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O difícil combate ao contrabando

O Globo, O País, p. 3
17 de Abr de 2005

O difícil combate ao contrabando
Fiscalização precária e gigantismo da área facilitam ação dos piratas

Responsável por 73% da biodiversidade do planeta, a Amazônia é o alvo principal da biopirataria. Insetos, serpentes, plantas, macacos, é quase impossível deter o contrabando de espécies da fauna e da flora da região. De um lado, fiscais em desvantagem numérica e tecnológica; de outro, pesquisadores financiados na maioria das vezes por instituições estrangeiras, com capacidade tecnológica e com amplas possibilidades de fuga pela região.
A Amazônia brasileira tem 5.109.812 quilômetros quadrados, o que equivale a cerca de 60% do território nacional e a 70% da chamada Panamazônia ou Amazônia Continental, que inclui áreas de Brasil, Bolívia, Colômbia, Equador, Peru, Suriname, Venezuela e República Cooperativa da Guiana - uma faixa de fronteira da ordem de 12 mil quilômetros, quase um continente.
Ibama tem 360 fiscais para trabalhar em toda a Amazônia
O Ibama tem 360 fiscais na Amazônia, sendo que 90 saídos de outras regiões. No início do ano, o Ibama anunciou investimentos de R$13 milhões em equipamentos - veículos, computadores, antenas, câmeras e aparelhos de GPS - que estão sendo distribuídos em 19 bases de operação.
- No Pará somos apenas 18 fiscais, mais quatro agentes federais. Além da dificuldade de infra-estrutura, a geografia dificulta a fiscalização - diz a chefe da Divisão de Proteção Ambiental do Ibama, Maria do Carmo Oliveira Brígido.
Nos primeiros meses do ano, com o período chuvoso, os biopiratas têm mais facilidade de agir. Folhas molhadas na floresta dificultam o rastreamento de pegadas. Em muitos casos, é preciso contar com a sorte, como na detenção de seis alemães ano passado numa floresta no município de Almeirim. Os fiscais do Ibama faziam uma incursão pela mata quando viram uma barraca com equipamentos de laboratório. Esperaram nove horas e flagraram os alemães tirando da floresta cobras, insetos, macacos e escorpiões.
- Eles não iriam levar os animais vivos, mas retirar material biológico. E não encontram dificuldades para embarcar nos aeroportos. Se a pessoa entra nas Guianas, não há nada a fazer - diz Maria do Carmo
O avanço dos métodos dos biopiratas chama a atenção do Ibama. Em 17 de fevereiro, os alemães Tino Hummel, de 33 anos, e Dirk Helmut Reinecke, de 44, foram presos no aeroporto de Manaus ao tentar embarcar com peixes amazônicos de venda proibida. Eles usaram um tipo de alumínio inexistente no Brasil para revestir as caixas de isopor em que transportavam peixes. Isso impediu que a máquina de raios-X do aeroporto detectasse o material.
A prisão só ocorreu porque a Polícia Federal desconfiou da quantidade de itens da bagagem dos alemães e abriu as caixas, encontrando 280 peixes de 18 espécies. Alguns nem eram catalogados ainda.
Quadrilhas internacionais de biopiratas usam a internet para vender na Europa e nos EUA produtos retirados ilegalmente da Amazônia, como essências de plantas medicinais, animais, insetos e até amostras de sangue. Entre as amostras de DNA de sangue oferecidos na internet existem as de índios das tribos karitiana e suruí, em Rondônia. Elas podem ser compradas por US$85, o equivalente a R$242, 25, no site da Coriel Cell Repositories, empresa americana especializada em pesquisas de genoma humano. No site é possível ainda encontrar amostras sanguíneas de índios do Peru, do Equador e do México.
Denúncias de venda de sangue surgiram em 1996
As primeiras denúncias de venda de DNA do sangue surgiram em 1996. Um ano depois, a Câmara dos Deputados criou uma comissão para investigar casos de biopirataria. Na época, constatou-se que era possível adquirir pela internet amostras de sangue de índios de todas as idades. Sete anos depois, o sangue continua à venda no site.
No Pará, a principal rota dos biopiratas é o município de Santarém, considerado um dos melhores lugares do mundo para a coleta de insetos. Enquanto um catador de caranguejo consegue apenas R$0,02 por animal capturado, vender uma aranha rende até cinco dólares. É comum encontrar pessoas nas praias à noite caçando insetos. Há pouco tempo, o Ibama e a Polícia Federal detiveram um francês que tentava embarcar no último vôo da noite para Caiena com ovos de camaleões e iguanas.

O Globo, 17/04/2005, O País, p. 3

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