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Presidente da Funai, entrevistado pelo ISA, faz balanço positivo de sua gestão

Instituto Socioambiental (ISA) - www.socioambiental.org
Autor: Tatiane Klein
22 de Nov de 2010

Na manhã do último dia 13, a equipe de edição do livro Povos Indígenas no Brasil 2006-2010, entrevistou o atual presidente da Funai, Márcio Meira. Ao longo de 2h30 de conversa, Meira fez um balanço positivo de sua gestão, iniciada em março de 2007, mesmo com relação a pontos polêmicos como a reestruturação da Funai e o licenciamento da hidrelétrica de Belo Monte.

Acompanhado de dois integrantes de sua equipe - a diretora de Proteção Territorial da Funai, Maria Auxiliadora de Sá Leão, e do técnico indigenista Francisco Simões Paes - o presidente da Funai, Márcio Meira, respondeu às questões da equipe de Monitoramento do ISA, elaboradas com a colaboração de sócios e funcionários do instituto. Entre elas, temas centrais para a política indigenista oficial, como a reestruturação da Funai e a política de demarcação e gestão de Terras Indígenas.

Equipe do ISA entrevista Márcio Meira

Em suas últimas edições, a série Povos Indígenas no Brasil tem publicado entrevistas com presidentes da Funai como Carlos Frederico Marés, Marcio Santilli e Mércio Gomes. A entrevista completa, com as perguntas e respostas, será publicada na próxima edição do livro Povos Indígenas no Brasil 2006-2010, a ser lançada no primeiro semestre de 2011.

Márcio Meira respondeu a questões específicas, como a atuação do órgão indigenista contra pressões e ameaças que os povos Awá Guajá (no Maranhão) e Yanomami (em Roraima) vêm sofrendo em suas terras; a fiscalização dos casos de arrendamento em TIs; a presença de missionários em terras de povos com pouco contato; e o potencial de projetos com serviços ambientais e REDD (Redução de Emissões por Desmatamento e Degradação) em TIs. Veja alguns destaques entre os temas abordados:

Reestruturação

Meira enfatizou mudanças realizadas na estrutura da Funai e comentou a diferenciada formação dos recém-contratados pelo órgão. Citou a construção do Centro de Formação em Política Indigenista da Funai, em Sobradinho (DF), que permitirá que os indigenistas sejam formados para serem protagonistas dos projetos de gestão pública. Lembrou ainda como ponto de destaque, a atualização do estatuto da Funai para os marcos definidos pela Constituição de 1988.

Demarcações

Tanto Meira quanto Maria Auxiliadora destacaram o esforço da atual gestão (Meira foi indicado para o cargo em março de 2007) em tentar avançar na demarcação de Terras Indígenas fora da Amazônia Legal. As regiões Centro-Oeste, Sul, Sudeste e Nordeste concentram atualmente 1,39% da extensão de todas as Terras Indígenas do Brasil, conhecidas por conflitos fundiários que se cristalizaram ao longo da história. Por isso é nessas regiões que, hoje, a Funai está concentrado o maior número de grupos de trabalho para demarcação de terras: "As grandes Terras Indígenas foram demarcadas, homologadas, reconhecidas pelo Estado brasileiro. Qual o grande desafio daqui para a frente? São as que estão fora da Amazônia Legal, regiões em que o processo de conflito com a expansão colonial brasileira é muito grande", explica Meira.

Entraves jurídicos aos processos de demarcação também foram citados por Meira. "Muitas vezes a Funai faz um GT, o GT identifica a Terra Indígena, e o Poder Judiciário breca todo o processo administrativo". Outro componente que dificultaria as demarcações é a existência de títulos de posse: "Nós temos defendido que haja um aperfeiçoamento no Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT) para que, em terras com títulos de boa fé e ocupação, possa ser feito, eventualmente, o pagamento pela terra. Isso porque nessas áreas, de fato, as situações são muito complexas", afirmou o presidente da Funai, lembrando conflitos como os que ocorrem no sul do País entre indígenas e colonos.

Gestão concentrou esforços para demarcar TIs fora da Amazônia Legal

Meira lembrou que entre os casos de demarcação resolvidos estão o reconhecimento final das TIs Comboios e Tupiniquim (no Espírito Santo), que são parte de um conflito fundiário que se desenrola há quase 30 anos na região de Aracruz, contra a empresa Fibria (ex-Aracruz Celulose). No último dia 5 de novembro, o Presidente Lula assinou a homologação das TIs em um ato tão significativo quanto a homologação da TI Raposa-Serra do Sol, em Roraima, na opinião de Meira.

Meira respondeu ainda a perguntas sobre as demarcações que incidem sobre populações tradicionais e Unidades de Conservação. "O princípio que a gente tem usado tem sido sempre o de buscar a negociação ou o entendimento entre essas populações". Um exemplo positivo, no sentido de fomentar o diálogo, seria o da sobreposição da Terra Indígena Barra Velha do Monte Pascoal, do povo Pataxó, e do Parque Nacional do Monte Pascoal, que vem sentido debatida entre Funai, ICMbio, Incra e os Pataxó.

Obras de infraestrutura

Com relação ao licenciamento de obras de infraestrutura, Meira narrou seu esforço e o de sua equipe para criar entendimentos com responsáveis por outros setores dentro do governo - como o energético e o de transportes -, e fazer com que a questão indígena deixasse de ser vista com preconceito. Contou ter conseguido respeito e aberto canais de diálogo com diversos setores tradicionalmente anti-indígenas.

Questionado sobre a efetividade do direito de consulta prévia, livre e informada, no caso do licenciamento da construção da UHE Belo Monte (na Volta Grande do Rio Xingu, no Pará) - conforme determina a Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho, da qual o Brasil é signatário -, o presidente da Funai respondeu com muita convicção que a consulta foi realizada. "No caso de Belo Monte, nós cumprimos com tudo. Os índios participaram da produção do termo de referência - aliás, extremamente rigoroso. O Estudo de Impacto Ambiental (EIA) foi feito por especialistas e avalizado pelos índios. Antes de a Funai emitir o parecer sobre o estudo, nós voltamos às aldeias. Cumprimos e colocamos em nosso parecer todas as condições necessárias para que o empreendimento seja feito com viabilidade. E o Ibama considerou e acolheu todos os condicionantes", afirmou. Apesar das explicações de Meira, a questão da consulta prévia, livre e informada, que de acordo com índios e indigenistas não foi realizada, continua sendo motivo de críticas.

Para o presidente da Funai, a polêmica em torno da questão tem a ver com a inexistência de um entendimento padrão sobre como elas devem ser feitas - algo que não está determinado na Convenção 169. "Como nós não temos uma definição clara no Brasil do que é a consulta, tem gente que acha que ela foi feita e tem gente que acha que isso não é consulta. Nós acreditamos que a consulta foi feita, porque a consulta, na verdade, é permanente. Nós temos que dialogar e informar permanentemente".

http://www.socioambiental.org/nsa/detalhe?id=3216

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