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Taxa de natalidade é recorde no Xingu

Estado de Minas - Belo Horizonte - MG
10 de Mar de 2001

Melhoria do atendimento médico e fim das disputas territoriais aumentam a taxa de natalidade das tribos do Parque Nacional do Xingu, que, entretanto, assistem à crescente destruição de seus valores culturais, especialmente entre as gerações mais jovens
Marcelo Freitas
Em meados da década de 40, quando a expedição Roncador-Xingu chegou ao Mato Grosso, eles eram 12. Hoje, são aproximadamente 280. A história dos índios iualapti é igual à de muitas outras tribos da região. É a mesma dos xavante e dos kamaiura. Os xavante, que vivem em aldeias nas proximidades do parque, triplicaram sua população nos últimos 50 anos. Passaram de 3.000 mil para 9.000. Os camaiurá também experimentam uma explosão populacional. Eram 20. Hoje, são cerca de 200. Em todo o Parque Nacional do Xingu vivem atualmente 3.900 índios agrupados em 50 aldeias e postos de vigilância.
Segundo dados da Universidade Federal de São Paulo (UFSP), responsável pelo atendimento médico no parque, o índice de natalidade entre os xinguanos 2,91% é o dobro da média nacional. Já o coeficiente de mortalidade geral 6,17 por mil é três vezes menor que a média nacional, informa Selma Ferreira, diretora técnica do Distrito Sanitário do Xingu e coordenadora de uma equipe formada por quatro médicos, cinco enfermeiros, três dentistas e 12 auxiliares de saúde, responsável pelo atendimento médico na área.
Para Tacumã, cacique kamaiura, e Aritana, chefe maior dos iualapti e principal líder dos povos do Alto Xingu, a explosão demográfica, longe de ser um problema, é, para eles, a solução. Eu pretendo aumentar a aldeia porque, aí, a gente fica forte , afirma Tacumã. Nós temos que nos preparar para o futuro , acrescenta Aritana.
No caso dos iualapti, mais do que uma questão numérica, a explosão demográfica significou o renascimento de uma nação que, quando do contato com a Roncador-Xingu, estava prestes a ser riscada do mapa.
Na época, os últimos remanescentes dos iualapti estavam dispersos por diversas tribos. Por influência dos irmãos Villas Bôas, foram agrupados em uma única aldeia e começaram a recuperar sua história.
Quando dizem que sua gente tem que se fortalecer, Tacumã e Aritana parecem estar se preparando para uma guerra entre tribos, comum na época da Roncador-Xingu. Mas, não. Hoje é tudo irmão. Não tem mais inimigo , afirma Tacumã. No passado, disputas territoriais levaram vários índios à morte, da mesma forma que as doenças do branco, como a gripe e a tuberculose.
Para Orlando Villas Bôas, a explosão populacional dos dias de hoje é um processo impossível de ser controlado. Nós, brancos, não temos argumentos para dizer aos índios que eles devem limitar os filhos , afirma o sertanista, que, aos 87 anos, reafirma sua paixão pela causa indígena. Quanto mais índios tivermos, melhor.

Brancos são ameaça aos costumes

Quando chegou ao coração do Centro-Oeste brasileiro, a expedição Roncador-Xingu deparou com índios que praticamente desconheciam o mundo dos brancos. Andavam nus, alimentavam-se da caça, da pesca e do cultivo de alguns cereais, e mantinham intactos suas danças e rituais místicos.
Hoje, 58 anos depois, o Xingu não é o mesmo. Algumas tribos resistem aos costumes dos brancos, como os iualapti, do cacique Aritana. Outras, como os camaiurá, foram mais afetadas pelo contato com o mundo civilizado . Na aldeia iualapti, os índios mais idosos e as crianças andam nus. Nas malocas, a presença do homem branco está limitada a utensílios de cozinha e bicicletas.
A comida continua sendo o biju (uma espécie de pão feito com farinha de mandioca) e o peixe. As crianças e os idosos continuam andando nus. Apenas os jovens andam vestidos. Mas na praça central da aldeia, duas traves indicam que o futebol já tem seus adpetos entre os índios.
Na aldeia camaiurá a situação é diferente. Lá, a perda da identidade é mais visível. Os aparelhos eletrônicos estão presentes em maior número. Um dos índios possui até uma motocicleta, mas não tem dinheiro para colocar gasolina.
A perda da identidade preocupa Aritana, cacique iualapti. A rapaziada que conheceu um pouquinho o estudo acha que sabe tudo. Com isso, domina o papai, o vovô e até seu chefe. Quando tem cerimonial, não quer mais participar. No Quarup, quando se reúnem todas as aldeias, ele não vêm , lamenta Aritana. Tacumã, cacique camaiurá também pensa o mesmo. Aqui, jovem não dança mais, não pinta mais o corpo.
Pessimista, Luiz Carlos Cavalcanti de Albuquerque, sertanista que nos últimos 25 anos dedicou-se aos xavante, também teme pelo futuro da cultura indígena. Para ele, a atual geração de caciques ainda se preocupa com a manutenção da cultura de suas tribos, mas os jovens de hoje não pensam assim. O índio puro tende a acabar , afirma Luiz Albuquerque.
Para Orlando Villas Bôas, o futuro da cultura indígena irá depender da velocidade com que os costumes brancos forem sendo introduzidos nas aldeias. Enquanto estávamos no Xingu, isso não acontecia. Infelizmente, aqueles que nos substituíram não pensaram da mesma forma , afirma.

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