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Governo nao cede a pressao de Flamarion

O Globo, O Pais, p.8
10 de Jan de 2004

GOVERNO NÃO CEDE À PRESSÃO DE FLAMARION
Bastos avisa que Lula homologará área indígena como previsto e promete apenas rever questão de terras da UniãoBRASÍLIA. O governador de Roraima, Flamarion Portela, voltou ontem a seu estado de mãos vazias. Após mais de duas horas de reunião entre representantes do estado e do governo federal, além do governador e do ministro da Justiça, Márcio Thomaz Bastos, ficou decidido que a homologação da reserva indígena Raposa Serra do Sol será feita como o Planalto quer: em terras contínuas, sem excluir áreas de municípios nem de plantação de arroz, como pretendiam os parlamentares de Roraima.Apesar de terem apresentado algumas propostas de compensação, os representantes de Roraima arrancaram apenas a promessa de que um grupo interministerial sobre a situação fundiária do estado analisará as propostas.Após reunião com Flamarion e com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, Bastos disse que o governo apresentará um pacote de medidas para melhorar a situação fundiária em Roraima. Hoje, todo o território pertence à União. No entanto, o governo federal não deu sinais de que atenderá a uma das principais reivindicações, a transferência de cinco milhões de hectares da União para o governo estadual, dos quais pelo menos três milhões por meio de medida provisória.Terra seria dada a não-indígenasDe acordo com o senador Romero Jucá (PMDB-RR), o governo poderia usar essa terra para compensar os não-indígenas que vivem na área da reserva e fazer outros projetos de desenvolvimento agrícola. O nó da questão é a transferência por medida provisória. — O governo federal quer que o estado apresente um plano de uso da terra, mas isso leva tempo, não resolve o problema. Não adianta fazer a homologação e não fazer a transferência — disse o senador.Bastos afirmou que a questão será estudada pelo grupo interministerial, assim como outras propostas sobre as terras da União: — Queremos resolver a questão de Rondônia e não criar mais problemas.O ministro garantiu que ninguém será desalojado sem que sejam estudadas e encontradas soluções para todos os casos. Um comitê gestor será formado, com representantes do governo federal e do estado, para fazer a transição das moradores da reserva para outras regiões. — Queremos dar uma palavra de tranqüilidade. Ninguém será desalojado sem que se tenha uma solução — disse. O ministro acrescentou que a homologação da área será feita em breve e que não há possibilidade de serem criadas ilhas, cercando as aldeias, como propuseram os fazendeiros da região. Segundo Bastos, como os índios são nômades, essa alternativa é inviável. A data da homologação, porém, não está certa. O governo federal chegou a anunciar que seria em janeiro. Ontem, o ministro explicou que essa é a intenção do presidente, mas que o decreto poderá atrasar por causa dos detalhes e do acertos que ainda estão sendo feitos com o estado.O resultado da reunião irritou alguns dos parlamentares presentes, que chegaram a dizer que, se o governo federal não cedesse, a bancada poderia romper com o governo. O deputado Luciano de Castro (PL) chegou a dizer que o governo federal estava conduzindo as conversas sobre a homologação de forma atropelada.No entanto, a posição do governador e de boa parte dos parlamentares é de minimizar os danos. Os parlamentares saíram do encontro dizendo-se convencidos de que não conseguirão evitar a homologação da reserva como está prevista. Flamarion diz temer tragédiaAntes de viajar a Brasília, o governador mandou carta ao presidente dizendo temer uma tragédia ainda mais grave que a chacina de Eldorado do Carajás, no Pará, em que 19 sem-terra foram assassinados por PMs. Na carta, Flamarion insinua duas vezes que o governo federal pode estar pensando em se aproveitar da situação para decretar intervenção federal em Roraima.Na mesma carta, porém, o governador se diz um integrante do PT — embora tenha se licenciado após ser acusado de envolvimento no chamado escândalo dos gafanhotos. E, por isso, diz considerar inaceitável a conjectura de intervenção federal. Flamarion afirma que o PT tem uma tradição de lealdade com seus correligionários e que, por isso, os petistas não tomariam a atitude de intervir no estado."Há quem cogite que esse movimento tem por objetivo criar a situação de grave perturbação da ordem pública que possa ensejar a possibilidade de intervenção (...) diretamente pelo presidente da República, sem ouvir o governo estadual. Tal posição é inaceitável, dada a história de lealdade do PT e a maneira ética e transparente com que Vossa Excelência conduz o país", escreveu Flamarion.O governador ainda reclama que a operação da Polícia Federal que acabou com o esquema dos gafanhotos "fragilizou sobremaneira as instituições do estado". Ele diz que o governo estadual não tem culpa das manifestações que pararam o estado. Por fim, pede a Lula "a adoção das providências necessárias a fim de evitar uma tragédia que rapidamente se avizinha".COLABOROU Rodrigo França Taves

O Globo, 10/01/2004, p. 8

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