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Marina pede Força Nacional contra queimadas

O Globo, O País, p. 14
20 de Set de 2007

Marina pede Força Nacional contra queimadas
Fazendeiros, com apoio de prefeito, ameaçam ambientalistas e índios que reivindicam demarcação de terras em MT

Ricardo Galhardo

A ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, solicitou ao Ministério da Justiça o envio de tropas da Força Nacional de Segurança à cidade de Juína, no noroeste de Mato Grosso, onde ambientalistas, índios e funcionários da Funai são ameaçados por fazendeiros contrários à demarcação de uma área de 200 mil hectares reivindicada pelos índios enawene nawe. A área está sendo devastada pelo desmatamento.

Há três semanas, os fazendeiros expulsaram da cidade, sob ameaças, seis ambientalistas das ONGs Greenpeace e Operação Amazônia Nativa (Opan) e dois jornalistas franceses. A expulsão contou com a ajuda de autoridades, como o prefeito, Hilton Campos (PR).
Com auxílio das autoridades, jornalistas e ambientalistas foram levados para a Câmara Municipal, onde sofreram ameaças. Um vídeo divulgado pelo Greenpeace no YouTube mostra as ameaças.

- Não vamos deixar vocês entrarem na área (dos índios) de jeito nenhum. Pode vir até a polícia. Temos que nos unir e fazer esta guerrilha - disse o prefeito, que é acusado pelo Ministério Público de desviar R$ 250 mil da prefeitura.

O grupo de ambientalistas foi a Juína para reunião com os índios enawene nawe, que reivindicam 200 mil hectares ocupados legalmente há mais de 20 anos por pecuaristas e plantadores de soja. Juína foi o município campeão de desmatamento em Mato Grosso em julho e um dos responsáveis pelo aumento em 40% do desmatamento no estado em relação a 2006.

A área mais afetada é justamente a que os índios reivindicam. Há cerca de 40 dias o Ibama flagrou carregamentos de madeira ilegal no local.

- Os fazendeiros estão prevendo uma derrota no litígio e aceleraram para tirar tudo de lá.

Quando o processo terminar, estará tudo depredado - disse o chefe da Funai na região, Antonio Carlos Ferreira de Aquino.

Jornalistas e ambientalistas foram ameaçados
Aquino foi alvo de ameaças dos fazendeiros. Depois de cercar o hotel onde os ambientalistas e jornalistas estavam e de levarem o grupo em uma carreata de 30 veículos (na maioria camionetes) até o aeroporto, sob ameaças e palavrões, o grupo de 80 fazendeiros invadiu a sede da Funai, ameaçou os funcionários e seis enawene nawe.

O ambientalista Edison Rodrigues de Souza, da Opan, foi ameaçado de morte. O fotógrafo Alberto César Araújo foi agredido. A ameaça de um fazendeiro de arrastar o grupo em camionetes foi gravada.

- Os fazendeiros disseram que se os enawene nawe pescarem fora da reserva vai morrer índio - disse o representante do Greenpeace, Paulo Adário.

O presidente da Câmara de Juína, Francisco de Assis Pedroso (DEM), o Chicão, disse que tentou apaziguar a situação:
- Se ficassem no meio da rua seria pior. A Câmara é o espaço democrático para o diálogo. Em relação ao que aconteceu lá fora, não tenho responsabilidade.

O prefeito e o líder dos fazendeiros, Aderval Bento, não foram encontrados ontem.

O Ministério da Justiça informou que a Força Nacional só poderá ser enviada mediante pedido do governo estadual ao governo federal, mas estuda enviar reforço da Polícia Federal. A PF instaurou inquérito para averiguar o caso. No dia 29 de agosto o governador do Mato Grosso, Blairo Maggi (PPS), anunciou que pedirá envio de tropas federais ao noroeste do estado.

Tribo foi contactada nos anos 70

O representante do Greenpeace na amazônia, Paulo Adário, define o conflito entre os enawene nawe e fazendeiros em Juína, noroeste do Mato Grosso, como um choque de civilizações.

- Os enawene nawe vivem há séculos numa relação religiosa com a natureza e se viram diante de um avançado sistemas de agronegócio do planeta. E o pior é que eles nem comem a carne do gado criado na área.
Eles detestam sangue.

O primeiro contato da tribo com o homem branco aconteceu na década de 70. Antes, os enawene nawe eram aterrorizados pelos cintas-largas e rikbakesas, etnias que vivem na região e, no passado, eram antropófagas. Em meados dos anos 50, 12 enawene nawe foram mortos e devorados pelos cintas-largas e devorados. O conflito aconteceu na área que hoje é reivindicada. Desde então passaram a se alimentar de peixe, mel, milho e mandioca.

Os conflitos acabaram nos anos 70, quando a Funai pacificou a região, mas a aversão à carne vermelha continuou. O peixe é a principal fonte de alimentação dos 500 membros da etnia, e a pesca é cercada de rituais. Segundo o Ministério Público Federal, o desmatamento nas margens do Rio Preto, provocado pelo uso de agrotóxicos e desfolhantes, além da construção de usinas hidrelétricas na região, coloca em risco a sobrevivência da tribo.

O Globo, 20/09/2007, O País, p. 14

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