VOLTAR

MPF recorre de decisão que rejeitou denúncia contra alta cúpula da Samarco

MPF - http://www.mpf.mp.br/
Autor: MPF
30 de Set de 2019

MPF recorre de decisão que rejeitou denúncia contra alta cúpula da Samarco

Em decisão da última sexta (20), Juízo Federal de Ponte Nova excluiu oito réus da ação penal

O Ministério Público Federal (MPF) recorreu de decisão do Juízo Federal de Ponte Nova (MG) que, no último dia 20, rejeitou integralmente a denúncia contra oito pessoas que integravam a alta cúpula da Samarco à época da tomada de decisões que acabaram resultando no rompimento da Barragem de Fundão ocorrido em novembro de 2015, em Mariana (MG), naquele que é considerado o maior desastre socioambiental do país.

No recurso, o MPF reitera o papel preponderante desempenhado por essas pessoas na gestão dos riscos do empreendimento, citando inclusive trecho de ata em que o Conselho de Administração, no ano de 2011, já recomendava à Samarco reavaliar a relocação das comunidades sujeitas aos "riscos catastróficos identificados pela avaliação de riscos, tomando as medidas necessárias para evitar sua ocorrência". Posteriormente, quando o minério de ferro sofreu acentuada queda de preços no mercado internacional, o mesmo Conselho pressionou pela redução de gastos, entre eles os de segurança, e elencou outras prioridades, entre as quais, "maximizar o pagamento de dividendos aos acionistas", expressão usada na ata da última reunião do órgão antes do rompimento.

A denúncia do MPF foi apresentada em 20 de outubro de 2016 e, no dia 16 de novembro seguinte, o mesmo Juízo Federal de Ponte Nova recebeu-a integralmente, excetuando-se apenas o pedido de fixação de um valor mínimo para a reparação de danos e com relação a uma agravante prevista na lei ambiental (alínea p do inciso II do artigo 15 da Lei 9.605/98).

Durante os atos iniciais da instrução penal, em que foram ouvidas as primeiras testemunhas, as defesas discutiram inúmeras questões de natureza processual e ingressaram com habeas corpus e agravos no Tribunal Regional Federal da 1ª Região contra o recebimento da denúncia e as imputações. Em outubro do ano passado, o TRF1 proferiu uma decisão trancando integralmente a ação penal com relação ao crime de homicídio e lesões corporais.

A imputação originalmente feita [de homicídio e lesões corporais] foi desclassificada para inundação qualificada pelo resultado morte (artigo 258 do Código Penal), "enquadramento que entendeu bem o TRF por fazer antecipadamente, em sede de habeas corpus, sem deixar que isso pudesse ser feito após a instrução criminal, tudo sem embargo da colossal complexidade fática do Caso Samarco", lembra o MPF.

Foi então que o processo retomou novamente o andamento na primeira instância após sete meses parado, com a mudança do rito para ordinário, já que não se tratava mais de ação penal por homicídio e eventual tribunal do júri.

No último dia 20 de setembro, a Justiça Federal, em "juízo de retratação", proferiu nova decisão rejeitando integralmente a denúncia contra oito réus ligados à Governança da Samarco (Conselho de Administração e seus comitês/subcomitês): Gerd Peter Poppinga, Stephen Michael Potter, Pedro José Rodrigues, Luciano Torres Sequeira, Maria Inês Gardonyi Carvalheiro, Sérgio Consoli Fernandes, André Ferreira Gavinho e Guilherme Campos Ferreira.

Em relação a um réu, também da Governança da Samarco, Paulo Roberto Bandeira, houve rejeição parcial, ou seja, foi mantida a acusação somente em relação a fatos laterais, crimes ambientais não relacionados diretamente com as omissões que culminaram no rompimento da barragem, como omissão de informações no Relatório Anual de Lavra e nos Planos de Aproveitamento Econômico em decorrência do lançamento clandestino de 5,18 milhões de metros cúbicos de lama da Vale na barragem de Fundão (arts. 68, 69 e 69-A da Lei 9.605/98) e crimes relacionados ao laudo de estabilidade (art. 69-A da mesma lei).

Para o MPF, essa rejeição tardia da denúncia não pode prosperar, porque ela usa, como fundamento, paradigmas de casos individuais que não poderiam ser estendidos a outros réus exatamente por tratarem de situações pessoais.

Ou seja, a denúncia foi rejeitada em relação a essas oito pessoas não em razão da ausência de justa causa para a ação penal, mas porque o juiz entendeu que, por razões de isonomia, os efeitos de três decisões do TRF1 em habeas corpus impetrados por José Carlos Martins, Hélio Cabral Moreira e Margaret McMahon Beck deveriam se estender a esses oito réus.

Efeitos distintos - Ocorre que, de acordo com o Ministério Público Federal, os habeas corpus e respectivas decisões trataram de fatos distintos, acarretando, em consequência, efeitos distintos.

No caso da desclassificação dos homicídios, o tribunal estendeu-a de ofício a todos os 21 acusados, beneficiando até quem não havia recorrido da acusação. Mas no caso, por exemplo, do HC em que o réu alegava que não integrava mais o Conselho de Administração nas datas em que ocorreram as reuniões em que os membros foram informados sobre o risco de ruptura da barragem -, não houve, logicamente, extensão dos efeitos da decisão aos outros réus, pelo tribunal, justamente por se tratar de situação pessoal.

