VOLTAR

Via Campesina invade área de multinacional no Sul

FSP, Brasil, p. A10
05 de Mar de 2008

Via Campesina invade área de multinacional no Sul
PM tira mais de 500 mulheres de fazenda com balas de borracha e bombas de efeito moral
Trabalhadoras, que querem destinar fazenda à reforma agrária, dizem que foram agredidas; responsáveis por retirada negam violência

Gilmar Penteado
Da agência Folha, em Rosário do Sul (RS)

Mais de 500 trabalhadoras rurais do movimento Via Campesina invadiram ontem a fazenda Tarumã em Rosário do Sul (390 km de Porto Alegre), que pertence à empresa finlandesa Stora Enso. Houve confronto com a Polícia Militar. As mulheres foram retiradas no fim do dia com a utilização de bombas de efeito moral e balas de borracha.
Pelo menos um PM sofreu um corte no braço provocado por uma foice. O movimento das trabalhadoras diz que dezenas de mulheres e crianças ficaram feridas, mas não havia confirmação do número de atingidos até o fechamento da edição.
As mulheres invadiram a fazenda de 2.075 hectares às 5h40 para protestar contra a exploração da área pela multinacional. Durante o dia, a PM cercou a fazenda e realizou a operação de retirada às 18h. Repórteres e fotógrafos foram retirados da área e ficaram a 11 km do local da invasão quando a operação foi feita. A polícia não soube justificar a medida.
O subcomandante da Brigada Militar no Rio Grande do Sul, coronel Paulo Mendes, que coordenou a operação, confirmou que foram usadas bombas de efeito moral e balas de borracha. Cães e cavalos também foram utilizados na operação que contou com 50 policiais.
O coronel não soube dizer se alguma manifestante sofreu ferimentos. Escoltadas pela PM, elas foram levadas de ônibus, às 21h30 de ontem, para uma delegacia na cidade vizinha de Santana do Livramento. Segundo o coronel, as mulheres podem ser indiciadas por danos e corrupção de menores.
Segundo a Via Campesina, 900 mulheres e 250 crianças participaram do protesto. Segundo a PM, eram 500 mulheres -as crianças não foram contadas. De acordo com o subcomandante, quatro hectares de eucaliptos foram destruídos. A Via Campesina disse que mulheres foram agredidas com tapas e socos. O coronel afirmou que houve "empurra-empurra".
A fazenda Tarumã, que foi invadida pela terceira vez, é usada pela Stora Enso há dois anos para cultivar eucalipto. A empresa conseguiu na Justiça um interdito proibitório, decisão que apressa o processo de reintegração de posse. A área fica a 80 km da fronteira com o Uruguai, o que a inclui nas exigências da lei de faixas de fronteira. Essa legislação exige aprovação prévia do Conselho de Defesa Nacional para a compra de terras por estrangeiros em qualquer área que fique na faixa de 150 km da fronteira.
No total, a empresa adquiriu 46 mil hectares no Rio Grande do Sul. Os trabalhadores querem que as áreas sejam destinadas à reforma agrária. Eles também acusam a multinacional de criar uma empresa brasileira laranja como forma de regularizar a terra fronteiriça. A criação da Azenglever é investigada pelo Ministério Público Federal no Estado.
A superintendência do Incra (Instituto de Colonização e Reforma Agrária) afirma que a operação foi irregular.
O órgão, por meio de sua assessoria de imprensa, afirma que o licenciamento da aquisição de terras na região estava em andamento, quando o grupo finlandês suspendeu o processo e decidiu criar uma empresa para regularizar a situação das terras. O Incra define a medida da multinacional como uma "burla".
Colaborou Felipe Bächtold , da Agência Folha

Empresa diz que cumpre leis do Brasil

Da agência Folha, em Rosário do Sul

A Stora Enso disse, por meio da assessoria de imprensa, que cumpre a legislação brasileira e que não cometeu irregularidades no país. A multinacional finlandesa nega que a empresa Azenglever seja laranja, como acusam os movimentos sociais e como suspeita o Ministério Público Federal.
Segundo a Stora Enso, a criação da Azenglever era necessária por uma "questão jurídica" e para viabilizar a compra de terras no Rio Grande do Sul. Os europeus dizem que comunicaram o governo sobre a medida tomada e que "nada foi feito às escondidas".
Conforme a Stora Enso, toda a documentação relacionada à fazenda em Rosário do Sul foi encaminhada ao Incra há mais de dois anos. O órgão, segundo a multinacional, ainda analisa os documentos.
A empresa também argumentou que vem gerando empregos no Estado. Disse que hoje trabalham na fazenda invadida 150 funcionários e que antes da aquisição, quando a área era voltada para a agropecuária, eram apenas três trabalhadores.
A Stora Enso tem 46 mil hectares no Estado, sendo mais de 9.000 hectares cultivados. A previsão é que mais 10 mil hectares sejam plantados em 2008.
Cerca de 40% da fazenda invadida é destinada ao plantio de eucaliptos. Segundo a empresa, há a possibilidade de ser construída uma fábrica de celulose que usaria a matéria-prima da fazenda. (GP)

FSP, 05/03/2008, Brasil, p. A10

As notícias aqui publicadas são pesquisadas diariamente em diferentes fontes e transcritas tal qual apresentadas em seu canal de origem. O Instituto Socioambiental não se responsabiliza pelas opiniões ou erros publicados nestes textos. Caso você encontre alguma inconsistência nas notícias, por favor, entre em contato diretamente com a fonte.