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PF detém grupo suspeito de negociar áreas ambientais

FSP, Brasil, p. A4
04 de Mai de 2007

PF detém grupo suspeito de negociar áreas ambientais
Operação Moeda Verde prende 19 pessoas em Florianópolis e em Porto Alegre
Servidores teriam recebido propina para facilitar a construção de grandes empreendimentos em áreas de proteção ambiental

Mari Tortato
Da agência Folha, em Curitiba

Matheus Pichonelli
Da agência Folha

A Polícia Federal prendeu ontem, em Florianópolis e em Porto Alegre, 19 suspeitos de participação em esquema de venda de leis e atos administrativos em favor de grandes empreendimentos imobiliários na capital catarinense.
Foram expedidos mandados de prisão temporária para 22 pessoas, entre elas um vereador de Florianópolis, dois secretários municipais e o chefe do órgão ambiental da cidade, além de nove empresários. O presidente da construtora Habitasul, Péricles Druck, e Fernando de Mattos, dono do resort Costão do Santinho, um dos mais luxuosos do país, estão entre os presos.
A Operação Moeda Verde investiga suspeitas de corrupção na liberação de autorizações para construção em áreas da União ou de proteção ambiental. O nome da operação é uma referência a negociações em que "a moeda de troca envolve o ambiente", segundo a PF.
A delegada Julia Vergara disse que o suposto esquema ""fazia uso da máquina pública de acordo com os interesses de quem ocupava o cargo".
Afirmou ainda que servidores estaduais e do município recebiam propina para chancelarem construções ilegais.
As edificações eram construídas ou causavam impacto em áreas protegidas por leis ambientais federais ou localizadas em área da Marinha.

Origem da operação
A investigação começou em agosto de 2006, na apuração de suspeita de crime ambiental no loteamento milionário "Il Campanário", que a construtora gaúcha Habitasul ergue na praia de Jurerê Internacional.
O metro quadrado no loteamento pode custar até R$ 10 mil. O valor mínimo é R$ 850.
Segundo a Folha apurou, a PF suspeita que o coordenador do projeto pela Habitasul, Hélio Chevarria, preso ontem, tenha pago propina a servidores públicos e a políticos para obter licença ambiental e construir em área de proteção.
O presidente da Habitasul e outro diretor da construtora foram presos em casa, em Porto Alegre.
O vereador Juarez Silveira (sem partido) é apontado pela Polícia Federal como o cabeça do esquema. A apuração detectou autorização irregular para a construção do empreendimento habitacional Vilas do Costão, expansão do resort Costão do Santinho, localizado na praia de mesmo nome, no leste da ilha. De acordo com laudo ambiental, a obra compromete o lençol freático daquela encosta.
Também há suspeitas sobre autorizações concedidas ao Shopping Iguatemi, inaugurado no mês passado. O empresário controlador do shopping, Paulo Cezar Maciel da Silva, também teve a prisão temporária decretada, mas não foi encontrado pela PF ontem. Segundo a polícia, o dono do shopping conseguiu, por meio de tráfico de influência, mudar o Plano Diretor de Florianópolis para "legalizar" a obra.
A transação teria envolvido o presidente da Santur (empresa de turismo do governo catarinense), o vereador licenciado Marcílio Ávila (PMDB) e o secretário de Obras do município, Aurélio Remor. Um hospital, um restaurante e um colégio também estão sob suspeita de terem obtido licenças ilegais.

Crimes
O inquérito do caso corre sob segredo de Justiça. A operação investiga crimes contra a ordem tributária, falsificação de documento, uso de documento falso, formação de quadrilha, corrupção e tráfico de influência. Houve buscas, apreensões e prisões na Fatma (Fundação do Meio Ambiente do Estado), na Secretaria de Urbanismo, no Instituto de Planejamento Urbano e na Fundação do Meio Ambiente de Florianópolis, em escritórios de empresas e em casas de investigados.
No início da noite de ontem, a Justiça Federal soltou três dos presos, entre eles o secretário Aurélio Remor. O pedido de liberação foi feito pela PF e teve parecer favorável do Ministério Público Federal. A Justiça autorizou também a internação do vereador Juarez Silveira, com base em laudo médico.
A PF informou que houve apreensão de "muito dinheiro ilícito" em uma das empresas investigadas, mas não revelou a quantia. Também foram apreendidos oito veículos que, segundo a PF, estavam em nome ou eram usados pelo vereador Silveira.

Outro lado
Prefeito diz ter afastado secretários

Da agência Folha

O prefeito de Florianópolis, Dário Berger (PSDB), anunciou ontem o afastamento temporário dos dois secretários e três servidores da prefeitura detidos na Operação Moeda Verde da PF.
Berger afirmou que determinará a abertura de inquérito administrativo para apurar o caso e que isso será feito concomitantemente à investigação da PF. Segundo ele, os empreendimentos sob suspeita foram licenciados antes de seu mandato. "Estamos isentos."
Procurada para comentar a declaração de Berger, a ex-prefeita da cidade Angela Amin (PP) disse que "está na hora de o prefeito assumir que é o prefeito".
O procurador-geral do município, Jaime de Souza, afirmou que todos os empreendimentos sob suspeita já tinham firmado termo de ajustamento de conduta. "A prefeitura esteve presente na elaboração e fiscalização desses empreendimentos e eles cumpriram rigorosamente o que foi estabelecido", disse Souza, que defendeu os servidores. "São pessoas da mais alta confiança e queremos tê-las de volta ao trabalho."
Para o diretor-presidente da Fatma (órgão estadual de ambiente), Carlos Kreuz, a entidade não tem nada a temer. Um servidor do órgão foi preso. "Sendo encontradas irregularidades, seremos os primeiros a punir os culpados."
No fim da tarde de ontem, na sede da PF em Florianópolis, advogados dos acusados diziam que, até aquele momento, ainda não tinham recebido os termos da acusação. Afirmavam que apenas com documento em mãos poderiam se pronunciar.
A Folha tentou falar com servidores, políticos e representantes das empresas citadas pela PF. A maioria preferiu não se pronunciar, afirmou não ter informações sobre as acusações ou não ligou de volta. Ninguém atendeu no gabinete e no celular do vereador Juarez Silveira.
A diretora institucional do Grupo Habitasul, Andrea Druck de Oliveira Souto, filha de Péricles Druck, detido ontem, negou que a empresa tenha concedido benefícios a servidores públicos para obter licenças ambientais.
"A construção de Jurerê Internacional foi aprovada em 1980 por órgãos competentes e, de lá para cá, houve revalidação e fiscalização", disse.
Em nota, a direção do Shopping Iguatemi informou desempenhar "suas funções em estrita observância das leis brasileiras" e que o estabelecimento continuará operando.

Trabalho em ONG: investigados defendem projetos de urbanização

Diretores de empresas acusadas de envolvimento no esquema de compra de licenças ambientais em Florianópolis criaram uma ONG que faz publicidade defendendo o "planejamento urbano". O movimento Floripamanhã reúne em seu conselho consultivo empresários locais -entre eles Fernando Marcondes de Mattos, do resort Costão do Santinho, que é vice-presidente da ONG e foi preso na Operação Moeda Verde, Paulo Cezar Maciel da Silva, do Shopping Iguatemi, e Péricles de Freitas Druck, do grupo Habitasul. A ONG diz que reúne também líderes comunitários e professores.

FSP, 04/05/2007, Brasil, p. A4

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