VOLTAR

Padre paraense sofre ameacas

JB, Pais, p.A4
21 de Fev de 2005

Padre paraense sofre ameaças

SÃO PAULO - ''A gente também se coloca à disposição de lutar pela vida. Se o nosso destino for esse, paciência, outros aparecem e tocam a luta''. É assim que José Amaro Lopes de Sousa, o padre Amaro, encara as constantes ameaças de morte que recebe como um dos coordenadores da regional do Pará da Comissão Pastoral da Terra (CPT), que atua em Anapu, onde a freira Dorothy Stang foi assassinada no último dia 12. Amigo da missionária, o padre de 38 anos sofre com o destino dela e de outros companheiros de luta que tombam dia a dia por causa do conflito fundiário na região. Na última semana, só na cidade de Anapu, outros dois trabalhadores rurais foram mortos.

Nascido na cidade de Itapecuru, no interior do Maranhão, logo aos 11 anos começou a participar do sindicato dos trabalhadores rurais da região, como ajudante na delegacia sindical. Mais tarde entrou para o seminário e, percebendo os males do coronelismo, que expulsava e explorava populações vulneráveis, como ribeirinhos e quebradeiras de coco, passou a se interessar cada vez mais pela causa dos trabalhadores rurais.

- Aquilo foi me irritando porque o evangelho diz que a terra é um dom de Deus para a gente usufruir, e não para explorar - conta padre Amaro, que defende uma reforma agrária clara para acabar com os conflitos, e aponta o Projeto de Desenvolvimento Sustentável (PDS) como uma possível saída para o problema da destruição da floresta.

Ao lado da irmã Dorothy, padre Amaro não apenas ajudou a fundar a associação dos assentados como defendeu uma reforma agrária eficiente, independente de questões partidárias. Talvez resida aí um dos principais motivos para tantas ameças e assassinatos à lideranças rurais. Afinal, como enfatiza o padre, ''esses grupos que estão atacando são os mesmos que financiam as campanhas políticas e se sentem com as costas quentes, porque muitos dos nossos governantes estão com rabo preso com eles''. Se forem presos, complementa, muitos políticos não vão ter dinheiro para fazer as próximas campanhas políticas e se manter no poder.

Padre Amaro define a atual situação fundiária do país como um clima de terror macabro. Para ele, a implementação do Programa Nacional de Proteção aos Defensores de Direitos Humanos - ironicamente iniciado no Pará dias antes ao assassinato da freira - pode ser frustrante:

- Criam muita lei que fica no papel, tanta burocracia, que ela não sai. Tem que ter um tipo de segurança não simplesmente para uma, duas ou três pessoas que estão na frente, mas para que o povo possa se sentir seguro.

Mas as ameaças de morte e a violência contra os trabalhadores rurais no Pará estão longe de ser um caso recente. De acordo com padre Amaro, o fato de o estado ter o maior índice de assassinatos ligados à disputa de terras é uma questão muito antiga.

- Aqui no Pará, as pessoas chegavam e marcavam as terras, diziam simplesmente: ''aqui é meu e pronto''. Depois vendiam para pessoas do Sul que apareciam com documentos fraudulentos, dizendo que são donas de uma imensa área de terra onde tem trabalhadores - explica.

Não é para menos que o padre tenha muita dificuldade de acreditar na justiça. Uma semana antes do caso da irmã Dorothy, conta, haviam queimado a casa de um trabalhador, pai de 10 filhos, e foi registrada a queixa na polícia e nada foi feito. A atitude tomada, segundo o padre, foi do próprio fazendeiro que mandou queimar a casa e, no dia seguinte, estava de mão dada com a polícia civil.

- O próprio governo do estado está tentando tirar a responsabilidade dele. Isso dá uma indignação na gente. Se você é trabalhador e vem lutar pelos direitos, como você faz? - questiona o padre que espera uma melhora com a chegada da polícia federal.

JB, 21/02/2005, País, p.A4

As notícias aqui publicadas são pesquisadas diariamente em diferentes fontes e transcritas tal qual apresentadas em seu canal de origem. O Instituto Socioambiental não se responsabiliza pelas opiniões ou erros publicados nestes textos. Caso você encontre alguma inconsistência nas notícias, por favor, entre em contato diretamente com a fonte.