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A ecologia na Bienal

OESP, Caderno2, p. C1
15 de Jun de 2016

A ecologia na Bienal
Como manifesto ou como sistema, questão é destaque da 32ª edição da mostra este ano

Camila Molina

Pelo cronograma de Carolina Caycedo, a artista ficará até este sábado, 18, visitando os estragos no Rio Doce e em Mariana, Minas Gerais, desde que a região passou pelo pior desastre ambiental brasileiro ao ser inundada e contaminada pelo rompimento, em novembro, da barragem de rejeitos da mineradora Samarco. Mas antes dessa viagem, a colombiana já conheceu os pescadores de Cananeia, no litoral paulista, e o quilombo de Ivaporunduva, no vale do Ribeira de Iguape. Mais ainda, a pesquisa de campo da participante da 32.ª Bienal de São Paulo no Brasil inclui idas às hidrelétricas de Itaipu, na Foz do Iguaçu, e de Belo Monte, na bacia do Xingu - e de todas essas andanças, ela criará suas obras para a edição do evento de arte, a ser inaugurada em setembro.
"Trato de entender uma represa como estrutura que contém um corpo de água, mas que tem a ver também com a contenção e a repressão de comunidades que convivem com esse corpo", explica Carolina Caycedo. Colombiana, nascida em Londres e que reside entre Los Angeles, nos EUA, e La Jagua, na Colômbia, ela vem desenvolvendo há quatro anos o projeto Be Dammed, que investiga o impacto sociocultural da construção de hidrelétricas nas Américas. A artista, que realiza "videoensaios", performances e instalações, estava interessada no caso de Belo Monte, mas seu trabalho para a mostra brasileira abraçou outras questões.
Para Carolina Caycedo, que já criou belos trabalhos sobre o Yuma - nome ancestral do rio colombiano batizado de Magdalena pelos colonizadores espanhóis, ela conta em vídeo - "a arte é a melhor ferramenta para poder entender as injustiças e participar de processos de organização e de luta". Sua afirmação vai ao encontro do termo "artivista" criado pelo paraense Bené Fonteles, uma das figuras centrais da edição da mostra.
O conceito de ecologia estará presente na 32.ª Bienal em diferentes "níveis". Assim como os rios engendram as obras de Carolina Caycedo, a presença de expressivo conjunto de esculturas de Frans Krajcberg, de 95 anos - criadas com troncos carbonizados, é uma espécie de manifesto sobre "a extinção e destruição de matas e biomas, a demarcação de terras indígenas". "A Bienal de São Paulo está preocupada com o meio ambiente e a saúde do planeta e o Krajcberg é alguém que sempre levantou a mão e deu esse grito", diz o curador da exposição, Jochen Volz.
Ao mesmo tempo, os projetos da finlandesa Pia Lindman, da dupla Nomeda & Gediminas Urbonas, e da dinamarquesa Rikke Luther, por exemplo, têm parceria com o Instituto de Botânica de São Paulo. Entretanto, deve ser destacada a ideia de jardim - "não como metáfora, mas metodologia" - para a construção da mostra e sua expografia, assinada pelo arquiteto Alvaro Razuk.
"As exposições são normalmente concebidas a partir de uma lógica urbana, de circulação, com grandes corredores e até as áreas de descanso são as praças", define a cocuradora Júlia Rebouças. "Na lógica das cidades, mais espaço significa mais poder; e na lógica do jardim tentamos qualificar o espaço de formas diferentes; com áreas mais abertas, áreas descampadas e áreas sombreadas, pensamos na escala do corpo."
Nesse sentido ainda, a "permeabilidade" da 32.ª Bienal com o Ibirapuera será importante. Como conta Volz, existe a vontade de instalar dispositivos como ponto de informação, recepção e guarda-volumes na área externa do Pavilhão Ciccillo Matarazzo. "Não precisa criar aquele horror do foyer, em tudo é uma grande barreira para se passar."
Mas, mais ainda, há artistas que preparam obras para exibirem ao ar livre, no parque. O argentino Eduardo Navarro está criando "uma escultura que faz o prédio inteiro virar ouvinte da natureza", conta Jochen Volz. Já a portuguesa Carla Filipe realiza uma horta para a Praça das Bandeiras e o trabalho da coreana Koo Jeong, em fase de aprovação, prevê a construção de uma grande pista de skate.
Outra criação envolvendo a questão da ecologia - no caso, a "agrofloresta" e a produção de alimentos orgânicos - é a do brasileiro Jorge Menna Barreto, que vai realizar o restaurante da 32.ª Bienal. "A alimentação será toda baseada em plantas, quase uma desautomatização do ato de comer", explica Júlia Rebouças. "Acho que é um projeto que fala da ideia de Bienal como um sistema em si, que recebe entre meio milhão e um milhão de pessoas por três meses e que pode participar de uma política alimentar", resume Volz.

'Incerteza Viva' inicia-se em setembro
A 32ª Bienal de São Paulo - Incerteza Viva - ocorrerá entre 10 de setembro e 12 de dezembro no Pavilhão Ciccillo Matarazzo, no Parque do Ibirapuera. Com a participação de 81 artistas e coletivos, a mostra tem curadoria geral do alemão Jochen Volz e como cocuradores a brasileira Júlia Rebouças, a sul-africana Gabi Ngcobo, a mexicana Sofía Olascoaga e o dinamarquês Lars Bang Larsen. A edição terá cerca de 75% de obras comissionadas.

OESP, 15/06/2016, Caderno2, p. C1

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