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Prevenção a enchente divide gestão Kassab

FSP, Cotidiano, p. C1
21 de Jul de 2010

Prevenção a enchente divide gestão Kassab
Secretaria do Verde aponta "riscos intoleráveis" na interpretação da cúpula da prefeitura sobre leis ambientais
No "Diário Oficial", pasta contesta o aval da Secretaria de Negócios Jurídicos para ampliar obra perto de córrego

Alencar Izidoro
Eduardo Geraque
De São Paulo

A permissão de construir às margens de córregos e de rios na malha urbana de São Paulo rachou a gestão do prefeito Gilberto Kassab (DEM).
A Secretaria do Verde e do Meio Ambiente expôs a divergência publicamente ao citar "riscos socioambientais intoleráveis" a partir da interpretação que a cúpula da prefeitura faz da legislação.
Para a pasta, isso vai contra a estratégia de combate as enchentes ao permitir a ocupação de novos empreendimentos mais perto de cursos d'água do que as distâncias fixadas no Código Florestal.
Por esse código, que é uma legislação federal, é necessário preservar um espaço de no mínimo 30 m de rios e córregos (pode ser mais, conforme a largura dos mesmos), áreas consideradas como de "preservação permanente".
Com aval da assessoria de Kassab, porém, a Secretaria de Negócios Jurídicos interpreta que essa restrição não se aplica a trechos urbanos.
Avalia que devem prevalecer normas municipais (pelo código de obras, há reservas entre dois e 15 metros, exceto em condições especiais).
O pivô da divergência foi a análise da ampliação de um condomínio que fica ao lado de um afluente canalizado do córrego Jaboticabal, no Sacomã, zona sul de SP.
Os moradores do Sapê Suíça 3, próximo do km 12 da rodovia Anchieta, já enfrentam alguns alagamentos que chegavam às canelas, conforme relato do zelador. Mesmo assim, planejavam construir salões de jogos e brinquedoteca mais perto do córrego.
Conforme informou a prefeitura a moradores, seria possível um recuo de 7,5 m. A pasta do Ambiente -que não havia sido procurada, mas soube do caso após uma denúncia -se manifestou então contra a obra.

"PRETEXTO"
A divergência entre as pastas foi parar no "Diário Oficial", que publicou despacho do secretário Eduardo Jorge (Verde e Meio Ambiente).
"Não se pode de maneira alguma interpretar [cita a lei] como pretexto para se eliminar a proteção ambiental dos cursos d'água e das regiões de várzea", escreveu ele. "Não se pode colocar em risco a população, permitindo a manutenção ou a criação de riscos socioambientais intoleráveis", completou.
Questionada pela Folha, a assessoria da pasta informou que a "observação estrita" do Código Florestal "é essencial para nossa estratégia de combate às enchentes".
Procuradas pela Folha, as assessorias de imprensa de Kassab e a pasta dos Negócios Jurídicos não comentaram o assunto.
Entre advogados e especialistas em ambiente, não há consenso sobre o tema.
"Todas as ocupações devem considerar as áreas permanentes. Não é verdade que a lei municipal impera", diz o advogado e ambientalista André Lima.
Para Caio Portugal, vice-presidente de Desenvolvimento Urbano Sustentável do Secovi-SP, a questão ambiental não pode pesar mais que as outras. "Tem as questões econômicas e sociais."
Os dois concordam que esse racha ficou mais evidente depois de 1989, quando houve alterações nas metragens das áreas de proteção.

http://www1.folha.uol.com.br/fsp/cotidian/ff2107201001.htm

Condomínio que já alaga queria ampliar área

De São Paulo

No condomínio Sapê Suíça 3, alvo da divergência, a água pode atingir a canela de quem está no estacionamento em dias de chuva forte.
"Já acordei até de madrugada, preocupado com os carros dos moradores", diz Daniel Soares, 55, zelador.
Mesmo assim, não falta quem queira construir cada vez mais perto do córrego Jaboticabal -onde, após ser parcialmente canalizado, as inundações só pioraram.
Os problemas começam com pequenas casas erguidas, de forma irregular, quase grudadas no curso d'água.
O condomínio, de 16 blocos e 288 apartamentos, também construiu uma quadra de futebol de areia a menos de cinco metros do córrego.
E planejava também salões de jogos e brinquedoteca quase no mesmo lugar.
"Desistimos. Vamos fazer mais recuado", conta Daniel, que recebeu a visita de técnicos para embargar as obras.
A expansão da área de lazer agora não vai ficar tão perto do córrego, mas novos prédios já começaram a ser erguidos por uma construtora que tinha planos de vender apartamentos avaliados entre R$ 155 mil e R$ 175 mil.
Há sinais de obra no local. Funcionários dizem que elas continuam porque estão a 30 metros do córrego -embora outras áreas do condomínio mais distantes sofram com as chuvas. O dono nega.

POSTO
A obediência às normas do Código Florestal mesmo em áreas urbanas é defendida pela Cetesb e também pelo promotor José Eduardo Lutti, ligado ao Meio Ambiente.
Em abril, a Cetesb negou a licença de um posto de combustível na av. Abraão de Moraes 2.233, construído sem sua autorização às margens do córrego do Ipiranga. Motivo: parte do terreno estava a menos de 30 metros da água.
A estatal, porém, atendeu ao recurso do posto porque diz que ele mostrou com fotos e documentos que a área estava ocupada antes do Código Florestal. A obra, porém, foi embargada pela prefeitura, que apura a regularidade na concessão do alvará.

http://www1.folha.uol.com.br/fsp/cotidian/ff2107201003.htm

Saiba mais

Novo código pode facilitar ocupação

De São Paulo

O novo Código Florestal facilitará a ocupação das margens de rios urbanos, caso seja aprovado pelo Congresso como está.
Um item específico em um dos artigos do projeto de lei diz que, nas cidades, as faixas marginais sem edificação de cada lado do rio deverão ter 30 metros.
A atual legislação afirma que os rios urbanos devem ter suas margens preservadas de acordo com suas larguras- as faixas vão de 30 a até 600 metros.
Além de limitar a preservação a 30 metros, o projeto ainda abre brecha para que os Estados diminuam ainda mais o espaço onde é proibido construir -a largura regulamentar poderá variar 50% para mais ou para menos.
Isso significa que um rio com centenas de metros de largura, por exemplo, poderá ter uma área de segurança, sem ocupação, de apenas 15 metros.

http://www1.folha.uol.com.br/fsp/cotidian/ff2107201004.htm

FSP, 21/07/2010, Cotidiano, p. C1

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