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Política energética

OESP, Notas & Informações, p. A3
02 de Set de 2006

Política energética

Pesquisa do Instituto de Economia da Universidade Federal do Rio de Janeiro, divulgada segunda-feira pelo Estado, mostrou que a maioria das entidades do setor elétrico acredita que poderá haver um novo colapso elétrico até 2010. A reportagem citou o descompasso "entre o que o governo fala e o que ocorre no setor", como notou o diretor da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo, Luiz Gonzaga Bertelli, para quem "há um marasmo nas licenças ambientais e nas agências".

Não basta que o Executivo Federal assegure que não há risco de colapsos até 2015, pois não apenas o setor privado, como até um órgão público - o Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS) - admitem o atraso na remoção de fatores que inibem as decisões de investimento, tais como as restrições ambientais, a lentidão governamental e o enfraquecimento das agências reguladoras. E, além disso, enfatizam a urgência de ampliar os investimentos não apenas em geração, mas também na transmissão de eletricidade.

O presidente da Empresa de Pesquisa Energética (EPE), Maurício Tolmasquim, tentou desqualificar a pesquisa da UFRJ. "É a primeira vez que vejo um assunto tão sério e técnico ser debatido por meio de uma sondagem", declarou. "Caminhamos agora para o campo do ridículo."

Segundo ele, para assegurar o abastecimento, bastará a entrada em operação de empreendimentos como a Usina Nuclear Angra 3, a partir de 2013, e, antes disso, das Usinas Hidrelétricas de Belo Monte, no Xingu, e Jirau e Santo Antônio, no Madeira. E, se isto não for possível, bastará aumentar a oferta de energia gerada por termoelétricas movidas a biomassa, carvão e gás natural. A argumentação do presidente da EPE despreza os fatos, a começar pelo de que não há garantia de oferta de gás natural, pois o Brasil depende da importação do insumo da Bolívia.

Além disso, segundo dados oficiais da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), nada menos de 23 usinas hidrelétricas licitadas entre 2000 e 2002 não tiveram suas obras sequer iniciadas: 12 esperam a obtenção da licença prévia dos órgãos ambientais, 5 esperam licença para iniciar obras e 6 já têm licença, mas ainda não cumpriram exigências ambientais. Ou seja, usinas com capacidade de gerar 5.157 MW nem sequer estão em obras. E as Usinas do Xingu e do Madeira são, por ora, meros projetos, que, na hipótese mais otimista, a partir do início das obras levarão cinco anos para que possam começar a gerar energia.

A situação é tão grave que há dúvidas sobre o que será ofertado no leilão de energia marcado para outubro, pois três dos seis empreendimentos cuja energia será licitada estão sofrendo ações judiciais. Na segunda-feira, a Justiça Federal do Paraná acolheu pedido de liminar contra o licenciamento da Usina de Baixo Iguaçu, com potência de 350 MW.

Os riscos não se limitam à geração. O Brasil tem 82 mil km de linhas de transmissão e precisará ter 123 mil km até 2015, calcula o MME. Mas o ONS estima que 12,4 mil km terão de ser adicionados à malha atual entre 2007 e 2009, o que exigirá investimentos de R$ 13,8 bilhões. Como exemplo, não fossem os investimentos realizados em transmissão e o Rio Grande do Sul estaria, hoje, em plena crise energética, pois o Estado hoje importa cerca de 30% da energia que consome. Segundo o ONS, nove capitais brasileiras necessitam obras urgentes no sistema de transmissão.

Estão em questão tanto a capacidade de a política energética do governo atrair investimentos como o próprio modelo elétrico. Para reduzir o custo da eletricidade fornecida às residências, o MME majorou a energia consumida pelas empresas. Segundo a Aneel, as tarifas industriais subiram 108,9% desde 2002 e já se incluem entre as mais elevadas do mundo. Em resumo, as empresas brasileiras já não se beneficiam da predominância da geração hídrica, mais barata.

Grandes consumidores que se servem do mercado livre de energia conseguiram economizar R$ 2,6 bilhões, em 2005, mas não têm a segurança de que serão atendidos se houver colapso, no futuro.

O sucesso de uma política energética é assinalado pela oferta confiável, no longo prazo. Não pode depender apenas de investimentos passados e de um regime pluvial favorável, como hoje, mas de projetos percebidos como exeqüíveis.

OESP, 02/09/2006, Notas & Informações, p. A3

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