OESP, Nacional, p. A14
24 de Mar de 2007
Ibama libera obra de transposição do São Francisco com 51 ressalvas
Reassentamento da população atingida é uma das condicionantes para a construção, que deve levar 4 anos
Lígia Formenti
O Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Renováveis (Ibama) emitiu ontem a licença de instalação da transposição do Rio São Francisco. A autorização foi assinada pelo presidente do Ibama, Marcus Barros. Para a aprovação do projeto, foram estabelecidas 51 condicionantes, com prazos distintos, que terão de ser cumpridas durante a execução da obra.
Entre elas está a reavaliação do projeto de reassentamento da população atingida pela obra. O diretor de licenciamento ambiental do Ibama, Luiz Felippe Kumz, explica que as famílias removidas terão de estar novamente instaladas até a conclusão da obra. Segundo ele, é preciso fazer um levantamento mais preciso de quantas pessoas serão atingidas.
Com a assinatura de ontem, termina um longo capítulo iniciado em abril de 2005. Sete meses depois do início da análise do processo de licenciamento, várias liminares foram interpostas. O trabalho somente foi retomado em dezembro de 2006, quando todas as liminares da Justiça contra a transposição foram suspensas pelo ministro Sepúlveda Pertence, do Supremo Tribunal Federal (STF).
Ao todo, foram dez meses de avaliação para conferir o licenciamento. As obras, no entanto, somente poderão ser iniciadas depois do pagamento da licença - fixada em R$ 122 mil - e da publicação da permissão no Diário Oficial. A expectativa é de que sejam concluídas em quatro anos. Para o Projeto de Integração das Bacias do São Francisco com o Nordeste Setentrional, o nome oficial, serão necessários R$ 4,2 bilhões. Sete fiscais do Ibama farão a fiscalização, com relatórios e visitas periódicas.
Polêmico, o projeto prevê a construção de dois canais: um a leste, que levará água para Pernambuco e Paraíba, a partir da captação no lago da barragem de Itaparica; e outro na direção norte, abastecendo o Ceará e o Rio Grande do Norte, com a retirada nas imediações da cidade de Cabrobó (PE).
PREÇO
"É uma prova de que o governo tem pressa em tocar essa obra. Não quer discutir, dialogar. Pois quanto mais se analisa o projeto, mais imperfeições são encontradas", avaliou ontem o coordenador do Projeto de Articulação Popular do São Francisco, Rubem Siqueira. Na semana passada, Siqueira e integrantes de movimentos sociais estiveram em Brasília discutindo os riscos do projeto. Ele argumenta que, com a obra, o custo da água será um dos maiores do mundo, R$ 0,4 por metro cúbico. "Empresas certamente vão repassar os custos elevados para população. E é justamente isso que queremos evitar."
De acordo com Ministério da Integração Nacional, o Nordeste conta com 3% da água doce do País - a Bacia do São Francisco responde por 70% deles.
DISPUTA
Além da desconfiança de grupos sociais, o projeto continua sendo alvo de uma disputa judicial. Anteontem, a Procuradoria da República no Distrito Federal fez uma recomendação formal ao presidente do Ibama para que somente concedesse a licença depois de realizar novas audiências públicas. O procurador Francisco Guilherme Bastos afirma que o objetivo é "garantir a legalidade e permitir a participação popular e a publicidade no processo de licenciamento ambiental".
Kumz não escondeu a irritação com a recomendação. "Se o próprio procurador-geral interpôs um recurso no Supremo, não há por que um documento como este agora ser preparado."
Em MG, protesto contra projeto
Eduardo Kattah
No dia em que o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) liberou a licença de instalação da obra de transposição das águas do Rio São Francisco, aproximadamente 500 manifestantes protestaram em Belo Horizonte contra o projeto do governo federal.
A manifestação foi promovida por organizações não-governamentais (ONGs) de defesa do meio ambiente, que aproveitaram o último dia do 6.o Fórum das Águas, realizado na Assembléia Legislativa de Minas Gerais.
O protesto contou ainda com o apoio de estudantes e vereadores da capital mineira, além de entidades ligadas à Igreja Católica.
Os participantes se concentraram em frente ao prédio da Assembléia Legislativa e seguiram em direção à sede do Ibama, localizada na região sul de Belo Horizonte. Os manifestantes levavam faixas e cartazes e tradicionais carrancas do São Francisco.
Os participantes do ato também carregaram três caixões e promoveram o enterro simbólico de ministros do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
O superintendente do Ibama em Minas Gerais, Roberto Messias Franco, recebeu manifestos contrários à transposição do rio e se comprometeu a encaminhar os documentos à ministra do Meio Ambiente, Marina Silva.
"São flagrantes as irregularidades", disse Frei Gilvander, ligado à Comissão Pastoral da Terra (CPT). Ele classificou o projeto de um "engodo" e afirmou que "no mínimo 75% dessa água será usada para o hidronegócio".
Pelo projeto de transposição do Rio São Francisco, serão construídos 720 canais para levar a água a áreas secas de Pernambuco, Paraíba, Ceará e Rio Grande do Norte.
OESP, 24/03/2007, Nacional, p. A14
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