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A mágoa de Marina

CB, Política, p. 3
03 de Mar de 2005

A mágoa de Marina
Ministra do Meio Ambiente reclama da atuação do Planalto, que não trabalhou para recuperar, no projeto, poderes de sua pasta, como o veto à comercialização de produtos transgênicos pelo Ibama

Helayne Boaventura e
Erica Klingl
Da equipe do Correio

A aprovação ontem da Lei de Biossegurança deixou uma grande derrotada na Esplanada dos Ministérios: a ministra do Meio Ambiente, Marina Silva. Ela trabalhou arduamente para conceder ao Instituto Brasileiro de Meio Ambiente (Ibama), ligado à sua pasta, poderes para vetar a comercialização de transgênicos.
Com a derrota, além de estar "magoada" com o governo e com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, a ministra perde força na queda-de-braço com o ministro da Agricultura, Roberto Rodrigues, que defendeu a posição dos grandes agricultores.Ainda ontem pela manhã, durante uma reunião com a bancada do PT sobre florestas nacionais onde a questão dos transgênicos foi tratada, a ministra se preocupava com a derrota iminente. Aos petistas, reclamou do Palácio do Planalto. Disse que a posição adotada pelo governo na votação não correspondia ao que o presidente Lula lhe havia prometido no ano passado. Com a demora na segunda votação da Lei de Biossegurança na Câmara, o governo editou em outubro uma nova medida provisória liberando o plantio e a comercialização da safra de soja transgênica 2004/2005.
Depois de horas de negociação no Planalto, Marina Silva conseguiu influenciar no texto de justificativa da MP no qual os ambientalistas viam o compromisso do governo de encaminhar a favor do texto da Câmara, onde o Ibama tinha poderes de veto.
Na votação de ontem, porém, o líder do governo na Câmara, Professor Luizinho (PT-SP), orientou a favor do texto do Senado. Na versão aprovada pelos senadores, o Ministério do Meio Ambiente pedia poderes para a Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (CTNBio), ligado ao Ministério da Ciência e Tecnologia. Na conversa com petistas, a ministra avisou que conversaria com o líder do PT na Câmara, Paulo Rocha (PA), e o líder do governo na Câmara. Não teve sucesso na investida.
A única vitória dos partidários de Marina foi conseguir a votação de dois destaques para tentar alterar o texto principal. E só foi obtido depois de uma votação na bancada do PT em que deu empate.
Com o impasse, os petistas fecharam o acordo. Paulo Rocha encaminhou a aprovação do texto do Senado, mas negociou com os demais líderes a apreciação das mudanças.
Os defensores da ministra tentavam restaurar os poderes do Ibama para vetar a comercialização de transgênicos e elevar de oito para 15 o quórum mínimo de deliberação na CTNBio. As duas propostas foram rejeitadas no plenário com mais de 300 votos. "Não se pode acusar a ministra de ser radical, o projeto da Câmara era equilibrado. Conceder superpoderes à CTNBio é uma irresponsabilidade do ponto de vista da saúde e do meio ambiente", criticou o deputado João Alfredo (PT-CE), ligado aos ambientalistas.

O que é transgênico
Os organismos geneticamente modificados, ou transgênicos, são aqueles que têm determinada característica genética alterada em laboratório. Genes de outros seres, como plantas, animais ou bactérias são transferidos para um outro organismo, que irá adquirir a característica genética do ser o qual foi retirado o gene. Um exemplo disso é a soja. Oginalmente ela não é resistente aos herbicidas necessários para erradicar as pragas que prejudicam seu desenvolvimento, portanto a planta morre em contato com o agrotóxico. Em laboratório, implanta-se em seu código genético os genes da bactéria que é resistente ao herbicida e a soja fica imune à ação do produto. Isso faz com que cada vez mais produtores de soja prefiram as sementes transgênicas, obtendo melhor aproveitamento da produção.
Mas os ecologistas alegam que, por exemplo, no caso da soja, o consumidor fica mais exposto aos danos do agrotóxico, pois antes o herbicida era aplicado somente entre as linhas de soja, onde as ervas daninhas se proliferam. Agora este pode ser aplicado sobre a soja transgênica, deixando o produto totalmente em contato com o veneno.

Ruralistas comemoram
Rose Brasil/ABr
Ao contrário dos partidários da ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, os ruralistas vibraram com a aprovação da Lei de Biossegurança. O texto que sairá do Congresso contém todas as reivindicações dos parlamentares ligados a grandes proprietários de terra. "Foi uma vitória completa. Hoje nós enlouquecemos a área conservadora e medieval do governo", ironizou o relator do texto, deputado Darcísio Perondi (PMDB-RS), referindo-se ao grupo da ministra.
A avaliação dos ruralistas é a de que o ministro da Agricultura, Roberto Rodrigues, terá a sua influência ampliada no governo. A aprovação do texto é um sinal evidente da força adquirida por ele após a eleição de Severino Cavalcanti presidente da Câmara.
Rodrigues tem amplo trânsito no PP, legenda não apenas de Severino como de muitos integrantes da bancada ruralista da Câmara.
"Roberto Rodrigues e Eduardo Campos (da Ciência e Tecnologia) foram os grandes vitoriosos. O ministro daAgricultura ainda mais pelas ligações com Severino", festejou o deputado Augusto Nardes (PP-RS). "Antes Marina ligava para João Paulo (PT-SP, ex-presidente da Câmara) e ele segurava o projeto. Agora a história do país mudou".
Para os ruralistas, a primeira conseqüência da aprovação da lei será o aumento da comercialização de transgênicos como milho e algodão, produzidos no Centro-Oeste, e a retomada das pesquisas com feijão resistente a pragas. "O Brasil vai retomar rapidamente a liderança na venda de algodão no mundo", prevê Perondi. (HB e EK)

CB, 03/03/2005, Política, p. 3

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