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Exército prepara ocupação de terras indígenas em MT

Gazeta Digital - www.gazetadigital.com.br
Autor: Rose Domingues
14 de Set de 2008

Há estudos que apontam infiltração de grupos entre índios para praticarem tráfico de drogas, retirada ilegal de madeiras e biopirataria

O comando da 13ª Brigada da Infantaria Motorizada já aprontou o plano de ocupação de 22 terras indígenas em 28 municípios mato-grossenses que estão na faixa de fronteira com a Bolívia e na divisa com Rondônia, onde estão índios principalmente das etnias Paresis e Nhambiquara. O comandante da brigada, general Theófilo Gaspar Oliveira, diz que a proposta será formalizada aos ministérios da Defesa e de Assuntos Estratégicos até o dia 22 de outubro. O objetivo é impedir a utilização desses espaços para atuação do crime organizado, exploração de madeireiras e organizações não-governamentais (ONGs) que chegam a Mato Grosso para praticar biopirataria.

Ele diz que a situação é desoladora em algumas aldeias, como a Sararé, na região de Pontes e Lacerda, onde os índios têm sido afetados de maneira incisiva pela influência frequente dos homens brancos, ao transmitir todo tipo de doença. Nas investigações feitas na região que ocupa cerca de 700 km de fronteira seca, numa extensão de 1,3 mil km, parte da população desses povos está com desnutrição, alto índice de mortes por gripe, alcoolismo e até doenças sexualmente transmissíveis, como Aids. A legislação permite poder de polícia aos militares nesse território de segurança nacional. Na região de Cáceres, a estrada de acesso à Bolívia passará a ser intensamente fiscalizada com uma base do Exército e uma delegacia da Receita Federal que já está em fase de construção.

Por falta de efetivo na segurança, o Destacamento Militar de Corixa (71 km de Cáceres e 296 da Capital) entre Brasil e Bolívia está entregue à própria sorte. Qualquer pessoa pode atravessar o limite entre os países a pé ou de bicicleta ou de carro. O acesso é fácil a San Mathias. Mesmo diante desse problema, hoje apenas o 2o Batalhão de Fronteira faz toda guarda, com poucos homens em serviço. Para que o projeto de ocupação dê certo, será necessário o governo federal redirecionar das regiões Sul e Sudeste reforço mínimo de 4 mil soldados só na fronteira, incluindo a manutenção de bases em diversos municípios, como Tangará da Serra, Nova Olímpia, Porto Estrela, Comodoro, Vila Bela da Santíssima Trindade, Pontes e Lacerda e Campos de Julio.

Descaso - Mesmo estando na porta de entrada para a cocaína que alimenta o tráfico de drogas das principais favelas de São Paulo e Rio de Janeiro, o Estado está abandonado. Cerca de 2,5 mil soldados compõe o Exército, enquanto o vizinho Mato Grosso do Sul conta com 11 mil homens. Outro ponto crítico: as rodovias. Apenas 5% são pavimentadas. Diferente das demais faixas de fronteira brasileira, nessa região não há meios de trafegar em estradas ilegais, conhecidas por "cabriteiras" . Sem equipamentos sofisticados, será complicado fazer o monitoramento. O general sugere a aquisição de veículos aéreos não tripulados (VANT), de fabricação iraniana, mas que têm protótipos em Porto Alegre (RS). São aeronaves conduzidas por controle remoto e equipadas com câmeras. Elas têm condições de captar imagens computadorizadas a altura acima de jatos comerciais.

Uma das primeiras providências já acertadas inclui a ida de um esquadrão de cavalaria para Pontes e Lacerda (448 km a oeste de Cuiabá). Já em Sinop, o reforço vem da implantação da segunda sede da Polícia Federal do Estado, com a transferência da companhia de Três Lagos (MS). A cooperação entre as corporações de segurança federais e estaduais servirão para intensificar a fiscalização, hoje deficitária. Os ônibus e veículos devem ser parados e revistados a partir da utilização de cães farejadores, o que vai minimizar o impacto junto à população. "Vamos reunir a experiência de cada uma das instituições para poder fazer frente ao crime organizado, que hoje leva vantagem".

Espionagem - A vigilância adequada exige também a aquisição de viaturas, embarcações, voadeiras (barcos com motores modernos e potentes) e reforço no serviço de inteligência. Depois de atuar 5 anos em Cáceres, a juíza da 2ª Vara Criminal, Selma Arruda, sabe em que terreno está pisando. A instabilidade política no país do presidente boliviano Evo Morales aumentou a tensão. "O problema social na Bolívia beira o caos e com um fundo criminoso, porque a produção da droga é o que sustenta a família dessa gente".

