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Lei da Mata Atlântica entra em vigor

OESP, Vida, p. A18
23 de Dez de 2006

Lei da Mata Atlântica entra em vigor
Após 14 anos de debate, texto prevê proteção do pouco que resta do bioma e cria mecanismos de recuperação

Lisandra Paraguassú

Depois de 14 anos de idas e vindas, a lei que protege o que resta da mata atlântica afinal entra em vigor. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva sancionou ontem, em uma cerimônia no Palácio do Planalto, o texto aprovado em 29 de novembro pelo Congresso, depois de mais de uma década de tramitação, dois arquivamentos e várias manobras que por pouco não a descaracterizaram totalmente.

A área original da mata atlântica vai do Rio Grande do Sul ao Piauí, incluindo Minas Gerais, e abriga hoje 3.409 municípios. Da cobertura original de 1,1 milhão de quilômetros quadrados, hoje só restam 6,98% de área vegetal conservada, segundo a ONG SOS Mata Atlântica.

Desde 1992, quando o ex-deputado Fábio Feldmann (PV-SP) apresentou a proposta da lei, a cada ano a mata atlântica perdeu 100 mil hectares. "A área do bioma da mata atlântica compreende 70% da população brasileira. São 120 milhões de pessoas cuja existência está intimamente ligada aos serviços ambientais providos pela mata atlântica", disse a ministra do Meio Ambiente, Marina Silva.

PRÁTICA
Apesar de existir um decreto de proteção editado em 1993, que valia até a sanção da lei, o efeito na contenção do desmatamento foi pequeno. Apenas de 2000 para cá é que houve uma queda significativa na destruição da mata, com uma redução de 70% do ritmo. Apesar disso, alguns Estados, especialmente Santa Catarina e Paraná, não pararam com a destruição.

Apenas os catarinenses derrubaram 48 mil hectares, mais do que outros sete Estados do Sul e Sudeste juntos nesse período. "O decreto já instituía o domínio amplo das áreas de mata atlântica, mas não tinha força de lei. Alguns Estados, como o Paraná, não se sentiam obrigados a cumpri-lo, especialmente sobre as matas de araucárias, que não consideravam parte do bioma da mata atlântica", diz Miriam Prochnow, coordenadora da rede de ONGs em Defesa da Mata Atlântica.

A lei proíbe o desmatamento da área que resta de mata, incentiva a recuperação de locais hoje degradados e limita a exploração econômica a empreendimentos de desenvolvimento sustentável. Um fundo financeiro, que ainda precisa ser regulamentado, terá recursos federais para projetos de regeneração das áreas degradadas mas não totalmente desmatadas.

O texto ainda cria oportunidades para que fazendeiros que tenham descumprido o Código Florestal possam regularizar sua situação. A lei prevê a manutenção, em cada propriedade, de uma reserva de mata nativa de 20% da propriedade. Quem desmatou a mais poderá regularizar sua situação comprando terras ainda preservadas e doando-as para o poder público criar unidades de conservação. "É um dispositivo muito importante, porque vai permitir a ampliação das áreas conservadas", afirmou Miriam.

CAMINHO LONGO
A lei da mata atlântica é a primeira a proteger um dos biomas definidos como patrimônio nacional pela Constituição. Os demais são a zona costeira, a Amazônia e o Pantanal - cerrado, caatinga e campos sulinos não têm tal status.

Sua aprovação não foi fácil. Por duas vezes a proposta foi arquivada. Foi reativada pela primeira vez em 1997, quando o então deputado Paulo Bornhausen (PFL-SC), na comissão de Minas e Energia da Câmara, transformou o texto de forma que, na prática, permitisse a derrubada do que restara. O projeto foi arquivado de novo e só recuperado em 2003, com apoio do governo Lula.

A data de sanção não foi escolhida aleatoriamente. Ontem fez 18 anos que o ambientalista Chico Mendes foi assassinado.

O que prevê a Lei

Preservação:
Garante a conservação dos 7% que restam dos 1,3 milhão de quilômetros quadrados originais de mata atlântica

Desmatamento:
Não pode haver desmatamento para loteamento ou edificação em áreas de mata original nas regiões urbanas. No que tiver sido aprovado antes de a lei entrar em vigor, a supressão da vegetação secundária em estágio avançado de regeneração depende de autorização do órgão estadual competente e depende da preservação de 50% da área total coberta pela vegetação

Recursos:
É criado o Fundo de Restauração do Bioma Mata Atlântica para projetos de restauração ambiental e de pesquisa científica, que ainda precisará de um decreto de regulamentação para ser implementado. Também são previstos incentivos fiscais para o proprietário que tenha vegetação primária ou secundária em regeneração

Compensação:
Determina que a conservação da vegetação primária ou secundária em qualquer estágio de regeneração cumpre função social e é de interesse público. Mas as áreas sujeitas à restrição podem ser computadas para efeito da reserva legal e seu excedente utilizado para fins de compensação ambiental

Legalização:
Permite que proprietários de terras que já não têm os 20% de reserva legal que a lei ambiental exige possam comprar outras áreas de mata ainda nativa e as doem para o Estado, a fim de que sejam transformadas em unidades de conservação

Obras:
Determina que obras de interesse público - como hidrelétricas ou estradas - só possam ser construídas em áreas de regeneração avançada se não houver qualquer outra alternativa técnica ou de local

OESP, 23/12/2006, Vida, p. A18

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