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Troque canela por embiriba e pimenta por puxuri

OESP, Paladar, p. D4
28 de Mai de 2015

Troque canela por embiriba e pimenta por puxuri

Marília Miragaia

O molho bolonhesa ganha perfume com raspas de puxuri. A amburana dá sabor à manteiga. O arroz-doce ganha expressão com um toque de embiriba.
Sementes nativas do Brasil vêm sendo usadas aqui e ali no lugar de especiarias tradicionais por chefs como Ana Luiza Trajano, do Brasil a Gosto, em São Paulo, e Felipe Schaedler, do Banzeiro, em Manaus.
Essas sementes perfumadas são velhas conhecidas da medicina popular, dos banhos de cheiro e de perfumes caseiros. Mas a regra, como diz Claudia Roden no livro The Middle Eastern Food, é: "Qualquer coisa que possa adicionar sabor ou aroma é usada na cozinha". Assim, cumaru, pimenta-de-macaco, embiriba, puxuri e amburana também foram parar nas panelas.
"Esses condimentos criam novas referências dentro da cabeça", diz o chef Thiago Castanho, do Remanso do Bosque e do Remanso do Peixe, em Belém, no Pará.
Cada semente tem seu uso particular (veja ao lado). Nenhuma delas é difícil de usar. E todas abrem possibilidades de modificar sabores já consagrados.
Manual. Para guiar essa expedição pelas sementes brasileiras na cozinha, fizemos um pequeno manual com instruções de uso. Para isso ouvimos chefs que já testaram esses perfumes em suas cozinhas, como Fábio Vieira, do Micaela, que usa embiriba na calderada de surubim. "O pulo do gato é a quantidade, porque são muito potentes e podem ofuscar o sabor do resto", diz Ana Luiza Trajano.

Era remédio, virou tempero
Remédio para asma, pomada cicatrizante, repelente, perfume. Essas propriedades fizeram a fama de plantas como cumaru, amburana e puxuri Brasil afora. Tanto é que o chef Thiago Castanho, do Remanso do Peixe e do Remanso do Bosque, em Belém, no Pará, foi estudar o assunto na seção de ervas do Ver-o-Peso, onde elas aparecem em perfumes, garrafadas (infusão em líquido) e banhos de cheiros. Lá, garimpou sementes e ouviu erveiros antes de fazer receitas como sorvete ou bitter de embiriba.
"A cozinha não é o uso tradicional desses ingredientes. Quando mostrei o resultado para os vendedores, eles disseram: 'tu é doido? isso não é para comer!'", conta Castanho. O chef alerta que as especiarias devem ser consumidas com moderação. "Dependendo da quantidade, podem ser tempero ou remédio."
O biólogo Valdely Kinupp, autor de Plantas Alimentícias Não Convencionais no Brasil, recomenda moderação na quantidade e frequência do uso. Diz que em casa, rala cumaru para por na salada de frutas só uma vez por semana.

TEMPERO NATIVO
Conheça a origem, as principais características e algumas dicas de como usar as sementes brasileiras aromáticas.

AMBURANA
Nativa do Cerrado, pode substituir a baunilha e vai bem em receitas doces.

Como usar
Faça uma infusão com leite ou água (quantas sementes por litro e por quanto tempo) e troque o leite ou a água da receita de sobremesa pela versão aromatizada. Adicione aos poucos e prove sempre, para evitar que a amburana se sobreponha a tudo. O chef Rodrigo Oliveira, do Mocotó e Esquina Mocotó, mistura amburana (3 sementes raladas) e açúcar (1 kg) para adoçar caipirinhas e faz manteiga de amburana (de 3 a 5 sementes raladas para 1 kg de manteiga). Amoleça a manteiga e misture ao pó da semente.

CUMARU
Nativo da região amazônica, também conhecido como fava tonka. Aromatiza chocolates, biscoitos e licores. Em casa, substitui a baunilha.

Como usar
Faça uma infusão com água ou leite. Kinupp, autor de Plantas Alimentícias Não Convencionais no Brasil, recomenda deixar duas sementes de molho em um litro de água por 24 horas. Felipe Schaedler, do Banzeiro, deixa três sementes de molho no leite por três dias e faz um pudim com o leite aromatizado no lugar do leite comum. Há quem rale o cumaru e ponha as raspas diretamente à receita. Mas isso é para gosta de sabores potentes.

EMBIRIBA
Lembra canela e tem um quê de picância. Perfuma caldas, pudins e creme inglês.

Como usar
O chef Fábio Vieira, do Micaela, usa embiriba no lugar da canela no arroz-doce. Ele faz uma trouxinha com uma gaze com meia dúzia de sementes dentro (suficiente para uma receita de quatro pessoas), fecha com um barbante, amassa com o cabo da faca e deixa na panela com o doce até o fim do preparo. Na hora de servir, tira o sachê. Também dá para triturar e misturar no bolo de especiarias, como faz a colunista do Paladar, Neide Rigo.

PIMENTA-DE-MACACO
Lembra pimenta-do-reino, mas menos picante e com perfume de canela e cravo.

Como usar
Coloque num moedor de pimenta e use para temperar carnes, risotos, molhos (como o de tomate) e cozidos. Gabriel Matteuzzi, do Tête-à-Tête, alerta: ela perde intensidade depois de longas cocções. Para um resultado mais vivo, finalize com pimenta moída na hora de servir.

PUXURI
"A natureza juntou cravo, canela e anis-estrelado em um ingrediente", brinca Felipe Schaedler, do Banzeiro, sobre o puxuri, nativo da região amazônica. Substitui a noz-moscada.

Como usar
Ralado, tempera carnes intensas e ricas em godura, como de porco. A chef Ana Luiza Trajano, do Brasil a Gostom põe puxuri no molho bolonhesa. Fábio Vieira, chef do Micaela, usa puxuri para perfumar o suspiro.

OESP, 28/05/2015, Paladar, p. D4

http://blogs.estadao.com.br/paladar/troque-a-pimenta-do-reino-pelo-puxu…

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