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ONU respalda uso de transgênicos no combate à fome

O Globo, Ciência e Vida, p. 30
18 de Mai de 2004

ONU respalda uso de transgênicos no combate à fome

A biotecnologia representa uma grande esperança para agricultores de países em desenvolvimento, mas, até agora, apenas algumas dessas nações estão desfrutando de seus benefícios. A análise está no relatório anual da Organização para Agricultura e Alimentação (FAO, na sigla em inglês) da ONU, divulgado ontem.
Numa clara defesa da adoção de alimentos transgênicos como uma das formas de combate à fome mundial, a FAO alerta para o fato de que cultivos considerados essenciais sobretudo nos países mais pobres - como mandioca, batata e trigo - vêm sendo negligenciados por cientistas. O documento lembra que o mundo terá 2 bilhões de pessoas a mais para alimentar até 2030 e que a biotecnologia pode ajudar a enfrentar tal desafio.
- Nem o setor público nem o privado investem significativamente em novas tecnologias genéticas para os chamados "cultivares órfãos", como o sorgo e o painço, essenciais para os povos mais pobres do planeta - afirmou o diretor-geral da FAO, Jacques Diouf.
'Transgênicos são seguros', diz documento
A posição da FAO vai de encontro às teses mais difundidas, segundo as quais o problema da fome não está relacionado à escassez de alimentos, mas sim à má distribuição.
O documento frisa que o grande desafio da biotecnologia é desenvolver técnicas que combinem o aumento da produção, a redução dos custos, a proteção do meio ambiente e, ainda, garantam a segurança alimentar. Embora o documento sustente que a biotecnologia não se restringe aos transgênicos, o texto cita o que considera organismos geneticamente modificados bem-sucedidos: "Exemplos são encontrados em variedades de arroz e canola que contêm consideráveis quantidades de betacaroteno. Esse precursor da vitamina A está presente em poucos itens da dieta de muitas pessoas, particularmente nos países em desenvolvimento, onde poderia ajudar a reduzir deficiências crônicas de vitamina A."
Segundo o texto, a pesquisa agrícola pode tirar pessoas da pobreza, ao aumentar os lucros e reduzir o preço dos alimentos. Dados da FAO revelam que mais de 70% das pessoas mais pobres do mundo vivem em áreas rurais e dependem diretamente da agricultura para sua sobrevivência.
O relatório foi divulgado menos de uma semana depois de a Monsanto ter desistido do lançamento de um trigo transgênico, sob a alegação de que não havia aceitação por parte dos consumidores. Mas o documento da FAO sustenta que, embora muitos europeus se oponham aos organismos geneticamente modificados, o mesmo não corre entre os consumidores dos países em desenvolvimento.
Embora frise que pouco se conhece sobre os efeitos a longo-prazo da ingestão de transgênicos, o texto sustenta que "os cientistas em geral concordam que os atuais cultivos transgênicos e os alimentos derivados deles são seguros para comer".

Vegetais com ômega 3 e 6

Cientistas da Universidade de Bristol, na Grã-Bretanha, desenvolveram uma planta transgênica capaz de produzir os óleos ômega 3 e 6, considerados benéficos ao coração e normalmente encontrados apenas em peixes de águas mais frias, como o salmão e o atum. Para os pesquisadores, o estudo pode levar a uma nova geração de alimentos especialmente criados para reduzir o risco de doenças cardíacas, entre outros problemas de saúde.
O estudo, publicado na "Nature Biotechnology", lembra ainda que, com a redução dos estoques naturais de peixes, a produção desses óleos em outros organismos pode ser essencial para a alimentação humana. Segundo os cientistas, os genes utilizados para induzir a produção dos óleos podem, em tese, ser usados em diversos vegetais, normalmente consumidos pelo homem.

Vantagens e perigos

Potenciais benefícios dos transgênicos:
O aumento da produtividade é um dos maiores benefícios já constatados dos transgênicos. Cultivos modificados geneticamente para serem resistentes a herbicidas e pragas já estão sendo plantados em diversos países. A redução do impacto ambiental de plantios que demandam menos agrotóxicos também é apontada como uma grande vantagem, bem como a adaptação de cultivos a diferentes condições ambientais. Para os especialistas, um dos maiores benefícios dos transgênicos seria o aumento dos valores nutricionais de diversos alimentos, caso do arroz enriquecido com vitamina A.

Os riscos em potencial:
O controle dos cultivos transgênicos ainda não é totalmente eficiente, segundo a ONU. Um milho geneticamente modificado destinado a consumo animal, por exemplo, foi encontrado em alimentos para humanos em 2000. A transferência de substâncias passíveis de causar alergias em humanos é outra preocupação dos cientistas. Plantas geneticamente modificadas podem ter efeitos não desejados também para o produtor, como retirar mais recursos do solo do que o normal ou demandar mais água. Teme-se ainda que organismos transgênicos possam levar à redução de populações naturais, causando desequilíbrio.

O Globo, 18/05/2004, Ciência e Vida, p. 30

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