VOLTAR

Índios invadem Burle Max

Jornal de Brasília - Brasília - DF
Autor: Aline Torres
29 de Mar de 2001

Índios invadem Burle Max Eles afirmam que vivem há mais de 20 anos na área próxima ao futuro bairro Setor Noroeste.

Aplaca de madeira afixada na cerca de arame farpado com a inscrição em letras de cor azul deixa claro: Área Indígena . Descoberta inusitada, afinal, estamos em terras dos futuros Setor Noroeste e Parque Burle Max, em plena área urbana de Brasília. Quem olha ao redor deve sentir falta das ocas, dos meninos brincando nus, das mulheres de belos cabelos lisos. Mas, mesmo sem algumas de suas características originais, a pequena tribo existe e, de acordo com os índios que vivem lá, há mais de duas décadas. São sete famílias - 22 pessoas - que vivem em cinco barracos de tábua e uma casa de alvenaria. Eles deixaram para trás suas aldeias, vieram conhecer a capital do País e acabaram ficando. Cheguei quando tinha um ano. Vim da tribo Cariri, em Alagoas, com meu pai, minha mãe e dois irmãos que depois de chegarem, descobriram esse lugar e se mudaram para cá, explica Edilene Cavalcanti, 25 anos. Por ter vindo tão nova, Edilene não teve contato com muitas tradições de seu povo, mas faz questão de deixar bem claro sua origem. Sou índia, sim, só não sei muito sobre o meu povo, mas meus filhos vão aprender nossa história, garante, enquanto embala nos braços o mais novo dos quatro rebentos, Yassuinã, de apenas três meses, a quem o pai, José Francisco Queiroz, 34 anos, fará questão de ensinar as línguas que fala - o tupi-guarani e macrogê. Ao contrário da mulher, que conheceu aqui em Brasília, José Francisco, da tribo Fulniô (predominante em Pernambuco), garante que não perdeu o contato com a tribo e seus hábitos. O nome é de branco mas ele tem até uma carteirinha de membro da Confederação Nacional de Pajés. De vez em quando revivemos as danças e pajelanças aqui, conta José Francisco. A família, que não tem luz em casa, sobrevive da venda de suas criações, entre galinhas, gansos e porcos. Vendemos lá pela Asa Norte, diz Edilene. Além dos bichos, eles têm árvores frutíferas no quintal e de vez quando fazem plantações, como a de milho. Os filhos que estão em idade de ir para a escola, Danilo e Janaína, de cinco e seis anos, estudam também na Asa Norte, o bairro mais próximo de lá. Vizinhos a eles estão alguns membros da família de Francisco Guajajara, de 17 anos. Ele diz que em 1999 deixou a tribo Guaxaxarã, no Maranhão, para viver com a irmã, o cunhado e os dois sobrinhos, que já moram na única casa de alvenaria do local. Vim fazer companhia para minha irmã, mas não quero viver aqui toda a vida, não, afirma, dizendo que sonha voltar para a tribo e se casar com umas das índias bonitas que ele diz haver por lá. Para Francisco, o principal motivo de ter vindo para Brasília foi a oportunidade de aprender a ler na cidade grande. Quero só entender as coisas escritas nos cartazes que vejo. Apesar de ser filho de uma branca, preferiu o contato com o povo de seu pai. Enquanto não entra na escola, faz arcos e flechas que o cunhado vende em feiras de Goiânia e Belo Horizonte.

Ninguém sabe da invasão
Mais estranho do que encontrar índios na área do futuro Parque Burle Max é descobrir que quase ninguém sabe disso. Até porque, há pouco tempo o GDF desalojou dezenas de invasores das proximidades. Eu comandei a retirada de muita gente da área do Parque Burle Max em 1999 e nunca soube da existência de índios ali, comenta o secretário de Meio Ambiente e Recursos Hídricos, Antônio Luiz Barbosa. A secretária de Habitação, Ivelise Longui, também desconhece a existência deles, principalmente onde será erguido o Setor Noroeste. Só se estiverem na área do parque, diz . Na Funai, a informação também causa surpresa. Só sabemos que um funcionário daqui, o Santxie, tem uma chácara no local e, mesmo assim, a Funai não dá cobertura a ele nem a qualquer outro índio para continuar lá. Se forem invasores, acredito que sairão, afirma o assessor de imprensa do órgão, Régis de Souza.

As notícias aqui publicadas são pesquisadas diariamente em diferentes fontes e transcritas tal qual apresentadas em seu canal de origem. O Instituto Socioambiental não se responsabiliza pelas opiniões ou erros publicados nestes textos. Caso você encontre alguma inconsistência nas notícias, por favor, entre em contato diretamente com a fonte.