VOLTAR

A solidariedade que vem do Acre

Adital - http://www.adital.com.br/site/noticia.asp?boletim=1&lang=PT&cod=43266
Autor: Egon Dionísio Heck
25 de Nov de 2009

Vivemos um momento muito difícil e bonito na história do nosso país. É o avanço da vida e da esperança dos povos indígenas, dos quilombolas, dos extrativistas, dos sem terra. A resposta, infelizmente, é o aumento da violência, dos assassinatos, da criminalização. É neste contexto que saudamos a solidariedade nacional e mundial a todos os que lutam por justiça e dignidade, pelos direitos à igualdade na diferença, pela preservação da natureza e da vida do planeta terra.

Na Amazônia, no coração de um dos mais importantes e ameaçados ecossistemas do mundo, é plantada mais uma semente de solidariedade, assim expressa na carta da Universidade Federal do Acre:

"Os professores, pesquisadores, estudantes, artistas, profissionais liberais, sindicalistas rurais e urbanos, lideranças indígenas e demais pessoas que subscrevem esta nota, reunidos no Anfiteatro "Garibaldi Brasil" da Universidade Federal do Acre, durante a realização do III Simpósio Linguagens e Identidades da/na Amazônia Sul-Ocidental e do II Colóquio as Amazônias, as Áfricas e as Áfricas na Pan-Amazônia, manifestam-se em repúdio a todas as formas de violências, cerceamentos ao direito à vida e a terra aos trabalhadores rurais e aos grupos e comunidades indígenas das Amazônias.
Há pouco mais de um ano trabalhadores rurais e urbanos e inúmeras famílias de camponeses e indígenas do Departamento de Pando, na Bolívia, foram atingidos pela sanha covarde e genocida de grupos paramilitares que disseminaram todo seu ódio assassinando e violentando centenas de mulheres, crianças e homens naquela parte da Amazônia. Seus algozes fugiram para a cidade Brasiléia, no Brasil e continuam impunes até a presente data.

Há mais de 15 anos os Kaiowá-Guarani, no Mato Grosso do Sul, lutam pela devolução e demarcação de suas terras ancestrais, invadidas pelo latifúndio e pelo agronegócio. O resultado dessa longa e inexplicável espera, tem provocado a morte de inúmeras crianças por desnutrição e o suicídio de centenas de jovens. A situação é gritante, principalmente, porque as lideranças Kaiowá-Guarani têm sido sistematicamente assassinadas, por pistoleiros a mando do agronegócio, com a cumplicidade de autoridades governamentais que deixam tais crimes na mais completa impunidade. Exemplo dessa lamentável realidade foi o que ocorreu, há duas semanas, em Paranhos - MS, com o desaparecimento e cruel assassinato dos professores Guaranis Genivaldo Vera e Ronildo Vera (ainda desaparecido) da aldeia Pirajuí.

Indignados, firmamos este documento, como um manifesto em defesa da vida, da liberdade e da igualdade na diferença. Para que a violência e a impunidade não continuem a prosperar em nossas Amazônias, em nossos territórios, em nossas culturas". (Carta da UFAC - Rio Branco - Acre, 23 de novembro de 2009)

Kurusu Ambá - de volta à terra sagrada

Depois de terem rezado por vários dias, os Nhanderu, os espíritos guerreiros, Tupã, o Deus da Vida, decidiram pelo retorno ao tekoha Kurusu Ambá. Em comunicado à opinião publica do Brasil e do mundo, expressam as razões da sua decisão:

"Já faz quase 4 anos que estamos na beira da Rodovia MS 289 que liga Amambaí a Coronel Sapucaia , onde nossas famílias, nossas crianças, só estão bebendo água suja. Estamos sem condições de desenvolver nossa agricultura de subsistência; estamos sem atendimento na saúde, sem perspectiva de futuro para as famílias, e jogados à nossa propria sorte, violados em toda a nossa dignidade e levando uma suposta vida, que para nós é morte. Nós somos merecedores também de respeito e consideração das autoridades nacionais e regionais.

Gritamos que uma questão de fundamental importância, que a nossa comunidade aguarda com paciência, faz muito tempo, é o trabalho de identificação na área reivindicada, pelo Grupo Técnico (GT). O atraso excessivo fere nossa paciência, acaba devagar com a nossa vida, nos expõe ao genocídio.
Que desde 2007 temos encaminhando uma grande quantidade de documentos a órgãos públicos e organismo de direitos humanos do Brasil e do Mundo denunciando a situação de violência na qual tentamos sobreviver, solicitando a urgente demarcação de nossas terras.
Que em vários momentos temos alertado à Fundação Nacional do Índio (FUNAI), Ministério Público Federal (MPF), e políticos que dizem apoiar a nossa luta; que, por conta do atraso no inicio da demarcação de nosso território e pela violação permanente e sistemática de nossos direitos fundamentais íamos de novo chegar à extrema situação de retomar as nossas terras sagradas tradicionais (Tekohá Guasú) como única saída e resposta ao abandono que sofremos".

No comunicado anunciam seu retorno à terra sagrada, com muita disposição e esperança, em cumprimento e coerência ao compromisso assumido por todos na Aty Guasu de Yvy Katu. Concluem o comunicado com veemente apelo:

"Que perante qualquer ato de violência que eventualmente seja praticada contra o nosso povo responsabilizamos os setores anti-indígenas que pregam a violência neste Estado e desrespeitam a Constituição Federal.Exigimos do governo federal a urgente adoção de medidas de segurança para permanecermos em nossas terras, pois o que estamos fazendo é para ajudar a agilizar o processo de demarcação de nosso antigo tekohá e dar vida à constituição federal que para nós até agora e letra morta.

Exigimos ao Governo Federal o cumprimento de sua obrigação constitucional perante a Lei maior do Brasil, demarcando o nosso território e o território de todos os Kaiowá-Guarani de Mato Grosso do Sul.
Solicitamos neste momento de grande importância para a nossa vida e a vida dos Kaiowá-Guarani, solidariedade de todas as organizações indígenas que existem no Brasil, e de organismos internacionais que sempre apoiaram a nossa luta e a luta dos povos indígenas no Mato Grosso do Sul.
Basta de violência! Esta terra tem dono! Retornamos hoje a nossa terra sagrada!"

(Comunidade Indígena Kurusú Ambá -Município de Amambaí/MS Brasil -Novembro de 2009)

Rio Branco - Acre, 24 de novembro de 2009

* Assessor do Conselho Indigenista Missionário (CIMI) Mato Grosso do Sul

As notícias aqui publicadas são pesquisadas diariamente em diferentes fontes e transcritas tal qual apresentadas em seu canal de origem. O Instituto Socioambiental não se responsabiliza pelas opiniões ou erros publicados nestes textos. Caso você encontre alguma inconsistência nas notícias, por favor, entre em contato diretamente com a fonte.