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Atentado à unidade nacional

OESP, Notas e Informações, p. A3
14 de Nov de 2008

Atentado à unidade nacional

Se não bastassem as dificuldades para a obtenção de licenças ambientais para obras de infra-estrutura fundamentais para o desenvolvimento do País, em diversos pontos do território nacional - não só na Amazônia, decerto -, agora vem à luz mais uma barreira já antiga, embora por muitos ignorada, mas que está prestes a ser posta em efetivo funcionamento: trata-se da Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), da qual o Brasil é signatário. Ela estabelece que dependerão de consultas plebiscitárias aos índios e quilombolas quaisquer iniciativas legais, normativas ou de realização de obras - como estradas, hidrelétricas, portos, linhas de transmissão e de outro gênero - que envolvam tais comunidades.

Aprovada em 1989 durante a 76ª Conferência Internacional do Trabalho e assinada pelo governo brasileiro em 1992, essa Convenção foi ratificada pelo Congresso em 2002, mesmo depois de sistemática obstrução comandada pelo ex-senador Bernardo Cabral (PMDB-AM). Entrou em vigor em 2003, mas ainda não passou a funcionar porque ainda não se descobriu como fazer um plebiscito com os índios e quilombolas toda vez que alguma iniciativa legal ou obra se aproximar de "suas terras".

Esse tema foi devidamente reavivado no seminário realizado em Brasília, nos últimos dias 10 e 11, sob o título: Oportunidades e desafios para a implementação da Convenção 169 da OIT sobre povos indígenas e tribais em países independentes. Contou com os apoios do Ministério Público Federal, da OIT, da Escola Superior do Ministério Público, da Red Juridica para la Defensa de los Derechos de los Pueblos de la Amazonía, e com a ajuda financeira da ICCO (Interkerklijke Coordinatie Commissie Ontwikkelings), da Oxfam (Oxford Comitee for Famine Relief), da RFN (RainForest Foundation da Noruega) e da União Européia, sob a coordenação da Comissão Pró-Índio de São Paulo (CPI-SP) e do Instituto Socioambiental (ISA). Como se vê, há muita instituição interessada na questão.

Do seminário participaram representantes de entidades indígenas de países latino-americanos como Guatemala, Colômbia e Bolívia, além do Brasil. Interessante foi o debate que se estabeleceu entre os brasileiros presentes. Marcelo Karamuirá, líder indígena de uma das 14 etnias do Xingu, reclamou das autoridades brasileiras que não obedeceram às determinações da Convenção 169, ao permitirem a instalação de grandes e pequenas hidrelétricas nas proximidades do Parque Nacional do Xingu sem consultá-los, no que "houve um desrespeito aos índios". Ao que o presidente da Funai, Márcio Meira, observou que a entidade que dirige não concede licenças, apenas opina naquilo que é função do Ibama.

O presidente da Funai lembrou que hoje existem no Brasil 220 etnias indígenas, que falam 180 línguas e que têm uma população estimada em cerca de 1 milhão de pessoas, sendo 440 mil em aldeias.

De qualquer forma, e considerando-se que em todo o País há cerca de 615 terras indígenas, e ainda mais um número indeterminado, mas em franca expansão, de terras de quilombolas - ocupadas por comunidades de afrodescendentes -, são previsíveis as dificuldades que se encontrarão para descobrir o modus faciendi do plebiscito destinado à concessão ou não da licença índio-quilombola prevista pela Convenção 169.

Assim se explica por que a senadora e ex-ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, apesar de demonstrar a maior boa vontade em ser a autora do projeto de lei destinado a regulamentar a Convenção 169, confessa que não tem a menor idéia de como o fará: "É preciso debater o assunto e encontrar a forma de fazê-la" (a lei). Certamente a dificuldade já começa pelo cadastramento dos votantes, em comunidades que parecem sempre em expansão. Sob esse critério, até a Usina Nuclear de Angra dos Reis, para ser instalada, teria necessitado da anuência escrutinada dos índios guaranis. E há a informação de que 60 obras do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) estão em terras indígenas (e quantas não estarão em terras quilombolas?).

Como no governo não há ninguém que se preocupe com essa Convenção 169, que é um verdadeiro atentado à unidade nacional, e proponha a sua nulidade, haja plebiscitos!

OESP, 14/11/2008, Notas e Informações, p. A3

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