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Por uma urgente integracao da Amazonia

FSP, Tendencias:Debates, p.A3
Autor: SERRANO, Rosalia Arteaga
25 de Nov de 2005

TENDÊNCIAS/DEBATES
Por uma urgente integração da Amazônia
Rosalía Arteaga Serrano
O futuro da Amazônia, o maior conjunto contínuo de florestas tropicais do mundo, interessa a nós, habitantes dos países que têm a sorte de compartilhá-la, mas também a toda a humanidade. Em seu seio, ela concentra 25% de todas as espécies vivas, constituindo o espaço máximo de diversidade biológica do planeta. Quase 20% das reservas mundiais de água doce pertencem à região. 400 grupos indígenas portadores de um extraordinário tesouro cultural habitam a floresta.A riqueza da Amazônia ainda não favoreceu os que deveriam ser os primeiros beneficiários: os povos da bacia
Mas tanta riqueza nos confronta com desafios proporcionais. Ela ainda não favoreceu aqueles que deveriam ser os primeiros beneficiários: os povos da bacia. Sob o predomínio de uma idéia de progresso "para" a Amazônia, foi relegada a necessidade de um progresso "da" Amazônia, com o paradigma de desenvolvimento sustentável como eixo. Um exame da realidade mostra que, embora tenham sido registrados avanços nacionais em alguns aspectos, uma visão fragmentada da bacia tem poucas oportunidades reais de atingir o desenvolvimento que pretendemos.
Lembremos que a Amazônia é compartilhada por oito países e um território. Ocupa mais de 40% da superfície da América do Sul, com 7,5 milhões de quilômetros quadrados, habitados por 30 milhões de pessoas. Sabemos que no imaginário mundial é recorrente pensar na Amazônia como sinônimo de Brasil. Essa associação tem origem, entre outros, no fato de que 68% da bacia amazônica e das florestas tropicais se encontram no território brasileiro. Mas no Peru, dono de 13% da bacia, 74% do território é amazônico. Na Bolívia, conhecida mundo afora pelas belezas andinas, 75% das terras são amazônicas, representando 11,2% da bacia. Metade do território equatoriano é amazônico.
Diante dessa realidade, a integração vai deixando de ser discurso abstrato de boas intenções e vai se transformando em um eixo de fortalecimento de nossas nações. Hoje, os governos do Brasil, Bolívia, Colômbia, Equador, Guiana, Peru, Suriname e Venezuela, países que integram a Organização do Tratado de Cooperação Amazônica (OTCA), trabalham com o objetivo de responder de forma conjunta aos desafios comuns.
O fortalecimento dessa união é requisito fundamental para alcançar condições de vida mais igualitárias para nossos povos e para evitar a destruição de nossas florestas. Com a vontade política dos governos dos oito países, a bacia pode se transformar, assim, num caminho excepcionalmente favorável para a integração regional, com base nos ideais e nos sonhos de visionários de unidade sul-americana. A OTCA e sua Secretaria Permanente vêm assumir essa missão.
O Tratado de Cooperação Amazônica (TCA), firmado pelos oito países em 1978 com o objetivo de promover ações conjuntas para o desenvolvimento harmônico da região, continua atual. Os preceitos do TCA -de preservar o meio ambiente e assegurar o uso racional dos recursos naturais- nos guiam, hoje, unidos à certeza de que há muito trabalho pela frente, pois foi dessa consciência que a OTCA nasceu e se estabeleceu em Brasília, em 2003.
Para implementar esses compromissos, a Secretaria Permanente tem se empenhado em construir, junto aos países-membros, uma agenda comum, avançando com firmeza no desafio histórico da integração sul-americana. Pretendemos, como diriam os amazônicos brasileiros, "amazonizar" o mundo.
A atuação conjunta é imperiosa. Eventos como a recente seca que atingiu o Brasil, a Bolívia e o Peru e deixou milhares de pessoas isoladas, sem comida nem medicamentos, ratificam a necessidade de uma reflexão coletiva urgente e da adoção de medidas concretas conjuntas. A mesma apreensão temos diante da advertência dos pesquisadores sobre a possibilidade de savanização ou desertificação da floresta pelos efeitos do desmatamento.
Por isso, trabalhamos para que a Secretaria Permanente se torne um guarda-chuva que envolva e harmonize as iniciativas regionais e obtenha recursos para desenvolver programas de amplo alcance.
Na cúpula de Manaus, em setembro de 2004, os chanceleres aprovaram o plano estratégico da OTCA e tomaram uma série de decisões inéditas, entre elas, a de convocar reuniões ministeriais para discutir e tomar medidas de acordo com as especificidades da Amazônia. Duas reuniões de alto nível foram organizadas sobre temas vitais como propriedade intelectual e industrial e ciência e tecnologia. Em outubro, iniciamos o Programa de Gestão Integrada e Sustentável dos Recursos Hídricos Transfronteiriços do Rio Amazonas.
A atividade tem sido intensa, e a 9o Reunião de Ministros das Relações Exteriores dos Estados-Membros, a ser realizada hoje, em Iquitos, no Peru, será a oportunidade para refletirmos sobre nossas realizações e definirmos quais devem ser os próximos passos.
Neste momento histórico, esperamos o engajamento e a mobilização de todos os setores para responder aos desafios e realizarmos nossos sonhos. Com a assinatura da Declaração de Iquitos na próxima semana, em que reafirmaremos nosso compromisso com essa tarefa comum, estaremos dando mais um passo para proteger a Amazônia como fonte estratégica da vida.

Rosalía Arteaga Serrano, 48, jornalista e advogada, com mestrado em educação básica e resgate de valores culturais na América Latina, é secretária-geral da OTCA (Organização do Tratado de Cooperação Amazônica). Foi presidente constitucional do Equador (1997) e ministra da Educação e Cultura daquele país (1994).

FSP, 25/11/2005, p. A3

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