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Exploração de terras indígenas é causa de atrito com o Congresso

O Globo, Editorial, p. 2
31 de Jul de 2019

Exploração de terras indígenas é causa de atrito com o Congresso
Supremo começa a arbitrar choques decorrentes da intenção de se abrir reservas a investimentos

Editorial
31/07/2019 - 00:00

Jair Bolsonaro está conduzindo seu plano para a exploração econômica de terras indígenas ao limite de um conflito institucional com o Congresso. Requisitada em caráter de urgência, a arbitragem do Supremo Tribunal Federal está prevista para ocorrer na sessão de amanhã.

Na segunda-feira ele argumentou em defesa da abertura das terras indígenas à exploração econômica, para expansão da agricultura, da mineração e do garimpo, entre outras atividades: "O Brasil vive de commodities. Daqui a pouco, o homem do campo vai perder a paciência e vai cuidar da vida dele. Vai vender a terra, aplicar (o dinheiro) aqui ou lá fora, e cuidar da vida dele. A gente vai viver do quê? O que nós temos aqui além de commodities?"

Ele parece empenhado em cumprir supostos compromissos que teria assumido durante a campanha eleitoral. São legítimos, passíveis de mudanças legais, mas o presidente precisa se manter nos limites da legalidade constitucional.

Depois de 28 anos na vida parlamentar, Bolsonaro não pode alegar desconhecimento da Constituição, cujo Capítulo VIII, sob o título "Dos Índios", reconhece os "direitos originários" dos indígenas sobre as terras que tradicionalmente ocupam e dá-lhes posse permanente, com "usufruto exclusivo" das riquezas. Determina à União a demarcação das terras, qualificando-as como "inalienáveis e indisponíveis", e fixando os direitos dos índios sobre elas como "imprescritíveis".

No entanto, Bolsonaro insiste em testar os limites institucionais, sob estímulo da ala mais radical do lobby ruralista, que influi em decisões do governo, mas não reúne votos suficientes para se impor dentro da bancada parlamentar setorial.

Já no primeiro dia de governo, transferiu a demarcação e registro de terras indígenas, assim como a Funai, para o Ministério da Agricultura. Fez isso numa Medida Provisória (no 870), que reestruturou ministérios. Em maio, o Congresso aprovou a MP, mas repôs a atividade de demarcação na Funai e devolveu-a ao Ministério da Justiça, onde estava. Insatisfeito, dias depois Bolsonaro editou outra Medida Provisória (no 886), desfazendo a decisão do Congresso.

A oposição judicializou o conflito. O ministro do STF Luís Roberto Barroso suspendeu o ato de Bolsonaro, liminarmente, lembrando a expressa proibição constitucional de reedição de normas vencidas no Congresso na mesma sessão legislativa. E pediu urgência no julgamento .

O caso mostra que não basta a vontade presidencial. Mudanças sempre são possíveis, mas é preciso respeitar a Constituição.

O Globo, 31/07/2019, Editorial, p. 2

https://oglobo.globo.com/opiniao/exploracao-de-terras-indigenas-causa-d…

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