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Superar a ficção

O Globo, Opinião, p. 20
05 de Abr de 2015

Superar a ficção

Devido ao longo período de maturação das obras, o setor elétrico tem de ser planejado com muito tempo de antecedência. Mas quando há uma conjuntura de crise, como a atual, a presteza no planejamento se torna ainda mais necessária. E, nos estudos e discussões sobre como precisará ser a matriz energética daqui a dez anos ou mais, volta com força a questão das usinas nucleares.

As alterações climáticas das quais resultam longa seca no Nordeste e, principalmente, uma estiagem severa no Sudeste, com o agravamento do risco de racionamentos, aumentam a responsabilidade de governos, técnicos e sociedade no processo de decisão sobre o que fazer daqui para frente. Um mito está caindo: o Brasil "país das águas". Não é bem assim, vê-se. Como a estiagem atingiu a região mais populosa do país, o esvaziamento de reservatórios de usinas e de sistemas de abastecimento de cidades tem de ser entendido como alerta para a gravidade do assunto.

No que se refere ao setor elétrico, aumentou sua dependência do parque de termelétricas, criado a partir de 2001 e 2002, para evitar apagões causados, à época, pela falta de chuvas, além de atrasos em investimentos. Mas o que era para ser um sistema de reserva, tem sido acionado 24 horas por dia. Decorrem conhecidos impactos tarifários - a gás ou óleo, as usinas têm custo operacional maior que as hidrelétricas. Bem como custos ambientais.

O Brasil tem cerca de 40% da sua energia produzidos de fonte renovável. Índice elevado, mas difícil de manter, porque a construção de hidrelétricas esbarra em regulações preservacionistas na Região Norte, e, no resto do país, esgotam-se as alternativas de locais para novas usinas.

Como não é inteligente optar pelo aumento da dependência de termelétricas à base de combustíveis fósseis - por questões ambientais, preço e garantia de abastecimento -, restam as fontes alternativas (eólica, solar) e a nuclear. É indiscutível que o uso de energia de origem solar e eólica precisa aumentar. Mas o risco está em projetar a oferta de energia das próximas décadas apenas com base no sol e ventos. Esse tipo de geração tende a ser subsidiário no mundo.

Dentro desse cenário, ao se projetar décadas à frente, é impossível deixar de considerar a necessidade de instalação de novas usinas nucleares. Em que pese o acidente de Fukushima, no Japão, do qual foram retirados muitos ensinamentos para tornar os reatores ainda mais seguros.

As duas usinas nucleares (Angra I e II) respondem por apenas 1,3% da energia gerada no país. Estudo da FGV indicou que seriam necessárias mais 18 unidades, de 1 mil MW cada, até 2040. Constam do planejamento do setor quatro para o Nordeste, mas o lobby antinuclear mantém os projetos na gaveta. Cada usina leva dez anos desde a aprovação até produzir o primeiro quilowatt. O país, portanto, começa a se atrasar em decisões que ampliem a oferta de energia da melhor forma possível, com a melhor relação custo-benefício, que é por meio de termonucleares. O resto é ficção.

O Globo, 05/04/2015, Opinião, p. 20

http://oglobo.globo.com/opiniao/superar-ficcao-15767508

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