reforma administrativa para economizar os cofres do governo do Estado. Esta possibilidade provocou a reação imediata dos indígenas do Amazonas, que se mobilizaram por meio de protestos, reuniões com parlamentares e divulgação de cartas contra a extinção.

Um dos maiores protestos aconteceu durante a leitura de abertura dos trabalhos da Assembleia Legislativa do Amazonas (ALEAM) pelo governador José Melo, no dia 3 deste mês. Cerca de 300 indígenas se reuniram em frente do prédio anexo da Assembleia Legislativa do Amazonas. A Amazônia Real fez matéria sobre o protesto, que pode ser lida neste link.

A Amazônia Real conversou com três indígenas logo após obter a confirmação de que a Seind não acabará. Todos comemoraram a decisão e afirmaram que a permanência da Seind como estrutura autônoma é fruto da mobilização dos indígenas. Eles destacaram também que a extinção da secretaria representaria um retrocesso na política indigenista do Estado e que a decisão causaria uma imagem negativa para o Amazonas.

Na coletiva desta quarta-feira, ao ser questionado pelos jornalistas sobre a permanência da Seind, Jose Melo fez questão de citar o número da população de indígena do Amazonas - "294 mil, quase 300 mil", expressou - e afirmou que "nunca pensou em extinguir a Seind".

Melo também disse que não sofreu pressão de qualquer espécie para tomar a decisão sobre a reforma. "Jamais iria acabar com uma função tão importante", afirmou Melo, se referindo à Seind, após mencionar o número da população indígena do Estado. Fontes da Amazônia Real afirmaram que a extinção da Seind era dada como certa pela Comissão da reforma, daí a incerteza se a pasta permaneceria.

Em entrevista concedida no dia 3 deste mês, o líder do governo na Assembleia Legislativa, deputado estadual David Almeida (PSD) disse à reportagem da Amazônia Real que José Melo havia comentado que a Seind seria uma das secretarias extintas.

A Seind foi criada em 2009, no governo de Eduardo Braga (PMDB), atual ministro de Minas e Energia. Ela ficou no lugar da Fepi (Fundação Estadual dos Povo Indígenas), criada m 2001, no governo de Amazonino Mendes (PDT). A criação dos dois dois órgãos foi resultado de uma grande mobilização dos indígenas do Amazonas que remonta a década de 90.

Em entrevista dada no último dia 3, o antropólogo Ademir Ramos afirmou que durante a gestão de Eduardo Braga, a política indigenista do Amazonas correu o risco de acabar, com o fim da Fepi. Ramos foi o primeiro presidente da Fepi.

"Ele queria reduzir para uma secretaria executiva. Conseguimos, eu e lideranças indígenas, uma audiência, que foi tensa, mas mesmo assim ele reconsiderou e anos depois criou a Seind. Mudou a tabuleta, mas não mudou o orçamento. O que dá para fazer com R$ 4 milhões anuais num Estado com quase 200 mil índios? Embora os recursos sejam mínimos, mas criou-se um status de política de Estado com a secretaria", explicou Ademir Ramos.

Mudanças e orçamento

Apesar do alívio, os indígenas com os quais a Amazônia Real conversou enfatizaram a necessidade de se fazer uma reestruturação do órgão, de se definir metas e demandas e, sobretudo, de aumentar o orçamento da secretaria, que hoje é de R$ 4 milhões/ano, para atender um Estado com quase 300 mil pessoas, a maior população de indígena do país.

"Quando os indígenas souberam que a secretaria poderia ser extinta, começou a mobilização. Os indígenas não ficaram quietos. Fizeram protesto, mandaram cartas. Isso foi importante", disse o antropólogo João Paulo Barreto, da etnia tukano.

Para o antropólogo, com a permanência da Seind, é necessária uma nova etapa, com mudança estrutural e de recursos humanos. "A Seind tem o menor orçamento do governo. Por isso que o gestor precisa de habilidade para propor uma política para os indígenas a partir de critérios. A Seind precisa redefinir sua função, seu papel e sua competência", disse Barreto.

O coordenador-geral da Federação das Organizações e Comunidades Indígenas do Médio Purus (Focimp), José Raimundo Lima, conhecido como Zé Bajaga Apurinã, considerou "positiva" a permanência da Seind e que a etapa seguinte é lutar para criar estratégias de melhorias financeiras e de gestão da secretaria. Ele também afirmou que o conselho da Seind, instituído logo após a criação do órgão, em 2009, precisa ser reativado.

