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Pará tem 30% das mortes em conflitos por terra no Brasil

O Globo - http://blogs.oglobo.globo.com
25 de Mai de 2017

Pará tem 30% das mortes em conflitos por terra no Brasil

Jan Niklas*

Uma história sangrenta com assassinatos que se repetem ao longo dos anos. É o que mostram os números dos conflitos rurais em disputas por terra no Brasil, ampliados nesta quarta-feira com a morte de mais dez pessoas durante ação policial em uma fazenda no Pará, estado que concentra 30% do total desses assassinatos no país. Levantamento feito pelo Núcleo de Dados, com base em relatórios produzidos pela Comissão da Pastoral da Terra (CPT) desde 1985, mostra as transformações desses casos ao longo dos anos, as áreas onde mais ocorrem e uma modalidade de crime que se tornou prática recorrente no campo: as chacinas - ocorreram 61 homicídios coletivos no período analisado.
Conflitos por terra ocorrem quando há ocupação de áreas públicas ou privadas, por grupos como indígenas, quilombolas e sem-terra, que acabam entrando em desacordo com interesses do Estado, de fazendeiros, madeireiros e de agentes do agronegócio. Em muitos casos, essas populações são expulsas sob ações violentas, como agressões físicas e homicídios.
Pará é o estado mais violento
O Pará chama atenção pelo índice de violência disparado. Com 541 mortes desde 1985, o estado concentra sozinho 30% de todas as ocorrências registradas na série histórica. É seguido pelo Maranhão, com um total de 164 mortes e pelo Mato Grosso com 131. Chama atenção também o estado de Rondônia, que, apesar de ser o 4o estado brasileiro menos populoso, segundo censo do IBGE de 2010, é também o 4o estado que mais mata em disputas agrárias no país.
Todos essas unidades federativas se encontram na área denominada como Amazônia Legal (formada pela região norte, mais o Mato Grosso e grande parte do Maranhão). No ano passado, essa região concentrou 79% dos assassinatos, tendo registrado 48 deles. É nesta área também que se encontram 98% das Terras Indígenas do Brasil, segundo o Instituto Socioambiental (ISA). Essa população é uma das que mais sofrem com as disputas por terra. Em 2016, foram 13 mortos.
Violência volta a aumentar
Após anos numa tendência de queda, os registros da violência em áreas rurais do país saíram do pico de 154 mortes, contabilizadas em 1987, para os 21 assassinatos ocorridos em 2001, ano menos violento desde o início do levantamento. Em 2015 os número voltaram a subir após uma década de pouca oscilação, com a média de mortes semanal passando de uma por semana no ano passado.
Só em 2017 já há registros de 36 assassinatos, segundo a CPT, já contando com as vítimas do conflito desta quarta-feira no Pará. Chamou atenção neste ano também a chacina que deixou nove trabalhadores rurais mortos a tiros e facadas em um assentamento na cidade de Colniza, no interior do Mato Grosso.
Entre 1985 e 1996, o período mais violento no campo, houve uma média de 81 assassinatos por ano. Entre os anos de 1997 e 2014 esse indicador caiu para menos da metade, com uma média de 35 casos por ano.
Segundo o geógrafo e professor da USP, Ariovaldo Umbelino, a raíz dos conflitos rurais no Brasil está nos processos de propriedade de terra. A grilagem e obtenção de documentação por meios ilícitos seriam os principais motivo destas disputas.
- Existe um problema de origem que o governo não vai atrás, que são os registros ilegais cartoriais. Há muitas fraudes nas cadeias dominiais e nas escrituras. Se o governo fizesse um investimento nos cartórios, e fosse verificar, veria que a maioria dos fazendeiros não tem um documento completamente perfeito.
O desrespeito à legislação e a corrupção entranhada em órgãos públicos seriam as causas do histórico de violência no campo:
- O cidadão que compra essa terra com problema de origem, registros completamente fraudados, acaba, é claro, se arvorando no direito de defender a sua propriedade, de fazer ele mesmo a justiça, e não de seguir o que a lei manda. Por isso existe essa febre no Brasil para conseguir um pedaço de terra - diz Umbelino.
Histórico de massacres
Além dos números totais e da concentração em determinadas localidades, é notável a recorrência de crimes que se configuram como chacinas ao longo dos anos. De 1985 até 2016, foram encontrados 61 crimes onde 3 ou mais pessoas foram assassinadas ao mesmo tempo no mesmo local. De 2015 até maio deste ano, já ocorreram quatro massacres com um total de 30 mortos.
Um dos casos históricos mais emblemáticos é o de Eldorado dos Carajás, no Pará, quem aconteceu em 1996. Na ocasião, 19 trabalhadores rurais sem-terra foram assassinados pela Polícia Militar, sendo que em dez deles havia sinais de execução. Também com um alto número de mortes, o Massacre do Capacete, como ficou conhecido o ataque a indíos Ticuna em 1988, acabou com 14 indígenas mortos por madeireiros.
Violência deve ser combatida em atuação conjunta de órgãos
O Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) afirmou em nota que a violência em áreas rurais tem "causas diversas, como a disputa pela posse da terra, o desmatamento ilegal, a exploração irregular de recursos naturais, o trabalho análogo ao escravo e a ausência de regularização de posses e ocupações de áreas públicas".
Em relação às medidas para combater a escalada destes crimes, o órgão afirmou que "considera importante a instalação de mais núcleos especializados na área agrária nas Polícias Civis e Militares, Promotorias, Defensorias e Tribunais de Justiça nos estados". Segundo o INCRA, a atuação dessas entidades com o Governo Federal é imprescindível para reduzir os conflitos agrários em todo o País.
*Estagiário sob supervisão de Fábio Vasconcellos

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