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O problema do país não são as leis

Greenpeace - www.greenpeace.org
06 de Mai de 2010

O advogado Anthony Brandão, professor da Universidade de Brasília (UnB) e analista processual da Procuradoria Geral da República, acompanha o ataque ruralista ao Código Florestal com preocupação. Segundo ele, o código é o principal instrumento da sociedade para converter o que a Constituição determina - a preservação ambiental - em realidade. "O problema desse país não são as leis. São as pessoas que não querem incorporar suas obrigações para que não haja limite ao lucro", afirma.

Uma comissão especial, dominada por ruralista, prepara um ataque ao Código Florestal. Seu relator, o deputado Aldo Rebelo (PCdoB-SP), promete mudanças que podem abrir caminho para a derrubada de mais florestas no Brasil. Peça ao deputado que ajude a proteger, não destruir, a natureza.

Brandão participou, nesta segunda-feira (3), de um seminário promovido pelo Greenpeace, o WWF Brasil e a SOS Mata Atlântica sobre Código Florestal. Confira a entrevista:

Uma parcela dos proprietários rurais afirma que é responsabilidade do governo preservar, não deles. Eles estão certos?

Anthony Brandão: Esse argumento de "não sou obrigado" não vale. Não existe propriedade sem ônus. A Constituição estabelece o direito à propriedade, que precisa atender à função social. Essa é uma cláusula pétrea, que só pode mudar com uma nova Constituição ou uma revolução. A não ser que aconteça uma coisa ou outra, o Estado tem de dar efetividade a esse dever. Além disso, se o Estado tivesse unicamente essa responsabilidade, teria de desapropriar terrenos para preservar a natureza.

O que é função social da propriedade?

Na social democracia, todo mundo tem direito a acumular riquezas, desde que não prejudique a coletividade. Nas cidades, a função social é regulada pelo plano diretor. No campo, o artigo 186 da Constituição estabelece que é preciso preservar o meio ambiente. É a Constituição que traz essa obrigação, e o Código Florestal é seu principal instrumento. Há outras normas, mas o código é a primeira ponte entre a Constituição e a realidade.

A Constituição é de 1988. Quem desmatou antes e não preservou a natureza é anistiado?

Quando uma nova Constituição é instaurada, é preciso se adequar à nova realidade. É como a abolição da escravidão: não importava quanto dinheiro o fazendeiro tivesse jogado nisso antes - a partir daquele momento, acabou. É claro que os valores sociais evoluem, as ocupações não são ilícitas, mas tem de se adequar. O proprietário que não preservou antes não vai ser responsabilizado criminalmente pelo o que aconteceu antes, mas o será se não se adaptar.

O que é obrigação do proprietário rural?

Garantir a conservação das áreas de proteção permanente (APPs), na margem dos rios e topos de morros, por exemplo, e manter a reserva legal. Isso não só para garantir a biodiversidade mas também para garantir processos ecológicos, essenciais para o ciclo da água, do nitrogênio e para a produção de alimentos. A nossa ética é a lógica econômica também na hora de se fazer a gestão dos recursos naturais. As pessoas precisam pensar em reserva legal também como uma despensa - não só de madeira mas também onde se protege o solo.

Um dos argumentos econômicos de quem quer mudar o Código Florestal é que ele engessa a produção de alimentos e de riquezas para o país.

Não é preciso desmatar nem mais um pedaço de pau para produzir alimentos no Brasil. E até que ponto o que esses caras fazem reverte em riqueza para o país? É possível duplicar a produção com reserva legal e APP. O problema desse país não são as leis. São as pessoas que não querem incorporar suas obrigações para que não haja limite ao lucro. O que se pensa é: "Se posso detonar tudo e ganhar com isso, por que fazer diferente?"

Qual é sua opinião sobre o Código Ambiental de Santa Catarina, em análise no Superior Tribunal Federal? Ele é um instrumento tão efetivo quanto o Código Florestal?

Esse Código Ambiental é uma tristeza. Santa Catarina, antes de ser uma unidade da federação, está ligado a um bioma e a uma bacia que não seguem essas fronteiras. Reduzir a mata nas margens dos rios, por exemplo, tem impacto em outros locais. O que acontece ali - poluição, assoreamento - acaba no mar ou em outro rio.

http://www.greenpeace.org/brasil/pt/Noticias/O-problema-do-pais-nao-sao…

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