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Sertanista teme retaliação de madeireiros peruanos

Terra Magazine - terramagazine.terra.com.br
Autor: Altino Machado
26 de Jun de 2008

O sertanista José Carlos dos Reis Meirelles Júnior, coordenador da Frente de Proteção Etnoambiental Rio Envira (Funai), divulgou nesta quinta-feira, 26, uma nota de esclarecimento sobre a polêmica decorrente das fotos dos índios isolados. As imagens foram tiradas durante um sobrevôo na região da fronteira Brasil-Peru no final de abril e publicadas com exclusividade por Terra Magazine no dia 23 de maio.

A polêmica teve origem com a publicação da nota intitulada "Confirmado: No son peruanos los nativos fotografiados en territorio brasileño", emitida pela Oficina de Comunicaciones do Instituto Nacional de Recursos Naturales, do Peru. A nota repercutiu na imprensa peruana, em diferentes sites da internet e resultou em informações desencontradas, no Brasil e no exterior, sobre as fotografias dos índios isolados da região do rio Envira, no Estado do Acre.

Segundo Meirelles, em 2004, durante um sobrevôo, além das malocas já conhecidas, foi identificado um novo conjunto de malocas na região do igarapé Xinane, afluente da margem direita do rio Envira. Com base nas informações daquele sobrevôo, o sertanista assinala ser possível afirmar que, naquele ano, não existia, no lado brasileiro, qualquer presença de povos isolados oriundos do Peru nas proximidades do paralelo de 10oS.

- As fotografias amplamente divulgadas na mídia nacional e internacional, onde aparecem índios isolados, são do grupo das cabeceiras do rio Humaitá e igarapés da margem esquerda do rio Envira, que a Frente monitora há vinte anos, e são tradicionalmente habitantes do território brasileiro. Outras dezenas de fotos das malocas dos índios isolados do igarapé Xinane, estes sim oriundos do Peru, foram encaminhadas à Fundação Nacional do Índio e não foram objeto de divulgação na mídia. - afirma o sertanista.

A nota de esclarecimento assinala que as malocas não existiam antes de 2004 e que as evidências de atividade madeireira nas cabeceiras do rio Envira, no lado peruano, os vestígios constantes no igarapé Xinane e a ocupação recente (malocas e roçados novos constatados fotograficamente) permitem afirmar que outros índios isolados da região - mas não os fotografados - são oriundos do território peruano.

- Os jornais peruanos que estão plantando informações mentirosas na mídia internacional devem pertencer aos importadores ou exportadores de madeira que saqueiam aquela região. Se os madeireiros mandarem me matar, peço a vocês que façam uma zoada grande - pediu nesta manhã José Carlos dos Reis Meirelles à reportagem de Terra Magazine.

Leia em primeira mão a íntegra da Nota de Esclarecimento:

Tendo em vista a Nota "Confirmado: No son peruanos los nativos fotografiados en territorio brasileño", emitida pela Oficina de Comunicaciones do Instituto Nacional de Recursos Naturales, a 13 de junho de 2008, e suas repercussões na imprensa escrita peruana e em diferentes sites da internet, e de informações desencontradas que resultaram da divulgação no Brasil e no exterior, de fotografias de índios isolados na região do rio Envira, no Estado do Acre, a Frente de Proteção Etnoambiental Rio Envira (Funai) vem a declarar:

A Funai mantém, desde o ano de 1987, a Frente de Proteção Etnoambiental Rio Envira (FPERE) cuja finalidade é proteger os povos isolados e seus territórios nas cabeceiras dos rios Envira, Tarauacá e Jordão.

Desde 1987 o coordenador dessa Frente é o sertanista José Carlos dos Reis Meirelles Júnior. Durante esse período foram oficialmente reconhecidas e demarcadas as Terras Indígenas Kampa e Isolados do rio Envira e Alto Tarauacá. Em 2008, será demarcada a Terra Indígena Riozinho do Alto Envira, consolidando, pelo lado brasileiro, um corredor contínuo de 636.384 hectares de florestas, que se estende ao longo do paralelo de 10oS, na fronteira com o Peru.

O monitoramento dessas três terras indígenas é efetuado por dois postos de vigilância localizados nos rios Envira e Tarauacá, de forma a evitar invasões por caçadores e pescadores nos territórios dos índios isolados. Além disso, expedições terrestres e sobrevôos são feitos periodicamente como parte do monitoramento.

