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Questão ambiental e indígena requer solução consensual

Valor Econômico, Especial, p. G2
29 de Mai de 2015

Questão ambiental e indígena requer solução consensual

Roberto Rockmann

Desde 2007, construtoras e fabricantes de bens de capital sob encomenda trabalham a plena carga atendendo os pedidos das três grandes hidrelétricas em construção na região Norte e que marcam a retomada desses projetos depois da construção da usina de Tucuruí (PA), na década de 1970, e que passou por uma ampliação, iniciada no fim da década de 1990 e concluída em 2004. No segundo semestre, o ritmo deve cair com a entrada em operação da maioria das máquinas das hidrelétricas do rio Madeira e da reta final da construção de Belo Monte. Nesse contexto, ganha relevância a licitação do projeto de São Luiz dos Tapajós, com potencia de cerca de oito mil MW e previsão de investimentos acima de RS 30 bilhões. Se a usina demorar muito a ser licitada, as fabricantes terão de lidar com a ociosidade de suas fábricas.
Não há data ainda definida para o certame de São Luiz dos Tapajós, o maior projeto hidrelétrico a ser erguido na região amazônica. A licitação chegou a ser anunciada no fim do ano passado, mas foi cancelada pelo governo federal porque o estudo ambiental concluído em setembro identificou 14 impactos negativos para povos indígenas, dos quais seis foram considerados irreversíveis.
A Fundação Nacional do Índio (Funai) alega que o projeto da usina é inconstitucional, pois alagará terras indígenas, o que é vetado pelo artigo 231 da Constituição Federal. A conclusão sobre a viabilidade do empreendimento está nas mãos do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama).
O governo olha com atenção o empreendimento. "Estamos trabalhando para que ele possa ser licitado o quanto antes e trabalhando com a questão indígena, que está complicada", diz o presidente da Empresa de Pesquisas Energéticas (EPE), Mauricio Tohnasquim. Construir hidrelétricas será uma tarefa mais árdua, já que 65% do potencial hidrelétrico está na região Norte. "A questão ambiental e indígena será bastante complicada e exigirá negociação complexa e soluções consensuais", ressalta Alexei Vivan, presidente da Associação Brasileira das Concessionárias de Energia (ABCE). Há três anos, o presidente da EPE apresentou um projeto a vários ministérios sugerindo que os índios pudessem receber royalties de empreendimentos que os afetassem diretamente. Em vez de irem para o orçamento da Funai, os recursos seriam gerenciados por um comitê tripartite, formado por comunidade, investidores e Funai. Outra experiência é a do Canadá, em que algumas tribos passam a ter participação em usinas. "A participação é bem pequena, mas eles compartilham os resultados do empreendimento", afirma Tohnasquim.
O presidente da Alstom Brasil, Marcos Costa, observa com atenção o empreendimento. "O projeto de São Luiz do Tapajós é fundamental para a indústria nacional e esperamos que venha a ser leiloado ainda este ano", diz. Para ele, ao longo dos próximos anos, as fontes renováveis devem continuar representando a maior fatia da matriz com participações equilibradas entre a geração eólica e hidráulica, duas fontes com alto potencial a ser explorado e que contam com capacidade produtiva instalada no pais para atender com excelência às demandas futuras.
"As usinas solares devem gradativamente ganhar espaço, com um percentual muito inferior às fontes hidráulica e eólica. As usinas térmicas também ganharão mais espaço, seja em geração a carvão, quanto a gás", destaca. Mas a presença hídrica será diluída, o que levará a uma matriz com fontes intermitentes e um custo marginal mais elevado de expansão.
As três hidrelétricas construídas na região e as futuras devem contar com uma particularidade: o conceito de fio d'água, ou seja, sem a construção de grandes reservatórios que armazenam água. "Levando em conta que os projetos futuros estão nas regiões Norte e Centro-Oeste, as bacias desta região têm um regime hidrológico que equilibra os períodos de cheia e de seca com as regiões Sul e Sudeste. O maior desafio dos novos projetos é lidar com essa realidade dos reservatórios. A construção de novas hidrelétricas sem grandes reservatórios gera uma necessidade de crescimento da geração térmica", observa Costa, da Alstom Brasil.
Sem grandes reservatórios para armazenar água das chuvas, o país será altamente dependente das chuvas. A capacidade de armazenamento das hidrelétricas caiu de 6,3 meses para 4,7 em dez anos. Entre 2013 e 2018, quando as usinas do rio Madeira e Belo Monte entram em operação, está prevista a entrada de 20 mil MW de capacidade hídrica no sistema, sendo que só 200 MW têm reservatórios.

Valor Econômico, 29/05/2015, Especial, p. G2

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