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O novo 'lobby' ambiental

O Globo, Opinião, p. 7
Autor: LEMOS, Haroldo Mattos de
31 de Jan de 2008

O novo 'lobby' ambiental

Haroldo Mattos de Lemos

Está na ordem do dia a discussão sobre o uso das sacolas plásticas. Elas fazem parte do cotidiano de milhares de pessoas por serem leves, práticas, higiênicas e se prestarem a múltiplos usos. No Brasil, cerca de 80% das pessoas que compram em supermercados estão a pé ou viajam de ônibus.

A discussão sobre o uso das sacolas plásticas, conclusão minha, foi provocada pela entrada no mercado do chamado incorretamente de "plástico oxibiodegradável", ação que motivou os interessados a iniciarem uma campanha para vender o seu produto. A alegação é que o plástico permanece mais de 200 anos no lixo ou na Natureza sem se degradar, um apelo que serve para a promoção de um produto que se "degrada" em seis meses. Mais uma bandeira ambiental levantada com interesses comerciais por trás. Lobbies foram realizados em prefeituras para a substituição obrigatória das sacolas plásticas usadas pelo varejo pelas de plástico oxibiodegradável.

Para entender melhor essa "maravilha", participei, em meados do ano passado, do I Seminário Internacional de Plásticos Degradáveis e Biodegradáveis, evento patrocinado pelos promotores desta nova tecnologia. Na ocasião, assisti a uma excelente apresentação da dra. Eloísa E. C. Garcia, pesquisadora do Cetea/ ITAL (Centro de Tecnologia de Alimentos, do Instituto de Tecnologia de Alimentos Campinas), sobre "Plásticos e meio ambiente: qual é o caminho sustentável?".

Além de falar com conhecimento de causa sobre a metodologia da avaliação do ciclo de vida dos produtos, a dra. Eloísa demonstrou com absoluta clareza as "13 razões por que a degradação não é solução para a questão dos resíduos sólidos urbanos".

Por exemplo, o fato de que os "oxibiodegradáveis" são apenas "oxidegradáveis". Assim, quando ocorre a degradação, eles apenas se "esfarelam", não resolvendo um "problema" e criando outros. Além disso, os plásticos têm uma excelente reciclabilidade mecânica, tornando-se matéria-prima para a confecção de outros produtos de plástico. Têm também um excelente potencial de recuperação energética, quando usamos instalações adequadas para esse fim.

Portanto, as sacolas de plástico são inteiramente recicláveis, e não deveriam ser simplesmente descartadas no lixo. A não ser que sejam reusadas para alguma atividade necessária. Na minha casa, usamos todas as sacolas dos supermercados para embalar o lixo. Mas e a acusação de que as sacolas plásticas jogadas no aterro sanitário levam 200 anos para se degradar? Eu argumento que, felizmente, o plástico que não se destina ao processo de reciclagem e vai para os aterros ficará muitos anos sem se degradar, pois se isso ocorresse imediatamente estaria liberando para a atmosfera gases de efeito estufa.

Como o aquecimento global e suas conseqüências são o maior problema ambiental que vamos enfrentar neste início de século, o fato de o plástico que vai para os aterros não se degradar nos ajuda a diminuir os efeitos do aquecimento.

O que se pode fazer para reduzir o consumo de sacolas plásticas? Na Europa, quem vai a um supermercado e pede sacola plástica para embalar suas compras paga por isso. Assim, as pessoas não jogam as sacolas no lixo, guardam para a próxima vez que forem às compras. Além disso, as sacolas, lá, são de melhor qualidade, mais resistentes, e podem ser usadas várias vezes.

Aqui no Brasil, para fabricar uma sacola mais resistente e que possa ser reutilizada várias vezes, a indústria criou o Programa de Qualidade e Consumo Responsável de Sacolas Plásticas e adotará a Norma Técnica ABNT 14.937. O programa prevê a criação de um selo de qualidade para que a população identifique as sacolas que foram fabricadas em conformidade com a norma técnica.

Um termo de parceria entre representantes da indústria do plástico e da rede de supermercados foi assinado no mês passado e, com isso, esperase que, em 90 dias, ocorra uma redução de consumo de sacolas plásticas da ordem de 30%. Para tanto, será necessária também a realização de campanhas de educação sobre o uso responsável das sacolas plásticas. A idéia é estimular seu reúso, sua reciclagem ou sua recuperação energética. Na minha casa, provavelmente, terei de começar a comprar sacolas de plástico para lixo

Haroldo Mattos de Lemos é professor de Engenharia Ambiental da Escola Politécnica da UFRJ, presidente do Conselho Técnico da ABNT e presidente do Instituto Brasil Pnuma (Comitê Brasileiro do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente).

O Globo, 31/01/2008, Opinião, p. 7

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