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O preço do progresso

O Globo, Rio, p. 10
06 de Nov de 2009

O preço do progresso
CSA aumentará em 76% o lançamento de dióxido de carbono na atmosfera da cidade

Tulio Brandão
O Rio de Janeiro vai aumentar em 76,3% a sua carga de gases de efeito estufa na atmosfera.

A Companhia Siderúrgica do Atlântico (CSA) - maior investimento do setor privado do país, que iniciará suas operações em 2010, em Santa Cruz, na Zona Oeste - produzirá 9,7 milhões de toneladas de dióxido de carbono (CO2) por ano. O total de emissões da cidade, segundo o último inventário feito pela prefeitura do Rio, é apenas um pouco maior - 12,7 milhões.

O valor da CSA representa mais de 12 vezes o total de emissões industriais desse gás no município e cerca de 14% do total de emissões do estado (incluindo todas as fontes), que atualmente gira em torno de 70 milhões de toneladas, segundo dados da Secretaria estadual do Ambiente (SEA). A notícia vem a público a exatos 30 dias da Conferência da ONU sobre Mudanças Climáticas, em Copenhague, cujo tema central são as soluções e metas para redução das emissões de CO2 e outros gases de efeito estufa.

A questão é ainda mais complexa porque a legislação que regula o licenciamento ambiental não exige neutralização ou compensação para as emissões de carbono das indústrias. A CSA está trabalhando com o que há de mais moderno em equipamentos de siderurgia do mundo, o que reduz a média de emissões, mas, ainda assim, pelo tamanho da indústria, o volume emitido é grande.
Programa para reduzir emissões
Para tentar contornar o problema, a Secretaria estadual do Ambiente vai criar um programa para obrigar as indústrias a reduzirem gradualmente suas emissões.

- Vamos discutir com todos os setores da indústria, um a um, a começar pela siderurgia, as metas a serem alcançadas. Há caminhos de compensação de emissão, como a utilização de carvão vegetal, o plantio de árvores e o uso da escória da siderurgia na produção de cimento - diz a secretária do Ambiente, Marilene Ramos, que ainda não considera o aumento de emissões preocupante.

- Como o Estado do Rio é historicamente pouco industrializado, a emissão ainda é muito baixa em relação aos outros estados mais industrializados, e ainda menor se compararmos a países ricos.

A conta da participação da CSA no total de emissões da cidade foi apresentada pelo vereador Alfredo Sirkis (PV). Ele vai propor emenda num projeto de lei de concessão de incentivos fiscais para a siderúrgica, que será votado na próxima terçafeira, exigindo a neutralização total das emissões de carbono.

- É possível fazer essa neutralização por diversas formas de compensação.

A exigência é a única forma de neutralizar, porque a legislação é omissa em relação a gases de efeito estufa. O Estado do Rio está atrasado neste sentido. Isso não é uma crítica em relação ao governo.

Eles fazem o possível e imaginável para obrigar a indústria a reduzir as emissões, mas não têm muitos meios legais para isso - afirma.

O obstáculo do poder público é a inexistência de um limite de emissões de carbono para a indústria siderúrgica.

A restrição no processo de licenciamento teria, então, que ser feita pelos estados, que ficam entre a cruz e a espada: se criam legislação restritiva específica, perdem a concorrência para estados com leis mais flexíveis.

Um dos argumentos para a exigência, segundo Sirkis, é o fato de a sócia majoritária da indústria, a ThyssenKrupp, ser da Alemanha.

Lá, eles estão amarrados a metas restritivas: a União Europeia deve apresentar na Conferência da ONU, em dezembro, uma proposta de redução de 20% das emissões de carbono: - Gases de efeito estufa têm efeito global, não importa se saem do Brasil ou da Alemanha. Mas lá eles seriam obrigados a reduzir absurdamente essas emissões.
Empresa alega que cumpre exigências
O inventário de emissões de gases de efeito estufa do município, produzido pela Coppe/UFRJ e publicado num livro da prefeitura sobre os indicadores ambientais do Rio, é de 2000, mas o documento ainda é considerado válido, sobretudo porque há uma tendência de queda no valor das emissões industriais, devido à saída de várias empresas da cidade.

O documento mostra que a emissão industrial diminuiu de 1,46 milhão de toneladas de CO2 por ano em 1990 para 793 mil em 1998.

Segundo o inventário de emissões de gases de efeito estufa do Estado do Rio, publicado em 2007, o total de emissões é de 65,7 milhões de toneladas por ano. Marilene Ramos, no entanto, explicou que esse dado está sendo atualizado, e que hoje o valor gira em torno de 70 milhões, segundo estimativas de especialistas.