O MPF considera que a decisão do Juízo toma por paradigma decisões proferidas em teses defensivas individuais, que não podem ser estendidas a outros que se encontram em situações totalmente diversas, e exemplifica com os casos de José Carlos Martins e Hélio Cabral Moreira, que foram excluídos da ação penal pelo TRF1, porque o tribunal considerou que houve um lapso temporal muito grande entre o término de suas funções no Conselho de Administração (abril/2013 e abril/2014, respectivamente) e os eventos que indicavam a ruptura (revelados em agosto de 2014 pela área operacional da Samarco).

Ao contrário deles, os réus beneficiados com a recente decisão, até novembro de 2015, quando ocorreu o rompimento da barragem, estavam exercendo normalmente suas funções na Governança da Samarco, seja no Conselho de Administração, seja no Comitê de Operações ou no Subcomitê de Desempenho Operacional, tendo tido ciência dos riscos ou votado a favor das decisões que, para maximizar lucros, reduziram gastos com a segurança.

"Também não há identidade entre aqueles que foram conselheiros (Stephen, Gerd, Pedro, Consoli) e o paradigma de Margaret, cuja razão de decidir [pelo Tribunal] está na (equivocada) suposição de que a paciente era suplente e não exercera direito a voto", afirma o MPF.

O recurso lembra que "não denunciou os membros da Governança pelo 'simples fato' de terem votado em reuniões do conselho ou de terem participado de reuniões dos comitês. Em verdade, eles decidiram ou contribuíram para a decisão da operação num cenário de risco proibido, quando podiam fazer o inverso". Entre esses riscos, estão a contaminação do rejeito arenoso por lama; o surgimento de trincas na ombreira esquerda em 2013 e na ombreira direita em 2014 e 2015; a omissão quanto aos sinais de pré-ruptura da barragem; a disposição de rejeitos da Vale em Fundão sem autorização dos órgãos públicos e sem qualquer tipo de controle; e a adoção de ritmo acelerado de alteamento da barragem.

Segundo o Ministério Público Federal, o conhecimento dos riscos pelos denunciados em decorrência de suas funções na Governança da Samarco foi confirmado não só por depoimento de uma testemunha que já depôs em juízo, como por documentos da própria Samarco, segundo os quais os registros de riscos eram levados ao conhecimento do Conselho de Administração ao menos três vezes ao ano, em decorrência da responsabilidade desse órgão de acompanhar o ciclo de risco e deliberar sobre eles.

O recurso do MPF será julgado pelo Tribunal Regional Federal da 1ª Região, segunda instância da Justiça Federal em Minas Gerais.

Situação atual da Ação Penal no 2725-15.2016.4.01.3822:

- Dos 21 acusados inicialmente, 13 foram excluídos da ação penal por decisões judiciais e não irão mais responder por NENHUM crime.

José Carlos Martins, Hélio Cabral, Margaret McMahon Beck, Jeffery Mark Zweig e Marcus Philip Randolph obtiveram o trancamento da ação penal por meio de habeas corpus concedidos pelo TRF-1; outros oito réus - Gerd Peter Poppinga, Stephen Michael Potter, Pedro José Rodrigues, Luciano Torres Sequeira, Maria Inês Gardonyi Carvalheiro, Sérgio Consoli Fernandes, André Ferreira Gavinho e Guilherme Campos Ferreira - foram beneficiados pela decisão de primeira instância contra a qual o MPF está recorrendo.

- Nenhum dos acusados que restaram na Ação Penal responde mais por crime de homicídio e lesões corporais. As 19 mortes resultantes do rompimento da barragem foram consideradas, pelo TRF1, como consequência da inundação causada pelo rompimento. O crime de inundação tem pena de 6 a 12 anos em caso de ação dolosa (crime qualificado pelo resultado morte). Essa decisão do TRF1 é de abril deste ano e já transitou em julgado.

- Portanto, a ação prossegue somente em relação a Ricardo Vescovi de Aragão [diretor-presidente da Samarco à época do desastre]; Kleber Luiz de Mendonça Terra (diretor de Operações e Infraestrutura); Germano Silva Lopes, Wagner Milagres Alves e Daviely Rodrigues Silva (gerentes operacionais); James John Wilson e Antonino Ottaviano (membros da Governança), com relação aos crimes de inundação qualificada e desabamento (arts. 254 e 256 do Código Penal) e por 12 crimes ambientais (artigos 29, 33, 38, 38-A, 40, 49, 50, 54, 62, 68, 69 e 69-A da Lei 9.605/1998).

Também continuam rés na ação as empresas Samarco Mineração, Vale e BHP Billiton Brasil, acusadas dos mesmos crimes ambientais.

Ação Penal no 2725-15.2016.4.01.3822

Assessoria de Comunicação Social
Ministério Público Federal em Minas Gerais
Tel.: (31) 2123.9010 / 9008
No twitter: mpf_mg

http://www.mpf.mp.br/mg/sala-de-imprensa/noticias-mg/mpf-recorre-de-dec…

As notícias aqui publicadas são pesquisadas diariamente em diferentes fontes e transcritas tal qual apresentadas em seu canal de origem. O Instituto Socioambiental não se responsabiliza pelas opiniões ou erros publicados nestes textos. Caso você encontre alguma inconsistência nas notícias, por favor, entre em contato diretamente com a fonte.