No ano de 2004, durante um sobrevôo, além das malocas já conhecidas, foi identificado um novo conjunto de malocas na região do igarapé Riozinho, afluente da margem direita do rio Envira. Com base nas informações deste sobrevôo, é possível afirmar que, naquele ano, não existia, no lado brasileiro, qualquer presença de povos isolados nas proximidades do paralelo de 10oS.

No início de 2006, a Frente constatou a descida pelo rio Envira de pranchões de mogno serrados com motosserra, marcados com as iniciais dos pretensos proprietários, bem como tambores de combustível e de óleo comestível, com marca peruana, o que então evidenciou a atividade madeireira nas cabeceiras do rio Envira, em território peruano. Este material chegou ao lado brasileiro pela cheia do rio Envira. A Funai possui esta documentação fotográfica. Em 2007 o mesmo fato ocorreu, embora a maioria dos pranchões fosse de cedro.

Em 2006, à época da descida dos pranchões, a Frente constatou, por meio de vestígios (rastros, caminhos, tapiris e visitas de índios aos roçados da Frente) e de contato visual, a presença, no igarapé Xinane, de um grupo de índios isolados com características distintas daqueles índios que até então habitavam a região de forma permanente.

Em outubro de 2007, durante expedição terrestre no paralelo de 10oS, como rotina de vigilância, foram encontrados, nas cabeceiras dos formadores do igarapé Xinane, vestígios da presença de índios isolados, alem de terem sido ouvidos gritos dos mesmos. As coordenadas geográficas desse ponto foram registradas com GPS. Em início de 2008, por meio do Google Earth, constatamos uma abertura na floresta próxima ao ponto registrado durante aquela expedição terrestre.

No final do mês de abril de 2008 foi realizado um novo sobrevôo na região, durante o qual monitoramos os dois conjuntos de malocas anteriormente conhecidas: o primeiro, nas cabeceiras do Rio Humaitá e igarapés da margem esquerda do rio Envira; e, o segundo, nas cabeceiras do igarapé Riozinho, afluente da margem direita do rio Envira.

Durante esse mesmo sobrevôo, guiados pelo ponto de GPS marcado na expedição terrestre e pelas coordenadas da abertura obtidas por meio do Google Earth, foi confirmada a existência de duas novas malocas de índios nas cabeceiras do igarapé Xinane, próximo ao paralelo de 10oS, em território brasileiro.

Essas malocas não existiam antes de 2004, quando do sobrevôo então realizado. As evidências de atividade madeireira nas cabeceiras do rio Envira, no lado peruano, dos vestígios constantes no igarapé Xinane e a ocupação recente (malocas e roçados novos constatados fotograficamente) permitem afirmar que estes índios são oriundos do território peruano.

As fotografias amplamente divulgadas na mídia nacional e internacional, onde aparecem índios isolados, são do grupo das cabeceiras do rio Humaitá e igarapés da margem esquerda do rio Envira, que a Frente monitora há vinte anos, e são tradicionalmente habitantes do território brasileiro.

Outras dezenas de fotos das malocas dos índios isolados do igarapé Xinane, estes sim oriundos do Peru, foram encaminhadas à Fundação Nacional do Índio e não foram objeto de divulgação na mídia.

A Frente Envira protege quatro povos indígenas isolados, dos quais três têm hoje assentamento permanente em território brasileiro. Os Mashco-Piro também perambulam nas cabeceiras do Envira. Em 2004, cerca de trezentos desses índios se fizeram presentes na sede da Frente no rio Envira. Nos meses mais secos dos anos seguintes, novas evidências de sua perambulação foram constatadas. De nenhuma forma, portanto, os Mashco-Piro devem ser confundidos com os índios isolados há pouco chegados do Peru, estabelecidos nas cabeceiras do igarapé Xinane, em território brasileiro.

As informações já disponíveis demonstram que a presença de povos indígenas isolados na região de fronteira, em território peruano, não se restringe unicamente aos Mashco-Piro. A existência da reserva territorial Murunahua, destinada à proteção de povos em isolamento voluntário Murunahua, Chitonahua e outros, falantes do tronco lingüístico Pano, localizada no limite oeste do Parque Nacional Alto Purus e da Reserva Territorial Mascho-Piro, é uma evidência disso.

Por fim, a Fundação Nacional do Índio, torna pública a sua disposição de estreitar relações com os órgãos afins do Governo Peruano, com objetivo de implementar políticas articuladas para a proteção dos povos isolados e de seus territórios em ambos os lados da fronteira internacional do Brasil com o Peru.

Rio Branco, 26 de Junho de 2008

José Carlos dos Reis Meirelles Júnior
Coordenador da Frente de Proteção Etnoambiental Rio Envira (Funai)

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