A ThyssenKrupp CSA Siderúrgica do Atlântico informou, em nota, que "cumpre todas as exigências da legislação em vigor e que as autoridades ambientais brasileiras têm pleno conhecimento de todas as etapas do processo de implantação de seu complexo siderúrgico." O texto diz ainda que "o projeto, aprovado pelos órgãos ambientais competentes, foi desenvolvido dentro dos melhores padrões brasileiros e europeus de operação.". De acordo com a assessoria de imprensa, a empresa vai examinar possíveis alternativas de compensação a partir da entrada em operação do complexo siderúrgico, mas, atualmente, não pode dar mais informações porque cumpre o chamado "período de silêncio" até o dia 26 de novembro, quando serão divulgados os resultados da empresa.

A medida é adotada em companhia de capital aberto.

A própria Secretaria estadual do Ambiente reconhece o esforço da CSA para reduzir as emissões. Segundo a Superintendência de Clima e Mercado de Carbono do órgão estadual, no cálculo da relação entre a tonelada de CO2 emitido e a tonelada de aço produzido, a indústria tem uma média de 1,7. A média é considerada boa até para países ricos. Em países em desenvolvimento, a faixa considerada aceitável fica entre 1,6 e 3,5, mas a maioria das siderúrgicas - sobretudo as mais antigas - tem médias superiores a 2,5.

A Federação das Indústrias do Estado do Rio de Janeiro (Firjan) considera importante encontrar mecanismos de redução de emissões. O gerente de meio ambiente da entidade, Luiz Augusto Carneiro, avalia que as contrapartidas da CSA superam os impactos negativos.

- No processo de desenvolvimento socioeconômico, a vertente industrial é muito importante. E, inevitavelmente, tem impactos positivos e negativos. Não tenho dúvida de que o balanço final da CSA é positivo.

O empreendimento vai mudar a região, agregar tecnologia, gerar milhares de empregos. Com relação aos impactos da mudança do clima, a indústria tem plena consciência de que não pode contar apenas com o esforço de países desenvolvidos.

Temos que fazer a nossa parte. O melhor caminho, a meu ver, é o da negociação de compromissos voluntários entre o poder público e a indústria.
Impacto do CO2 na saúde é indireto
Em relação à poluição local, a CSA pode não ser tão impactante. Segundo Paulo Artaxo, coordenador do Laboratório de Física Atmosférica da USP, de modo geral, as emissões das indústrias dependem do nível de avanço tecnológico empregado.

Ele disse que uma pequena indústria sem equipamentos de proteção pode causar grandes danos ao ambiente, enquanto uma outra, maior, com equipamentos adequados, pode causar impacto menor. Ainda de acordo com o especialista, precipitadores eletrostáticos instalados nas chaminés podem remover 99% do material particulado - considerado prejudicial à saúde humana.

- O CO2 não é um poluente atmosférico, ou seja, ele não tem impacto direto na saúde das pessoas - diz Paulo Artaxo, coordenador do Laboratório de Física Atmosférica da USP. - O impacto é indireto, já que é um gás de efeito estufa.

O cálculos de gases de efeito estufa são normalmente publicados em CO2 equivalente, que é a soma de todos os gases que interferem no efeito estufa.
Para conceder o habite-se, o plantio de mudas
Prefeitura cria contrapartida ambiental para liberar novas construções

Luiz Ernesto Magalhães

A prefeitura decidiu exigir no momento da concessão do habite-se de novas construções uma contrapartida ambiental em forma de mudas de espécies da Mata Atlântica. Essas mudas serão usadas nos programas de reflorestamento da Secretaria municipal de Meio Ambiente. As regras, que entraram em vigor ontem, fazem parte do legado ambiental proposto ao Comitê Olímpico Internacional (COI) como parte da organização das Olimpíadas de 2016. A ideia é que o plantio das mudas compense a emissão de gases do efeito estufa produzidos pelo deslocamento de materiais para o canteiro de obras, dos resíduos da construção civil e do movimento da terra.

O secretário municipal de Meio Ambiente e viceprefeito, Carlos Alberto Muniz, disse que, como política sustentável, é inédita no Brasil. A contrapartida ambiental será exigida em todos os projetos a partir de 180 metros quadrados de área construída.

O empreiteiro terá que fornecer uma muda a cada 60 metros quadrados construídos acima dos 180 metros quadrados.

Com base nas licenças emitidas pela Secretaria municipal de Urbanismo, a estimativa é que a prefeitura receba cerca de 72 mil mudas por ano. Boa parte delas será usada no reflorestamento do Parque Estadual da Pedra Branca, que tem uma de suas vertentes nas vizinhanças da região da Barra da Tijuca, onde estarão concentradas boa parte das provas olímpicas.

O presidente do Sindicato da Indústria da Construção Civil, Roberto Kauffmann, elogiou a medida. Mas ele disse que outros mecanismos poderiam ser aplicados como contrapartidas ambientais. E cita como exemplo, projetos que prevejam a reciclagem de água das chuvas ou que favoreçam a iluminação natural.

O secretário, por sua vez, argumenta que essa implantação não seria viável neste momento.

- Se criássemos mais exigências isso poderia dificultar muito o processo de habite-se. Essa é uma medida simples e fácil de ser entendida - justificou o secretário.

O Globo, 06/11/2009, Rio, p. 10

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