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Igualdade é o novo lema do Bird

OESP, Economia, p. B3
21 de Set de 2005

Igualdade é o novo lema do Bird
Oportunidades iguais facilitam redução da pobreza e crescimento econômico, diz relatório da instituição

Rolf Kuntz
Enviado especial

Eqüidade é a nova palavra de ordem do Banco Mundial (Bird) para políticas de desenvolvimento e de redução da pobreza. Entendida como igualdade de oportunidades, a eqüidade é tanto um objetivo político e moral quanto um coadjuvante do crescimento econômico, disse ontem o economista-chefe e vice-presidente do Bird, François Bourguignon. Do ponto de vista da eqüidade, a distribuição de oportunidades é mais importante que a de bens e riquezas, segundo o Relatório do Desenvolvimento Mundial 2006, apresentado ontem.
Um estudo sobre a desigualdade de renda no Brasil, com dados de 1996, indicou que um quarto das diferenças econômicas era atribuível a quatro fatores fora do alcance dos indivíduos - raça, região de nascimento, educação dos pais e ocupação paterna por ocasião do nascimento.
Mas seria possível, segundo os autores do relatório, apontar outros fatores, também independentes dos indivíduos e determinantes de oportunidades desiguais, como gênero, riqueza familiar ou qualidade das escolas primárias.
Desigualdades de oportunidade são transmissíveis entre gerações e limitam as possibilidades de crescimento da economia. O desigual acesso ao crédito, por exemplo, pode impedir o florescimento de muitos negócios e o aproveitamento de boas idéias, que em outros países dariam origem a empreendimentos importantes, observou o economista Francisco Ferreira, que dividiu com Michael Walton a coordenação da equipe responsável pelo relatório.
O Brasil é um dos países mais citados no documento, tanto por suas desigualdades quanto por avanços obtidos com alguns programas, como o Bolsa Escola. O relatório também cita elogiosamente o orçamento participativo. Segundo uma pesquisa citada no documento, as cidades com orçamento participativo gastaram mais que as outras, entre 1997 e 2000, em setores que afetam mais os pobres.
Ferreira criticou, no entanto, a política federal de educação, que, segundo ele, subsidia o curso superior dos ricos, em prejuízo da instrução básica e média dos pobres. Ele reconhece que é difícil mudar esse estado de coisas porque os mais favorecidos são os que têm maior influência política.
O relatório do Bird, intitulado Eqüidade e Desenvolvimento, explora a interação das desigualdades políticas, econômicas e socioculturais e a influência desses fatores na formação das instituições. É necessário quebrar essas interações para romper com o que os autores do estudo denominam 'as armadilhas da desigualdade'.
Embora concentrando a atenção no tema da iniqüidade, os economistas do Bird insistem na importância da desigualdade econômica como obstáculo à redução da pobreza.
Segundo estudos citados no relatório, a mesma taxa de crescimento econômico pode ter efeitos diferentes na redução da pobreza, de acordo com o grau de desigualdade. Em média, 1 ponto porcentual de crescimento da renda leva a uma redução de cerca de 4 pontos na incidência dos que ganham até US$ 1 por dia, nos países de baixa desigualdade. O efeito é quase nulo no caso dos países com distribuição de renda muito desigual.
Políticas que levam a maior eqüidade - e, em conseqüência, a menor desigualdade econômica e social - tendem a reduzir a pobreza de duas maneiras: diretamente, pela expansão de oportunidades para os pobres, e indiretamente, pelo maior nível de desenvolvimento sustentado.

Brasil é visto como caso à parte
Estudo mostra que o País distribuiu recursos apenas aos ricos

Paulo Sotero Correspondente WASHINGTON

Uma das sociedades mais desiguais do planeta, o Brasil mereceu um exame à parte no relatório sobre Eqüidade e Desenvolvimento divulgado ontem pelo Banco Mundial (Bird), que teve entre seus autores o brasileiro Francisco Ferreira.
Um exame da composição da renda do brasileiro por várias gerações revelou que quatro variáveis relacionadas com a origem social dos indivíduos - nível de escolaridade dos pais, ocupação do pai, raça e região de nascimento - representam mais de um quinto da desigualdade num grupo do mesmo sexo.
Dos quatro fatores, a origem familiar é o de maior peso e limita também as oportunidades de acesso à educação. 'Raça, região de origem, educação e ocupação do pai continuam a determinar o nível de educação de um indivíduo', informa o estudo.
'E, mesmo em educação, há mecanismos que reproduzem os níveis de escolaridade por várias gerações, especialmente nas faixas mais baixas.' 'Neste estudo e em anteriores, descrevemos o Brasil como um estado do bem-estar social truncado, no sentido de que foi muito bom em cobrar impostos do povo, mas distribuiu apenas entre os ricos', disse Ferreira. ''Onde falhamos no Brasil é não gastar nas coisas que os pobres mais precisam (para ter mais oportunidades).'
Um exemplo está na fonte de desigualdade social em que se transformou a universidade pública gratuita no País. 'A relação do gasto público em educação universitária e primária é três ou quatro vezes maior no Brasil do que, por exemplo, na Coréia do Sul.
Isso significa que subsidiamos a educação de pessoas ricas que foram a escolas privadas e agora estudam em universidade públicas, em lugar de subsidiar a educação fundamental dos pobres.' Ferreira reconheceu que o País tem feito progressos no ataque ao problema com programas como Bolsa Escola, no governo Fernando Henrique, e Bolsa Família, no governo Lula. 'Mas é um progresso pequeno quando comparado com a natureza do problema', disse Ferreira.
Segundo o economista, 'o País tem ainda um longo caminho a percorrer no uso dos poderes distributivos do Estado para dar oportunidades aos pobres'.

OESP, 21/09/2005, Economia, p. B3

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