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Aquecimento hoje é o pior em 20 mil anos

FSP, Ciência, p. A16
04 de Mai de 2006

Aquecimento hoje é o pior em 20 mil anos
Painel internacional de cientistas diz em seu 4o relatório que temperatura global subirá entre 2C e 4,5C neste século

STEVE CONNOR
DO "INDEPENDENT"

O aquecimento global tem sido agravado pela poluição humana, e a escala do problema não tem precedentes pelo menos nos últimos 20 mil anos, segundo uma versão preliminar de um novo relatório feito pelos principais climatologistas do mundo.
A avaliação do grupo internacional, que vazou, diz que hoje há evidências esmagadoras de que o clima da Terra está sofrendo uma transformação dramática devido às atividades humanas.
Uma cópia preliminar do relatório de um dos grupos de trabalho do IPCC (Painel Intergovernamental sobre Mudança Climática) declara que as concentrações de dióxido de carbono, metano e outros gases-estufa são as mais altas em pelo menos 650 mil anos.
O relatório prevê que as temperaturas médias globais neste século subirão entre 2C e 4,5C como resultado da duplicação das concentrações de dióxido de carbono na atmosfera em relação aos níveis pré-industriais, devido a emissões por atividades humanas (como a queima de petróleo e carvão e o desmatamento das florestas tropicais, como a Amazônia).
A isso poderia se somar mais 1,5C como decorrência de "feedbacks positivos" no clima, resultantes do derretimento do gelo marinho, do permafrost (solos congelados do Ártico) e da acidificação dos oceanos.
O relatório preliminar será o quarto desde que o IPCC foi estabelecido, em 1988, e deveria permanecer confidencial até que a versão final fosse publicada, em 2007. No entanto, um comitê do Senado dos EUA obteve uma cópia e resolveu torná-la disponível na internet, mediante pedido.
O Programa Científico de Mudança Climática dos EUA, que lançou anteontem seu próprio relatório -reconhecendo que o efeito estufa é agravado pelo homem- disse que queria o maior número possível de cientistas comentando o relatório do IPCC. O chefe do painel, o indiano Rajendra Pachauri, no entanto, não foi informado da decisão.
A linguagem do relatório enterra de vez sugestões de que a mudança climática é um fenômeno totalmente natural. "Há evidências amplas de aquecimento antropogênico [criado pelo homem] do sistema climático em observações na superfície, na atmosfera e nos oceanos", afirma.
"É muito provável que o forçamento [impacto] dos gases-estufa tem sido a causa dominante do aquecimento global observado nos últimos 50 anos."
O relatório diz ainda que a mudança climática deve continuar por décadas e talvez séculos, mesmo se as emissões de gases-estufa forem cortadas. "2005 e 1998 foram os dois anos mais quentes já registrados. Cinco dos seis anos mais quentes ocorreram nos últimos cinco anos (2001 a 2005)."
O derretimento de geleiras continentais e polares poderia elevar o nível dos mares em 43 centímetros até 2100, e o aumento para os próximos dois séculos poderia ser o dobro disso, afirma o relatório.

Corrente de ar do Pacífico enfraquece

DA REUTERS

Cientistas identificaram uma nova vítima do aquecimento global hoje: um padrão de circulação atmosférica vital no oceano Pacífico, que abastece os ventos naquela vasta região e regula o clima da América do Sul à Indonésia.
O enfraquecimento desse sistema, detectado por um estudo publicado hoje na revista "Nature", poderia significar mais El Niños e mais chuva no Pacífico Ocidental, e menos alimento para os organismos marinhos que tornam o litoral do Peru e do Chile uma das zonas mais piscosas do mundo.
Conhecido como circulação de Walker, esse sistema de correntes funciona como um grande cinturão, que se estende através do Pacífico tropical, com ar seco viajando de leste a oeste a grande altitude e ar úmido circulando para o oeste juntamente com a superfície do oceano, formando os ventos alísios prevalentes.
Quando o ar úmido chega à Ásia, causa chuvas pesadas na Indonésia. Então ele seca, sobe e recomeça o ciclo. Pois bem: esse sistema enfraqueceu 3,5% nos últimos 150 anos, e a culpa é provavelmente do aquecimento global, afirmam os cientistas.
"Esse é o impacto dos seres humanos por meio da queima de carvão mineral, benzeno, gasolina, tudo", disse Gabriel Vecchi, da Noaa (agência do governo americano que administra oceanos e atmosfera), co-autor do estudo.
Segundo Vecchi, o enfraquecimento observado tem sido mais pronunciado nos últimos 50 anos. Isso se encaixa com as previsões teóricas e de modelagem computacional sobre o aquecimento global causado pelo homem, diz ele.
Mesmo esse enfraquecimento relativamente pequeno na circulação de Walker corresponde a uma diminuição muito pronunciada na velocidade das correntes oceânicas governadas pelo vento. Isso poderia incentivar efeitos parecidos com o El Niño, afirma Vecchi, com impacto sobre lugares como os Estados Unidos, a América do Sul e a Austrália.
A diminuição das correntes marinhas também poderia afetar a circulação oceânica do fundo para a superfície marinha, responsável por trazer nutrientes para a vida marinha. Os impactos disso poderiam ser sentidos na pesca no Pacífico equatorial, por exemplo. A projeção é que o enfraquecimento da circulação de Walker continue durante todo o século.

FSP, 04/05/2006, Ciência, p. A16

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