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Quem são os parlamentares que formam a bancada do garimpo

Jacobin Brasil - https://jacobin.com.br/
09 de Fev de 2023

Quem são os parlamentares que formam a bancada do garimpo
Defensores do garimpo ilegal responsável pela crise humanitária que abate o povo Yanomami, 16 deputados e senadores atuam também em prol do agronegócio e da destruição ambiental por interesses próprios e alinhamento ideológico. Entre eles, se destacam dois bolsonaristas: Ricardo Salles e Hamilton Mourão.

Luis Indriunas
Mariana Franco Ramos

09/02/2023

No Congresso Nacional, a ligação entre as bancadas da bala, do boi e da Bíblia é conhecida. As três bancadas têm uma estrutura formalizada a partir das frentes parlamentares da Segurança Pública, da Agropecuária e Evangélica. "Não chega ser uma aliança, mas uma certa identidade da bancada", afirma a professora do Programa de Pós-graduação de Ciências Sociais em Desenvolvimento, Agricultura e Sociedade (CPDA) da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ), Regina Angela Landim Bruno. "É o controle da terra, é o controle dos bens, da salvação, e o controle das armas. Isso estabelece certas afinidades eletivas e uma identidade que são constitutivas de um projeto de sociedade".

Essas afinidades foram ampliadas nos anos de governo Bolsonaro com uma união de discursos. "Enquanto a bancada ruralista nunca escondeu que queria mesmo enfrentar movimentos do campo a bala e que despreza direitos humanos, essas figuras ligadas ao garimpo, que tiveram mais projeção nos últimos quatro anos, beberam disso, se alimentaram dessa bagagem, dessa tônica, desse despeito, como se não devessem nada a ninguém", afirma a antropóloga Luísa Molina, do Instituto Socioambiental (ISA). "Meu argumento é que já entraram num jogo político da extrema direita. O discurso e a orientação política dos ruralistas pavimentaram o caminho para a plataforma política do garimpo".

Em parceria com a revista Carta Capital, De Olho nos Ruralistas elencou 16 deputados e senadores que formam a bancada do garimpo. Sem frente formalizada, eles são o núcleo duro entre os defensores da prática do que alguns chamam de "mineração artesanal", que se resume a invadir terras públicas e usar técnicas que destroem e poluem os leitos dos rios e as florestas e matam quem vive delas como no caso dos Yanomamis, cujas imagens de desnutrição extrema pela ação de garimpeiros em suas terras percorreram o mundo nas últimas semanas.

O núcleo duro da bancada do garimpo é composto, em ordem alfabética, pelos deputados federais Antônio Doido (MDB-PA), Eder Mauro (PL-PA), Euclydes Pettersen (PSC-MG), Hugo Leal (PSD-RJ), Joaquim Passarinho (PL-PA), José Medeiros (PL-MT), José Priante (MDB-PA), Nicoletti (União-RR), Ricardo Salles (PL-SP) e Silas Câmara (Republicanos-AM) e pelos senadores Davi Alcolumbre (União-AP), Jaime Bagattoli (PL-RO), Hamilton Mourão (Republicanos-RS), Wellington Fagundes (PL-MT), Wilder Morais (PL-GO) e Zequinha Marinho (PL-PA).

Defensores do garimpo têm interesses particulares no agronegócio

Alguns são fazendeiros, outros têm ligações com as pautas do agronegócio. O núcleo duro da bancada do garimpo tem uma relação direta com a pauta ruralista. Seis reeleitos já eram integrantes da Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA): os deputados José Medeiros, Joaquim Passarinho, Eder Mauro, Hugo Leal, Silas Câmara e o senador Zequinha Marinho. Desses, apenas Eder Mauro, que criou um projeto de lei que autoriza garimpo em reservas extrativistas, declarou bens rurais à Justiça: um sítio e uma fazenda cujo valor total soma R$ 480 mil. Delegado de polícia, Mauro, que já assumiu ter matado "muita gente", é também um representante de destaque da bancada da bala e defende a ampliação do porte de armas no campo.

Os outros integrantes não declararam imóveis rurais ou empresas do agronegócio, mas atuam em acordo com a FPA, apoiando e votando as demandas da frente, que representava na legislação anterior metade do Congresso. É o caso do senador Zequinha Marinho, que é vice-presidente da frente no Senado. Junto com Passarinho e Medeiros, Marinho foi um dos grandes articuladores pela aproximação do governo Bolsonaro com os garimpeiros. O senador classifica fiscais ambientais de "servidor bandido e malandro" e apoiou bloqueios de estradas no Pará ocorridos em 2022 contra a apreensão e destruição de máquinas do garimpo ilegal.

Para o agronegócio, Marinho, que não declara à Justiça nenhum imóvel rural, defende a chamada "regularização fundiária", que pretende legalizar terras griladas. Pastor da Assembleia de Deus, Marinho foi o relator do projeto que criou a Frente Parlamentar Evangélica.

Entre os políticos proprietários de terra, a bancada do garimpo conta com o deputado Antonio Doido, ex-prefeito de São Miguel do Guamá (PA), que já fez 19 pedidos de uso do solo na Agência Nacional de Mineração (ANM). Doido declarou à Justiça Eleitoral três imóveis rurais, num valor total de R$ 1,5 milhão.

O senador Wellington Fagundes, que defende a ampliação massiva da exploração mineral no seu estado, Mato Grosso, declarou ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE) ser proprietário de 746 hectares em Juscimeira (MT) e de 218 cabeças de gado num total de R$ 1.192.597,28, além de uma aeronave. Fagundes também atua na compra e venda de imóveis.

