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Superporto e terminal em Curuçá vai afetar Resex

Diário do Pará - www.diariodopara.com.br
01 de Mar de 2009

Raimundo Costa Santos, o seu Dico, aponta para a longa extensão de água que se abre à sua frente e sentencia: "O peixe se cria aqui. Eles dizem que não vai atrapalhar a pesca, mas eu não acredito muito nisso não. Essa é uma briga de Davi contra Golias, mas eu acho que nessa quem vai ganhar é o Golias".

Seu Dico está na ponta da praia da Romana, em plena Reserva Extrativista Marinha Mãe Grande de Curuçá, no município de mesmo nome, no nordeste do Pará. Dico é um dos personagens quase anônimos que ainda não foi ouvido a respeito de dois projetos que irão afetar diretamente a vida dele e de outras centenas de pescadores que tiram dali o sustento próprio.

A construção de um porto flutuante e a de um superporto no município. A construção das duas obras vem sendo cercada de polêmicas. O Ministério Público Federal vem acompanhando, por meio de procedimento administrativo, ou seja, uma investigação interna, o processo de licenciamento ambiental aberto pela MMX Mineração para construção do porto flutuante em Curuçá.

O acompanhamento foi aberto por solicitação dos próprios moradores e usuários da ResexMãe Grande, que poderá ser diretamente impactada pelo empreendimento. O procurador da República Felício Pontes Jr., responsável pelo caso, solicitou ao Ibama que remetesse com urgência a íntegra dos Estudos de Impacto Ambiental (EIA) apresentados pela empresa para análise pela Procuradoria Geral da República, que pode recomendar a aceitação ou não do mesmo.

Porto e terminal afetarão Resex

O geólogo do Programa de Estudos Costeiros do Museu Emílio Goeldi, Amílcar Mendes, afirma que é impossível não haver impactos com a instalação de projetos na Resex Mãe Grande, mas também acha que eles podem até ser positivos se houver uma participação efetiva da comunidade. "Há duas situações. A do terminal de transbordo é menos problemática, muito menos impactante.

Já o porto Espadarte, que é o outro projeto que se pensa para o local, vai trazer mais problemas, já que pressupõe a construção de pelo menos três pontes que irão atravessar a reserva. Também se pensa em uma ferrovia e tem ainda a área que se chama retroporto, onde serão feitas as operações de terra. Tudo isso afeta a Resex e como ela já foi decretada, fica mais complicado", diz ele.

Segundo Amílcar, há possibilidades técnicas de se fazer os dois projetos. "Mas uma coisa é o lado técnico. O outro é o social. Talvez a compensação fosse um plano de manejo apresentado pelas empresas que querem construir as obras. O fato é que se houver investimentos de grandes corporações, dificilmente o governo irá barrar as obras. Isso implica dizer que Curuçá e arredores irão sofrer uma mudança profunda.

De um lado, virão investimentos. Do outro, mazelas já conhecidas, como prostituição, bolsões de miséria, e inchaço populacional. O município terá que ser muito hábil para negociar essas questões". Para a antropóloga do Laboratório de Antropologia dos Meios Aquáticos do Museu Goeldi, Lourdes Furtado, a população está carente de informações. "Ela não sabe como e se vai se beneficiar com esses projetos", diz ela, que desde 2003 tem ligação direta com a Resex Mãe Grande, fazendo pesquisas sobre os impactos da criação da reserva para o município.

A antropóloga coordena uma equipe que conclui um diagnóstico etno-ecológico na área. "Essas empresas pensam que as pessoas de uma comunidade são ignorantes e não têm nada a dizer ou opinar sobre esses projetos. As coisas não podem ser pensadas dessa forma. Se deixarem a população de fora, vai ser um desastre".

Segundo a antropóloga, não dá para ignorar a importância econômica que um porto de grande calado pode vir a trazer para a economia do Estado, mas isso deve ser feito com critérios. "Temos que evoluir, mas com ética, com o meio ambiente e com a população, que é o bem mais precioso e que é vilipendiado. O EIARima tem que ser feito com as instituições científicas e com as organizações sociais locais. Tem que ter o saber tradicional também", defende a antropóloga.

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