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APA de Marapendi ameaçada

O Globo, Rio, p.17
18 de Jun de 2005

APA de Marapendi ameaçada
Projeto aprovado na Câmara causa protesto de associações de moradores e ambientalistas

Uma das últimas áreas verdes preservadas na orla da cidade poderá ser ameaçada pela indústria imobiliária e hoteleira, caso o prefeito Cesar Maia sancione um projeto aprovado pela Câmara dos Vereadores. A proposta libera a construção de centros de convenções, prédios comerciais e residenciais com até cinco andares e hotéis em parte da Área de Preservação Ambiental (APA) de Marapendi. Localizada na Barra e no Recreio, a APA é um dos mais significativos ecossistemas lagunares do município, onde há espécies da fauna e da flora ameaçadas de extinção.

Atualmente, a legislação permite, nessa parte da APA que é alvo do projeto, a construção de prédios com até três andares, ocupando até 15% do terreno (na proposta aprovada, a ocupação pode chegar a 30%). A mudança poderá ocorrer na área perto do emissário submarino da Barra. O tamanho da área, entretanto, ainda é motivo de divergência na própria Câmara. Segundo o presidente da Comissão de Assuntos Urbanos, Luiz Guaraná (PSDB), as modificações vão acontecer numa área de apenas 20 mil metros quadrados. Já o vice-presidente Eliomar Coelho (PT) diz que são 55 mil metros quadrados.

Cesar já disse que o projeto será vetado caso não apresente uma compensação proporcional do uso do solo”, uma contrapartida do proprietário para o meio ambiente. Se houver compensação, a prefeitura analisará o projeto e poderá aprová-lo.

Empresário diz que APA já é invadida

Para o empresário Ricardo Herdy, locatário de um terreno na APA, a sanção do projeto é positiva. Ele já conseguiu aprovação da prefeitura para construir, numa área de 40 mil metros quadrados à beira da praia, um espaço voltado para o esporte, com quadras e campo de golfe:

— Sou a favor do projeto, que vai beneficiar a cidade, pois se trata de área nobre. Qual é a finalidade desse espaço atualmente? Essa APA só existe no papel. No verão, verificamos que o espaço protegido é invadido e utilizado até como estacionamento.

Já ambientalistas e associações de moradores são contra a proposta. A presidente da ONG Ecomarapendi, Vera Chevalier, afirma que a APA foi criada para proteger o entorno do Parque Municipal Marapendi, onde é proibido qualquer tipo de edificação. Para ela, a construção de empreendimentos imobiliários e hoteleiros, além de descaracterizar a área, vai impedir o acesso à praia de moradores de condomínios atrás da Lagoa de Marapendi. Hoje, eles usam o transporte marítimo para chegar à orla.

— Se eles querem transformar o espaço em um pólo turístico, que façam isso de forma planejada, discutindo com a sociedade. Mas parece que o interesse é outro — disse Vera.

O advogado ambientalista Rogério Zouein vai além. Ele afirmou que a aprovação da lei é inconstitucional:

— Para alterar os parâmetros de uso e ocupação do solo é necessária a realização de inúmeras audiências públicas, como determina o plano de estruturação urbana (PEU).

Zouein criticou ainda os vereadores, que aprovaram o projeto por 37 votos a sete:

— A aprovação mostra que a maioria defende a desordem urbana e a especulação imobiliária.

O presidente da Associação de Moradores e Amigos do Jardim Oceânico e Tijucamar, Éric Pereira, se disse decepcionado:

— Nós somos totalmente contrários ao projeto e ficamos surpresos com a atitude do vereador Guaraná, que ficou do lado de empreiteiros.

Segundo Herdy, há cerca de 15 propriedades particulares dentro da APA. Muitos donos esperam há anos a mudança na lei para poder construir prédios maiores no local:

— Conheço o dono de um terreno que paga cerca de R$1,5 milhão de IPTU e não pode construir nada. Não recebemos nada da prefeitura e ainda temos que preservar a área.

Ontem também, o vice-governador e secretário estadual de Meio Ambiente, Luiz Paulo Conde, contestou uma declaração de Guaraná, dizendo que quando prefeito nunca permitiu a construção de apart-hotéis na reserva. O vereador dissera que se uma lei de Conde, de 99, não tivesse sido declarada ilegal, a reserva poderia ter apart-hotéis de até 15 andares.

Um abrigo para espécies em perigo

Reserva, que se estende por dois bairros, foi criada em 1991
Situada na Baixada de Jacarepaguá, a APA de Marapendi é hoje uma das áreas mais preservadas da Barra da Tijuca e do Recreio. Formada por vegetação de restinga e manguezais, o lugar abriga uma grande variedade de aves, como o irerê, e espécies de flora e fauna ameaçadas de extinção, como orquídeas e o jacaré-de-papo-amarelo. A APA foi criada em 1991, mas a região já era protegida por legislação ambiental municipal desde 1981.

Até o fim do século XVII, a maior parte da região era de Vitória de Sá e Benevides, neta do antigo governador da cidade, Salvador de Sá. O nome Marapendi, de origem indígena, quer dizer mar limpo”.

Atualmente a APA engloba, além de terrenos particulares, o Parque Municipal de Marapendi, que envolve as faixas marginais da lagoa e o cordão arenoso com cerca de dois quilômetros de extensão entre a avenida litorânea e o mar.

Pela atual legislação, algumas áreas da APA de Marapendi podem ser edificadas, mas o gabarito, agora modificado, é de até três pavimentos. A área edificada também não podia ser de mais de 15%.

O Globo, 18/09/2005, Rio, p.17

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