GM, p.19
23 de Mar de 1995
Presidente do Ibama resolve conflito sobre preservação da Mata Atlântica
por Francisco Stella Fagá
de São Paulo
O presidente do Instituto Brasileiro de Recursos Naturais Renováveis (Ibama), Raul Jungmann, revogou ontem a orientação de sua antecessora, Nilde Pinheiro Lago, sobre a aplicação do principal instrumento legal de proteção dos remanescentes da Mata Atlântica, o Decreto 750/93.
A ex-presidente havia orientado as superintendências regionais a aplicarem o Código Florestal, menos rigoroso, na apreciação de pedidos de desmatamentos - e não o Decreto 750, mais severo e restritivo. Circular por ela distribuída dizia que o decreto é inconstitucional.
Jungmann determinou ontem a continuidade do grupo de trabalho criado por sua antecessora com o propósito de elaborar uma minuta de lei sobre o uso e a exploração da Mata Atlântica e dos demais ecossistemas.
As diferenças entre o Decreto 750/93 e o Código Florestal são enormes. Começam pelos objetivos de cada diploma. 0 Código Florestal, em vigor desde 1965, foi concebido para proteger a produção agrícola; o Decreto 750, para preservar o meio ambiente. Por tabela, o Código Florestal acaba tendo utilidade como instrumento de proteção ambiental, ao dispor, por exemplo, que não pode ser destruída a vegetação às margens dos rios, a chamada vegetação ciliar, a da encosta de morros com declividade superior a 45 graus, e a das áreas de várzea. São restrições que os ambientalistas consideram absolutamente indispensáveis mas não suficientes para a preservação dos escassos remanescentes da Mata Atlântica.
0 Decreto 750 tem uma abrangência muito maior que a do Código Florestal. Protege não apenas o que sobrou da Mata Atlântica - cerca de 8% da cobertura original - mas também a vegetação que está se regenerando. Atinge formações florestais tropicais e subtropicais. Não se restringe a proteger a Mata Atlântica remanescente da costa brasileira. Alcança extensas áreas do interior do País.
Temor
0 dispositivo do decreto que inspira mais temor é o que mantém o "status" de Mata Atlântica das áreas indevidamente destruídas. Por força desse dispositivo, um empreendedor que destruir a vegetação de uma área protegida pelo decreto ficará eternamente impedido de dar-lhe qualquer destino comercial. Mesmo sem vegetação, o imóvel sofrerá as mesmas restrições. A severidade da sanção tem o propósito de desestimular os desmatamentos clandestinos.
Para desmatar uma área protegida pelo Decreto 750, o empreendedor precisa cumprir um rigoroso roteiro para provar que o projeto é de utilidade pública ou de interesse social. Precisa elaborar um Estudo de Impacto Ambiental (EIA) e submetê-lo a uma audiência pública à apreciação dos conselhos estaduais de meio ambiente e da anuência prévia do Ibama.
Parecer Jurídico
Por causa desse rigor, o decreto inspirou fortes reações de setores da iniciativa privada, principalmente dós empreendedores imobiliários. 0 sindicato que congrega as empresas de compra e venda de imóveis em São Paulo (Secovi) encomendou um parecer do jurista Miguel Reale, que opinou pela inconstitucionalidade do Decreto 750. O jurista concluiu que a proteção da Mata Atlântica, que precisa ser disciplinada por lei, e um decreto com esse propósito contrariam essa exigência. 0 Secovi sustenta que muitos empreendimentos estão parados por conta do decreto e que isso está prejudicando a atividade econômica.
Mas o ambientalista João Paulo Capobianco, secretário executivo do Instituto Socioambiental, sustenta que as resistências do Secovi não se justificam. Na prática, segundo ele, a quase totalidade dos empreendimentos parados foram embargados com base nas disposições do Código Florestal, e não do Decreto 750.
GM, 23/03/1995, p. 19
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