"Fico contente que não vai ser extinta. Nas nossas manifestações, deixamos claro que não iríamos aceitar isso. Já estávamos planejando realizar novos protestos caso acabasse, com envio de gente para Manaus. Íamos ocupar os locais e os órgãos", disse ele.

Zé Bajaga está em Manaus nesta semana para discutir a aplicação de recursos que serão destinados pelo BNDES para as terras indígenas da região do rio Purus, no sul do Amazonas. Os recursos são resultado de um acordo que a Seind firmou com o Fundo Amazônia em 2014 na área de gestão, aquisição de equipamentos e construções de pequenas obras, como casas de farinha e centro de artesanato.

Ele destacou que, apesar da permanência, a Seind precisa ter um orçamento maior para atuar junto a povos indígenas onde o órgão ainda não chegou. Bajaga citou os indígenas que habitam a calha do rio Juruá, em cidades como Eirunepé e Envira.

"A importância de se manter a Seind é também porque foi uma conquista ao longo do tempo. Mesmo atuando meio capenga, sem muitos recursos, sem atingir do jeito que queremos, ela ajuda nas articulação, fez muita coisa com pouco recurso. A Seind nos apoia nas assembleias, na semana dos povos indígenas, e nos apoia na gestão com seus técnicos", disse Bajaga, que é cacique da aldeia Idecorá, na Terra Indígena Catitu, no município de Lábrea.

No dia 5 de fevereiro, a Focimp lançou uma nota pública protestando contra a ameaça da extinção da Seind afirmando que transformar o órgão em um departamento de outra secretaria significaria "inibir as conquistas dos povos indígenas e sobrepujar o direito de representatividade destes povos dentro do governo do Amazonas".

O indígena Maximiliano Corrêa, da etnia tukano, considera a decisão do governador José Melo um "recuo" da proposta inicial de acabar com a Seind.

"Acredito que já no pronunciamento dele, no dia da leitura do início dos trabalhos na Assembleia Legislativa, quando disse que não acabaria com a política para os indígenas, havia indício de que ele não pretendia acabar", afirmou Corrêa, que é coordenador-geral da Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (Coiab), cuja sede é em Manaus.

Correa também é favorável a mudanças na gestão do órgão a partir de agora. "O momento agora é reestruturar financeiramente a Seind e uma parte dos recursos humanos. Lutar para que haja aumento no orçamento e assim garantir atendimento aos povos indígenas do Estado. O que tem hoje não atende a demanda da Seind", afirmou.

Secretarias extintas

A reforma administrativa do Executivo Estadual foi encaminhado à Assembleia Legislativa do Amazonas e deverá tramitar em até 15 dias. Somente após a votação é que o governador Jose Melo vai anunciar os novos nomes das secretarias que foram mantidas ou a manutenção dos atuais.

Com a extinção de alguns órgãos e o fim de 702 cargos comissionados, o governo do Amazonas quer ter uma economia de R$ 910 milhões em 12 meses. Segundo informações da Agecom (Agência de Comunicação do Governo), com os ajustes fiscais previstos para ampliar a eficiência da máquina arrecadadora, a estimativa é que o Governo do Amazonas alcance um volume de recursos superior a R$ 1 bilhão, em 12 meses, entre redução de gastos e aumento de arrecadação.

Entre as pastas que serão extintas estão as Secretarias de Mineração, Geodiversidade e Recursos Hídricos (SEMGRH) e de Ciência Tecnologia e Inovação (Secti). Elas serão transformadas em departamentos vinculados à Secretaria de Estado de Planejamento e Desenvolvimento Econômico (Seplan), por meio de departamentos específicos. A Fundação de Amparo à Pesquisa do Amazonas (Fapeam), que era vinculada à Secti, também passará à ser subordinada à Seplan.

O Instituto de Terras do Estado do Amazonas (Iteam) também acaba. Suas ações serão incorporadas pela Secretaria de Política Fundiária (SPF), órgão que também assumirá as competências relativas à desapropriação de imóveis, tarefa hoje executada pela Superintendência Estadual de Habitação (Suhab).

A Secretaria Executiva de Políticas para as Mulheres e da Secretaria de Articulação e Movimentos Sociais (Searp) serão incorporadas à Secretaria de Justiça, Direitos Humanos e Cidadania (Sejusc). A Sejusc é uma sigla, no lugar da antiga Sejus. Foi acrescentado o nome "Cidadania".

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