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Para Stiglitz, Brasil tem de cobrar compensação por manter Amazônia

O Globo, Economia, p. 30
08 de Abr de 2006

Para Stiglitz, Brasil tem de cobrar compensação por manter Amazônia
Nobel de Economia diz que país não leva a sério condição de 'pulmão do mundo'

WASHINGTON. Ousado e intrigante em suas manifestações públicas, como de costume, Joseph Stiglitz, prêmio Nobel de Economia, procurou fugir ontem dos clichês utilizados pelos economistas internacionais ao analisar o Brasil. Convidado especial do Banco Mundial (Bird) para o seminário "Contrastes do Desenvolvimento - O Surpreendente Caso do Brasil", ele destacou um fator que habitualmente é deixado de lado pelos demais: o meio ambiente.

Segundo Stiglitz, o Brasil está precisando encontrar uma forma de cobrar do resto do mundo por um serviço que atualmente fornece gratuitamente. O resultado disso poderia ajudar significativamente no crescimento do país, afirmou.

- O Brasil fornece enormes serviços ambientais ao mundo (mantendo a floresta amazônica) e não é compensado por isso. O valor desses serviços é enorme, e o mundo não paga nada por eles - ressaltou o economista.

Nobel atribui falta de investimento a juros altos

Stiglitz sugeriu que o governo brasileiro tenha uma postura mais firme nesse sentido, insinuando que o próprio país não estaria se dando a devida importância como "o pulmão do mundo", como é habitualmente classificado:

- É imperativo que a voz do Brasil seja ouvida nas questões ambientais - afirmou Stiglitz.

Segundo ele, apesar dos problemas persistentes, o Brasil "é um modelo de sucesso". Mas, estranhamente, é vítima de uma contradição:

- O país se excede no crescimento de suas exportações sem, ao mesmo tempo, conseguir fazer crescer a sua economia. É incrível que o Brasil consiga exportar tanto e, ao mesmo tempo, resistir ao crescimento econômico - disse o economista, em tom irônico.

Pelas suas estimativas, isso se deve a um fator específico: o baixo índice de investimentos realizados tanto - e principalmente - pelo governo quanto pelo setor privado. Isso, no entanto, também tem a sua razão:

- Não há um volume de investimentos necessários porque as taxas de juros são muito altas no país.

Segundo Stiglitz, a atual imagem positiva do país nos mercados internacionais é muito útil, mas confiar apenas nela e nos fluxos de capital estrangeiro seria "um risco estratégico". Ele acredita que o país não deve depender dessa fonte "pois ela é extremamente volátil".

- Vejo uma enorme capacidade de mudanças para melhor, em várias áreas no Brasil. O que me intriga é uma questão: por que isso não contagia toda a economia brasileira?

Stiglitz enlaçou elogios com críticas em tom de sugestões. Afirmou, por exemplo, que o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) "é mais bem-sucedido que o próprio Banco Mundial", e que o crescimento econômico brasileiro - que tem sido menor do que permite o potencial do país - "seria pior se não fosse pelo BNDES e outros bancos regionais".

Economista: pobres estariam melhor sem governo

Um dos problemas mais agudos, na opinião do economista, são as altas taxas de juros, que sobrecarregam cada dia mais a dívida interna do próprio governo:

- Uma das coisas que mais contribui para que os juros sejam tão altos no Brasil é a política monetária. Ela é excessivamente apertada. E foi concebida com o fim de se obter credibilidade dos mercados. Hoje, no entanto, já existe espaço suficiente para um afrouxamento das restrições - disse Stiglitz.

Peter Hakim, presidente do centro de estudos hemisféricos Inter-American Dialogue, que também participou do seminário do Bird, usou um tom irônico. Ele disse que o combate à pobreza no Brasil soa, há vários governos, apenas como uma retórica, sem compromisso prático real. E concluiu:

- Pensando bem, eu acho que os pobres do Brasil se dariam melhor sem governo.

O Globo, 08/04/2006, Economia, p. 30

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