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Saneamento: um deficit de R$ 178 bilhoes em obras

JB, Pais, p.A4
25 de Abr de 2005

Saneamento: um déficit de R$ 178 bilhões em obras
Casa Civil finaliza projeto para o setor, uma das bandeiras de campanha de Lula
Abelardo de Oliveira Karla Correia
Secretário nacional de Saneamento
Depois de um longo debate que envolveu todo o setor de saneamento ambiental desde setembro do ano passado, o Executivo acredita que costurou o acordo necessário para enviar ao Congresso o projeto que será a base da universalização dos serviços do setor no país - uma das bandeiras levantadas por Luiz Inácio Lula da Silva em sua campanha presidencial, em 2002. O aparato legal que regulará o setor terá a missão de garantir abastecimento de água e coleta de esgoto a um universo que, de acordo com dados do IBGE, soma 45 milhões de pessoas que hoje não têm acesso a esses serviços, no Brasil. O texto, que se encontra na Casa Civil desde março, deve chegar ao Parlamento na segunda metade de maio.
O custo estimado para a universalização do saneamento em um prazo de 20 anos - considerado factível pelo governo - é de R$ 178 bilhões. O montante significa uma necessidade de investimentos da ordem de R$ 8,9 bilhões por ano, entre verbas orçamentárias e recursos da iniciativa privada, que hoje detém apenas 5% do mercado brasileiro de serviços de saneamento básico. Para se ter uma idéia do tanto que a realidade está distante desse patamar, União, estados e municípios investiram junto, no setor, apenas R$ 9 bilhões entre 2003 e 2004. O aporte ideal seria de R$ 17,8 bilhões, nesse período.
Uma das principais mudanças que a nova legislação pretende trazer ao setor é a atenção ao usuário, explica o secretário nacional de Saneamento, Abelardo de Oliveira. Segundo ele, as concessionárias de serviços de saneamento passam a ter, com o novo marco, obrigações mais claras de atendimento ao cliente e de investimento na expansão da rede.
- É a primeira vez que a lógica das concessões se lembra dos direitos do consumidor. O novo marco estipula direitos e deveres no relacionamento entre poder concedente e concessionárias, e normatiza as garantias que estas devem dar ao usuário - explica Abelardo.
De acordo com ele, o cumprimento das metas negociadas com as concessionárias reduzirá os juros pagos em financiamentos do governo. Se não alcançar as metas no prazo estipulado, a companhia pode inclusive perder a concessão.
O marco regulatório do setor foi anunciado em setembro do ano passado pelo ministro das Cidades, Olívio Dutra. Até dezembro, um grupo de trabalho interministerial incorporou propostas dos diversos envolvidos no mercado de saneamento ambiental, antecipando um debate que costuma acontecer dentro do Congresso. A idéia era evitar que a pressão dos diversos interesses envolvidos ganhasse força no Parlamento e atrasasse a tramitação de uma matéria cara ao Palácio do Planalto.
A normatização dos consórcios foi um dos pontos nevrálgicos das negociações entre o ministério das Cidades, as secretarias estaduais de saneamento e as companhias estaduais que prestam serviço aos municípios. O projeto de lei estimula a formação desses consórcios e vincula o acesso das companhias de saneamento a verbas da União à adesão ao Sistema Nacional de Saneamento Ambiental (Sisnasa).
O órgão gerenciará a política de saneamento ambiental do governo, que prevê metas de universalização dos serviços, qualidade de atendimento e investimentos na expansão da rede. Quem não aderir, não se submete às metas, mas também não terá acesso aos recursos do BNDES, Fundos Constitucionais, FGTS e outras fontes de verba do governo federal.
Diante da dificuldade de um consenso entre as partes, o governo optou por aguardar que o Congresso aprovasse a Lei de Consórcios, o que aconteceu no mês passado. A nova legislação, que traça o funcionamento dos consórcios entre os entes federados, já era alvo de acordo entre os partidos no Congresso, o que facilitou sua tramitação. E tirou do ministério o peso de formular mais um acerto entre as partes interessadas no texto do marco regulatório. Agora, o texto está na Casa Civil sofrendo os ajustes necessários para se adequar às novas regras de consórcios.
Além disso, ficou sob responsabilidade dos estados gerir o funcionamento dos consórcios firmados dentro de regiões metropolitanas e microrregiões intraestaduais. Como nenhum estado tem essas regiões delimitadas, e com estatuto próprio, o governo federal força, dessa maneira, os estados a definir suas regiões metropolitanas ou aceitar que a titularidade do serviço continue no âmbito municipal.
Esse ponto foi alvo de outra polêmica demorada nas negociações. De acordo com a Constituição, o poder sobre as concessões de saneamento cabe aos municípios, mas há 20 anos que as companhias estaduais - principais opositoras ao projeto do governo - dominam o mercado. De acordo com Abelardo, a última versão do projeto, que se encontra na Casa Civil, acabou por excluir qualquer menção à titularidade.
- Entendemos que a decisão cabe ao Supremo (Tribunal Federal) e optamos por excluir essa decisão do texto do projeto, uma vez que a titularidade já está claramente expressa na Constituição - explicou o secretário. Outra estratégia adotada pelo governo foi aguardar a aprovação da Lei de Consórcios, que fundamenta o principal aspecto do novo plano de saneamento. Por esse mecanismo, os três entes da Federação poderão firmar consórcios entre si, facilitando a gestão dos serviços.
O projeto ainda aumenta a segurança do setor para investidores, uma vez que garante as regras dos contratos, como a política tarifária adotada pelas prestadoras e dá transparência ao mecanismo dos subsídios cruzados, pelo qual municípios que dão lucro às companhias viabilizam aqueles que dão prejuízo, por meio de seus excedentes tarifários. O marco prevê a criação de agências reguladoras regionais para fiscalizar o cumprimento das metas nos serviços consorciados. A formação de uma agência nacional está descartada, pois o poder concedente no setor cabe aos municípios, e não à União, como seria necessário.

JB, 25/04/2005, p. A4

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