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Vulcão social

CB, Opinião, p. 20
21 de Abr de 2004

Vulcão social

Uma situação assustadora instalou-se no país com crescente ameaça de degenerar em violência incontrolável. Parece que há um vulcão turbulento apto a vomitar sua carga mortífera sobre o solo social. A ofensiva do crime organizado nas metrópoles, sobretudo no Rio de Janeiro e São Paulo, há muito assumiu a dimensão de guerra civil declarada. Em ambos os estados, o sacrifício de vidas vai muito além das baixas anotadas em conflitos atuais entre países ou em insurreições nacionais.
Desde o início do atual governo, o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) busca esticar ap extremo a corda da radicalização. Em 2003, as invasões de propriedades aumentaram 172% em comparação ao ano anterior. Os dados procedem da insuspeita Comissão Pastoral da Terra (CPT). Este ano, área de uma indústria multinacional na Bahia para produção de celulose, onde há investimento de US$ 1,5 bilhão, foi invadida. O MST passou a dar preferência à invasão de terras produtivas.
Ao panorama inquietante vieram associar-se os sem-teto. Antes restrito à ocupação de alguns prédios em São Paulo, o movimento acaba de alastrar-se para várias cidades: Recife, Campinas, Goiânia, Curitiba, Teresina e Santos, entre outras. Em Rondônia, os índios cintas-largas massacraram 29 garimpeiros que invadiram suas reservas para explorar diamantes. As comunidades indígenas mostram-se a cada dia mais indignadas com a ausência de proteção das áreas demarcadas e falta de demarcação de outras.
A poucos quilômetros da chacina de garimpeiros, espetáculo inédito de selvageria chocou a população: presos mataram nove colegas em cadeia de Porto Velho. Três foram torturados, esquartejados e exibidos em ritual macabro. Em Brasília, há oito dias trabalhador desempregado ateou fogo no corpo em frente ao Palácio do Planalto. Morreu domingo.
Por que o país se encontra sob o impacto de tanta violência e desatinos? Não há resposta capaz de sintetizar o fenômeno. 0 governo despertou expectativas brilhantes e se conduz com imobilismos frustrantes. A omissão do poder público continua a ceder ao narcotráfico espaços para imposição do terror a grupos inteiros da população.
A política indigenista é leniente na defesa dos interesses dos silvícolas, até para impedir a perda de grandes riquezas, como as jazidas de diamantes na reserva Roosevelt avaliadas em US$ 2 bilhões. Promessas de casa própria para os necessitados não conseguem saltar das intenções. A reforma agrária segue com metas que não se confirmam. E a criação de empregos até hoje é ilusão. Aí estão desafios que cobram ao governo reagir com novas e mais alentadas doses de energia mediante ações efetivas capazes de desarmar os gatilhos da grave inquietação social.

CB, 21/04/2004, Opinião, p. 20

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