A juíza entende que há necessidade de intervenção imediata, o Estado precisa estender a atuação contra o crime organizado no atacado e não no varejo, porque senão perde a eficiência. É preciso olhar o aspecto histórico e geográfico, já que há indícios de que Mato Grosso esteja na mira de facções como Primeiro Comando da Capital (PCC), Comando Vermelho e das Farc (Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia) que já se instalaram em Rondônia.

Retomada histórica - Ainda não se sabe quanto ou o que exatamente virá para o Estado. O general pontua que já existem 3 grandes projetos para serem colocados em prática a partir do ano que vem, uma delas é a reativação da indústria bélica com aquisição mísseis terra-terra e terra-ar, compra de 51 helicópteros, sendo 17 para cada uma das Forças Armadas, com entrega prevista até 2010. Hoje, o Exército em Mato Grosso não conta com nenhum helicóptero. Depois dos "anos de chumbo" durante a Ditadura Militar, a corporação perdeu força e ainda é vista com certo receio pela população. "Nós devemos encontrar um meio de estar em atuação na sociedade".

Funai - O procurador federal designado para a Fundação Nacional do Índio (Funai) em Mato Grosso, Cezar Lima do Nascimento, avalia de maneira positiva a ocupação das terras indígenas na fronteira, até como uma forma de levar outros serviços essenciais nas áreas da saúde e educação para as aldeias, além de ajudar na proteção efetiva dos territórios constantemente invadidos. "Tenho resistências às ONGs e às missões religiosas, porque acabam intervindo de maneira abrupta na cultura dos índios, mas o Exército me parece ter um código de ética rígido, vai ser importante tê-los por perto".

ENTREVISTA

Há um ano e meio em Mato Grosso, o comandante da 13ª Brigada, general Theóphilo Gaspar de Oliveira, que há 20 anos se dedica à carreira militar, mostra que existem caminhos para conter o avanço do crime organizado em Mato Grosso e ocupar os espaços vazios na área de fronteira seca que abriga 28 municípios e 22 terras indígenas. Perito no serviço de combate ao terrorismo e capacitado no trabalho de inteligência, ele pontua que é preciso estar "vigilante" e unir forças.

Como está a estrutura do Exército hoje no Estado?

Nós temos 2,5 mil homens para fazer a segurança de todo território, quando seriam necessários no mínimo 4 mil só para a faixa de fronteira. No vizinho Mato Grosso do Sul, o contingente é de 11 mil. Para a Brigada estar completa, seriam necessários três Batalhões, Companhias de Engenharia, de Comunicação e de Comando, um Esquadrão de Cavalaria, um Batalhão Logístico e um Pelotão de Polícia do Exército, mas em Cuiabá, não temos as Companhias de Engenharia e de Comunicação, Esquadrão de Cavalaria e o Batalhão Logístico. Quem nos apóia é o Batalhão de Campo Grande (MS).

Qual a maior ameaça na região da fronteira?

A instabilidade governamental da Bolívia, que hoje está dividida por departamentos ou Estados que formam uma "meia lua" em torno de La Paz. Nesses locais são produzidas toneladas de cocaína, que alimentam as principais favelas de São Paulo e Rio de Janeiro. Apesar de ter sido usado como corredor, nos últimos 5 anos o perfil do Estado mudou. Uma parte significativa da droga hoje fica em Mato Grosso, a gente pode constatar isso pelo aumento da criminalidade e prisões por tráfico.

Essa droga é comercializada a preço de "ouro" no Brasil?

Na Bolívia, os traficantes estão enfrentando dificuldades de refinamento dela, que muitas vezes vêm na sua forma bruta (pasta-base) para Mato Grosso. Já sabemos que o produto tem sido refinado e estocado em municípios da região de Cáceres, como Pontes e Lacerda, Mirassol D"Oeste, Araputanga e São José dos Quatro Marcos. No país vizinho, 1 kg de cocaína é comprado por cerca de US$ 1 mil. Em São Paulo e Rio de Janeiro, o preço para a mesma quantidade pode variar entre US$ 5 mil e US$ 10 mil, depende da qualidade. Nos Estados Unidos, maior consumidor internacional, o valor geralmente chega a US$ 30 mil.

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