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Governo altera processo administrativo ambiental

Valor Econômico, Legislação, p. E1
25 de Jan de 2023

Governo altera processo administrativo ambiental
Decreto acaba com audiência de conciliação antes do processo administrativo

Por Adriana Aguiar
De São Paulo 25/01/2023

As empresas ou pessoas autuadas por infrações ambientais, na esfera federal, não podem mais solicitar uma audiência de conciliação e tentar evitar um processo administrativo. A medida, instituída pelo governo Bolsonaro, foi revogada pelo Decreto no 11.373, assinado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva em seu primeiro dia de mandato.

A ideia do governo Lula é acelerar a tramitação desses processos, para evitar a prescrição das autuações - o prazo é de três anos. Com as audiências de conciliação, quase 45 mil processos correriam esse risco, segundo o Ibama. Juntos, somam mais de R$ 18 bilhões em autuações.

De 2020 a 2022, foram contabilizados 14.327 processos julgados pelo Ibama. Em 2020, foram 2.212. Em 2021, 7.044. E em 2022, um total de 5.071.

Com a mudança, quem for autuado pelo Ibama ou pelo Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMbio) deverá apresentar a defesa administrativa, diretamente, no prazo de 20 dias. Antes esse prazo corria após a audiência de conciliação - que estava prevista no Decreto no 9.760, de abril de 2019.

Nas audiências, segundo o advogado Rafael Feldmann, sócio da área ambiental do Cascione Advogados, o auto de infração era revisto pelo Núcleo de Conciliação. Era possível, acrescenta, revisar ou rediscutir valores ou mesmo a reapreciação de eventuais ilegalidades. "Tem gente manifestando que esse tipo de audiência era protelatório. Eu discordo. Essa audiência era uma oportunidade das partes sentarem para conversar e entender o problema", diz.

Em geral, essas audiências demoravam de um ano a um ano e meio para serem marcadas, afirma Feldmann. Esse prazo longo deve-se, de acordo com o advogado, à falta de pessoal nos órgãos de fiscalização ambiental.

Com a edição do novo decreto, diz o advogado, fica agora a dúvida sobre os casos em que foram feitos os pedidos de audiência e se aguardava apenas a designação da data. "Com a revogação, não sabemos se haverá uma regra transitória", afirma.

A advogada Maria Christina Gueorguiev, sócia da área ambiental do Veirano Advogados, considerava uma boa medida a audiência de conciliação. "Mas na prática, segundo a percepção do governo atual, esses processos estavam perdendo a celeridade, uma vez que estavam levando mais tempo. Os órgãos ambientais não tinham gente suficiente para dar essa tramitação mais rápida", diz.

Já na visão do assessor legislativo do Instituto Socioambiental (ISA), Kenzo Jucá, esse novo decreto assinado por Lula é extremamente importante para acabar com o que ele chama de "câmara da anistia". Para ele, essas audiências de conciliação tinham como objetivo cancelar, por meio da prescrição, todos os autos de infrações ambientais existentes no país.

De acordo com Jucá, "esse decreto busca ajustar a rota e reverter a sinalização de carta branca para o crime ambiental, num país em que vale tudo". A norma, acrescenta, visa reduzir prejuízos aos país.

O primeiro deles, o ambiental. O discurso de impunidade do governo Bolsonaro, afirma, fez com que crescesse o desmatamento, a grilagem, as invasões de áreas indígenas e o garimpo ilegal.

A medida também evitaria o prejuízo econômico e financeiro, diz o assessor legislativo. Segundo ele, essas autuações pendentes devem gerar quase R$ 20 bilhões para o orçamento público - que poderiam ser usados em políticas públicas na área de meio ambiente.

Além disso, afirma, pode recuperar a imagem da produção agropecuária. "O mercado internacional já não tinha segurança do que é legal ou ilegal no Brasil", diz ele, acrescentando que acelerar esses processos administrativos demonstra que a maioria das empresas do agronegócio vive dentro da legalidade e que existem normas a serem cumpridas.

Entre os primeiros atos assinados ainda durante a cerimônia de posse pelo presidente Lula, ao menos seis medidas foram direcionadas à área ambiental. Além do Decreto no 11373, de 2023, que tratou das novas regras para os processos por infrações ambientais, foi editado também o Decreto no 11.369, que revogou norma que institui o programa de apoio ao garimpo.

Também foi editado o Decreto no 11.367, que trata da retomada dos Planos de Combate ao Desmatamento da Amazônia e Cerrado (PPCDAm e PPCerrado) e início da elaboração de planos para todos os demais biomas. Outros dois decretos, de no 11.368 e no 11.372, tratam, respectivamente, da governança do Fundo Amazônia com a recriação do Comitê Orientador, e da recomposição da participação social do Conselho Deliberativo do Fundo Nacional do Meio Ambiente (FNMA). Ainda está prevista a retomada do Conselho Nacional do Meio Ambiente, com participação social.

Por nota, o Ibama informa que o Decreto no 11.373, de 1o de janeiro de 2023, "buscou aperfeiçoar o processo sancionador ambiental, extinguindo as audiências de conciliação". E que o resultado "é o ganho de eficiência processual, sem que o autuado perca a possibilidade de aderir à conversão de multas em serviços ambientais, fonte de recursos que continuarão sendo destinados a projetos de melhoria da qualidade ambiental". Ainda segundo o órgão, "'regras de transição serão criadas para adequar os processos constituídos durante a vigência da norma anterior".

Procurado pelo Valor, o Ministério do Meio Ambiente não deu retorno até o fechamento da edição.

Valor Econômico, 25/01/2023, Legislação, p. E1

https://valor.globo.com/legislacao/noticia/2023/01/25/governo-altera-pr…

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