O sojeiro Jaime Bagattoli, de Rondônia, adotou o discurso pró-garimpo para conseguir se eleger em 2022, após uma tentativa frustrada em 2018. Ele é sócio com os irmãos do Grupo Bagattoli, que atua no Estado desde 1974. Hoje a empresa tem cerca de 6 mil hectares em Vilhena, Comodoro e Cabixi e três unidades de armazenagem com capacidade total de 50 mil toneladas nos mesmos municípios, além de dois postos de gasolina e 40 caminhões para transporte de combustível. Na sua declaração à Justiça Eleitoral, Bagattoli também aponta a participação societária na North Trading, que comercializa madeira, e da Kargioli Comercial Importadora e Exportadora, que comercializa insumos agrícolas.

Salles e Mourão pretendem continuar passando a boiada

Dois representantes do governo de Jair Bolsonaro devem concentrar as pautas que pretendem manter a política de destruição do candidato derrotado à Presidência da República: seu ex-ministro do Meio Ambiente e deputado federal reeleito, Ricardo Salles, e seu ex-vice-presidente, Hamilton Mourão, hoje senador.

"Passar a boiada" sobre ordenamento jurídico e regulamentações que previam a fiscalização e punição da destruição ambiental foi a intenção de Salles desde o início do governo Bolsonaro. A expressão tornou-se popular depois de uma reunião ministerial em 2020, quando se discutia as ações do governo, inclusive em relação à pandemia. "Então pra isso precisa ter um esforço nosso aqui enquanto estamos nesse momento de tranquilidade no aspecto de cobertura de imprensa, porque só fala de Covid, e ir passando a boiada e mudando todo o regramento e simplificando normas", afirmou Salles. "De Iphan, de Ministério da Agricultura, de ministério de Meio Ambiente, de ministério disso, de ministério daquilo".

Ele saiu do ministério após sua atuação para liberar madeira ilegal no Pará, é defensor do garimpo, inclusive em terras indígenas. Em 2020, durante um encontro com indígenas, o ainda ministro não só defendeu, mas os colocou num mesmo patamar que outros interessados. "[O indígena] tem direito de escolher, fazer várias atividades, dentre elas, o garimpo, seguindo a lei ambiental, com os cuidados ambientais, exatamente como qualquer outro cidadão brasileiro ou investidor estrangeiro terá direito de fazer no Brasil".

Apesar de não ter empresas do setor ou propriedades rurais, Salles atua em prol dos interesses do agronegócio, recebendo apoio financeiro. Na sua última campanha, o deputado recebeu mais de R$ 2,4 milhões oficialmente. De Marco Ermírio de Moraes, herdeiro do grupo Votorantim, que tem um braço voltado para produção e venda de fertilizantes, foram R$ 250 mil. Os usineiros Antonio Eduardo Tonielo e Gastão de Souza Mesquita deram R$ 100 mil cada um. Um dos líderes do mercado de cana do país, Marcelo Campos Ometto, doou o mesmo valor.

Com Salles e depois seu sucessor Joaquim Álvaro Pereira Leite, que havia sido conselheiro da Sociedade Rural Brasileira (SRB), os ministros do Meio Ambiente e seus órgãos, como o Ibama, se reuniram mais de 700 vezes com empresas do agronegócio e da mineração, segundo o dossiê Ambiente S/A, publicado no ano passado pelo De Olho nos Ruralistas.

Quando iniciaram as denúncias e pressão para a saída de Salles, 88 organizações, muitas financiadoras da bancada ruralista, assinaram uma carta publicada na mídia a favor do então ministro. Entre elas, a Confederação Nacional da Agricultura e Agropecuária (CNA), Aprosoja, a SRB e diversas associações de canavieiros.

Agora deputado federal, Salles foi indicado pelo seu partido, o PL de Bolsonaro, para a Presidência da Comissão de Meio Ambiente da Câmara. Sob protesto de ambientalistas. Ele mesmo disse que não vai.

No Senado, o general Hamilton Mourão deve repetir seu discurso de defesa do agronegócio e do garimpo. Próximo de José Altino Machado, conhecido como "rei do garimpo" e um dos responsáveis pela invasão de 200 mil garimpeiros na Terra Indígena Yanomami, Mourão se reuniu várias vezes com lobistas do setor, enquanto vice-presidente. Com Machado, foram pelo menos quatro. Como vice-presidente, Mourão reiteradamente amenizou as denúncias e pedidos de ajuda de indígenas que sofriam a violência garimpeira. A mesma atitude ele teve com os ruralistas. Em 2020, afirmou que o agronegócio não é o "vilão" do desmatamento da Amazônia e que ainda há um "enorme espaço de crescimento" para o setor, durante um almoço com a FPA.

Assim como Salles, Mourão não tem negócios no setor ou imóveis rurais, e como o ex-ministro recebeu dinheiro de campanha dos ruralistas. Seu maior doador individual na campanha para o Senado, com R$ 118 mil, foi Celso Paulino Rigo, dono da Pirahy Alimentos, que comercializa a marca de arroz Prato Bom. Outros valores menores vieram de pessoas como o pecuarista e arrozeiro Carlos Alberto Martins Bastos, com R$ 15 mil, ou o sojeiro, arrozeiro e pecuarista Frederico Wolf, que doou R$ 10 mil para a campanha do militar.

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