VOLTAR

Deputados aprovam polemica legislacao de biosseguranca

GM, Politica, p.A15
03 de Mar de 2005

Deputados aprovam polêmica legislação de biossegurança
A Câmara dos Deputados aprovou ontem à noite a nova Lei de Biossegurança, que autoriza a pesquisa com células-tronco embrionárias e regulamenta o manejo de organismos geneticamente modificados, os chamados transgênicos, no Brasil. O texto segue agora para a sanção do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Até o fechamento desta edição, os deputados não haviam votado apenas destaque apresentado pela bancada do PT para derrubar ponto central do projeto aprovado pelo Senado em outubro do ano passado.
Trata-se do artigo que reservou à Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (CTNBio) -um órgão formado por cientistas - poder para deliberar sobre a pesquisa e a comercialização de transgênicos no Brasil sem a necessidade de ouvir antes órgãos e entidades de registro e fiscalização.
Entre eles, o Instituto Brasileiro de Meio Ambiente (Ibama) e a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), que são vinculados, respectivamente, aos ministérios do Meio Ambiente e da Saúde. Os deputados petistas queriam que a consulta prévia ao Ibama e à Anvisa fosse obrigatória. No pano de fundo, tentavam impedir mais uma derrota da ministra Marina Silva. Em 2003 e 2004, Marina não conseguiu impedir o presidente Lula de assinar três medidas provisórias que autorizaram o plantio e a comercialização de soja transgênica no país.
"A CTNBio passará a ter mais poderes do que os ministérios da Saúde e do Meio Ambiente. Isso é absolutamente inconstitucional, já que são os ministérios que possuem a competência técnica para avaliação dos riscos dos transgênicos", disse Ventura Barbeiro, da Campanha de Engenharia Genética do Greenpeace, quando da votação no Senado.
Detentora de mais de 100 votos na Casa e responsável pela indicação do relator do projeto, o deputado Darcísio Perondi (PMDB-RS), a bancada ruralista garantia ontem que a regra seria mantida. Para os interlocutores do agronegócio, a consulta prévia ao Ibama e à Anvisa é meramente burocrática e pode tornar mais demorado o início das pesquisas com transgênicos no país. Eles contam com o apoio do Planalto, que negociou uma forma de tornar menos fragorosa a derrota do Ministério do Meio Ambiente. O texto básico aprovado ontem assegura ao Ibama e à Anvisa o direito de recorrer das decisões da CTNBio ao Conselho Nacional de Biossegurança (CNBS). Formado por onze ministérios, o órgão dará a última palavra sobre a liberação do cultivo e da comercialização de transgênicos.
Outro dispositivo aprovado proíbe a comercialização, e não a pesquisa, do chamado gene exterminador, uma artimanha que beneficiaria a indústria sementeira. Trata-se de um gene introduzido na planta para que o grão colhido posteriormente seja estéril e não possa ser cultivado novamente. A nova lei de Biossegurança foi o primeiro projeto relevante aprovado pelos deputados sob o comando do presidente Severino Cavalcanti (PP-PE).

Igreja tentou impedir votação
A autorização do uso de células-tronco embrionárias em pesquisas foi um dos pontos aprovados em separado do texto principal da Lei de Biossegurança. O destaque foi efeito da resistência oferecida pela frente parlamentar evangélica e setores da sociedade ligados à Igreja Católica.
O projeto permite a pesquisa com células embrionárias, mas restringe o uso a embriões congelados há mais de três anos, portanto destinados ao descarte, e com até 14 dias de formação. A pesquisa em células embrionárias abre espaço para o desenvolvimento de curas para moléstias degenerativas causadas por lesões, morte prematura ou mau funcionamento de tecidos, como doenças neuromusculares, renais ou cardíacas, diabetes e lesões na medula, entre outras.
Hoje, a legislação permite apenas a pesquisa envolvendo as chamadas células-tronco adultas, retiradas de cordões umbilicais ou da medula óssea. Embora apresentem resultados importantes no tratamento dessas doenças, as células adultas não possuem o mesmo potencial de diferenciação das embrionárias, classificadas como totipotentes ou multipotentes pela sua capacidade de se transformar em qualquer um dos 213 tecidos diferentes que existem no corpo humano.
Segundo a geneticista Mayana Katz, coordenadora do Centro de Estudos do Genoma Humano da Universidade de São Paulo (USP), nos países (Inglaterra, Japão e Canadá, entre outros) onde essa linha de investigação científica é liberada, já se conseguiu até a geração estimulada de células neurais, fato inédito até então.
"Sem a autorização dessa linha de pesquisa, o Brasil perderá a oportunidade de acompanhar avanços da engenharia genética que possibilitarão, no futuro, acesso a cura mais barata por inúmeros pacientes. Apenas os mais ricos terão condições de buscar esse tratamento em outros países", afirma a geneticista.

GM, 03/03/2005, p. A15

As notícias aqui publicadas são pesquisadas diariamente em diferentes fontes e transcritas tal qual apresentadas em seu canal de origem. O Instituto Socioambiental não se responsabiliza pelas opiniões ou erros publicados nestes textos. Caso você encontre alguma inconsistência nas notícias, por favor, entre em contato diretamente com a fonte.